2011-11-10 15:53:11

À descoberta da Cáritas-África


É tão antiga como a Igreja e exprime a vontade do Filho de Deus de ser “Homem entre os homens”, identificando-se com os seus sofrimentos quotidianos e ajudando-os a resolvê-los na ótica da Salvação Divina. Por outras palavras: enfrentar as emergências, a pobreza gritante e atuar a favor do desenvolvimento integral dos povos. Mas a Caritas, formalmente institucionalizada como organismo internacional da Igreja em 1951 e presente na grande maioria dos países e dioceses do mundo, permanece ainda hoje uma realidade a descobrir na sua essência profunda. Há muitos que a vêem, de facto, como um mero organismo de distribuição de víveres e vestuário aos necessitados. Dá-la a conhecer na sua totalidade e complexidade, a todas as pessoas de boa vontade, é portanto um dos seus grandes desafios.
Caritas – África assumiu este desafio como um dos pontos a concretizar nos próximos quatro anos de trabalho. Tendo-se reunida em Lomé, no Togo, de 27 a 30 de Setembro passado, a nova Direção, liderada pelo bispo moçambicano D. Francisco João Sílota, vai contudo para além do desafio comunicativo no seu plano estratégico, ao qual foram dedicados quatro dias de minucioso trabalho de análise e apuramento, de modo a sintonizá-lo com o da Caritas Internacional e ao mesmo tempo atento à especificidade da África.
Não obstante as suas enormes riquezas naturais humanas e espirituais, o Continente africano sofre ainda de uma pobreza que humilha os seus filhos e ofende a Deus. D. Francisco Sílota está preocupado. Considera inaceitável esta situação. Deseja, antes de mais, perceber as razões deste facto. E está convencido de que, com a ajuda de peritos em Ciências Sociais e em Teologia Moral, há-de consegui-lo, indo mesmo para além das teorias e melhorando concretamente as condições de vida dos africanos. Tal será possível se se conseguir fazer dos africanos, dos pobres, sujeitos estratégicos do seu próprio desenvolvimento. É isto o que está no centro das intenções do bispo de Chimoio e dos seus sete colaboradores, um por cada zona em que se encontra subdividido o SECAM, Simpósio das Conferências Episcopais da África e Madagáscar. É indispensável trabalhar em sintonia com este organismo eclesial panafricano e em especial com o seu departamento “Justiça, Paz e Desenvolvimento”, assim como com cada uma das dioceses.
Mais ainda: consciente de que a sua atividade, por muito importante que seja, não dará frutos palpáveis se não for acompanhada pela boa atuação de todos os que têm grandes responsabilidades no governo do continente, Caritas-África propõe-se assumir-se como “lobby”, particularmente junto da União Africana, a fim de contribuir para que a ética seja o motor desta grande locomotiva continental.
Entrevê-se assim, uma Caritas – África dinâmica, comprometida, desejosa de ser mais autónoma nos meios e nas decisões para melhor responder às necessidades dos seus filhos, mas sem deixar de parte a dimensão fraterna que carateriza a grande “Família Caritas” na Igreja católica e que torna as suas diversas partes em vasos comunicantes, no esforço de fazer com que “todos tenham a vida e a tenham em abundância”, como quer o Evangelho.
“Justiça, Paz, Reconciliação” – É o que, hoje mais do que nunca, a Igreja aspira a ser para os africanos. A II Assembleia do Sínodo dos Bispos para a África, que teve lugar no Vaticano em outubro de 2009, procurou encontrar e apontar a via para o concretizar e para ser luz e guia neste caminho. A Exortação Apostólica que brotou deste Sínodo será entregue pelo Papa aos Bispos da África, na sua visita apostólica ao Benim, de 18 a 20 do corrente. Será preciso passar depois à prática. Caritas – África sente-se pessoalmente responsável por esta tarefa. E é significativo que precisamente da Caritas – Benim tenha já chegado um insistente convite a não deixar na gaveta o documento, fazendo dele, pelo contrário, uma “bússola” e uma “fonte de inspiração” para continuar a dar a conhecer a identidade da Caritas, a trabalhar com um profissionalismo e uma transparência cada vez maior, sem se habituar à pobreza extrema, mas deixando-se interpelar por ela, fazendo da credibilidade de que goza a Caritas um instrumento de “lobby” para um mundo mais justo. Em poucas palavras, fazer com que cada um de nós seja efetivamente sal “de boa qualidade” para a terra e uma luz “com a justa intensidade” para o mundo.
Os bispos terão portanto na Caritas – África um ótimo braço operativo, mas também um precioso lugar de reflexão, se souberem daí tirar partido, no sentido mais nobre do termo. Com efeito, a Caritas é um organismo muito complexo que atua em diversos níveis: internacional, nacional, diocesano, paroquial. Se, por um lado, esta ramificação capilar constitui uma força, por outro lado pode ser também uma debilidade, porque, se faltar uma perfeita coordenação entre todos estes anéis de conjunção, pode ficar comprometido o resultado final. Esta preocupação esteve sempre presente como pano de fundo, na reunião de Lomé, na qual o Dr. Bruno Miteyo, Secretário geral da Caritas da República Democrática do Congo, e com larga experiência a nível continental, convidou os sete coordenadores de zona, todos eles novos no seu cargo, a serem positivos, criativos e com uma consciência clara da responsabilidade que lhes cabe: tornar a Caritas – África capaz de responder às necessidades dos africanos. E se isto requer uma visão e projetos com um horizonte amplo para a erradicação da pobreza, não se podem, contudo, esquecer as emergências que afetam inteiras faixas de populações do continente, como a recente crise alimentar no Corno de África, as inundações, os refugiados e migrantes, e assim por diante. Neste capítulo, há três aspetos sobre os quais se concentrou a atenção da Comissão Regional Caritas – África, em Lomé: procurar estabelecer um quadro das eventuais catástrofes; dotar-se dos instrumentos para lhes dar uma resposta de maneira profissional, juntamente com outros organismos; e criar nesse sentido um Fundo da Igreja no continente. A consciência da dificuldade desta tarefa estava igualmente presente em Lomé. Mas, embora numerosas Caritas nacionais africanas tenham ainda um grande caminho a percorrer até se tornarem suficientemente autónomas em termos de meios financeiros, algumas delas encontram-se já no bom caminho e não hesitam em partilhar com as outras o que de bom há no seu modo de atuar. Estamos perante um novidade no que diz respeito às Caritas do continente, que se estão empenhando também por uma melhor e mais transparente gestão dos seus recursos. Foi precisamente esta a temática do Seminário dos diretores e contabilistas das 45 Caritas nacionais africanas que se realizou em Nairobi, nos dias que antecederam a reunião de Lomé.
Finalmente, outro grande desafio se impõe à Igreja na África que sonha e trabalha a favor de um Continente unido, pacífico, próspero, íntegro. Fazer com que a Caritas abrace todo o continente numa única e verdadeira Cáritas-Africa e não uma Caritas para a África negra, separada, nomeadamente, da Somália, que faz parte da MONA (Médio Oriente/África do Norte) uma das regiões da Caritas Internationalis. Esta subdivisão foi certamente estudada por motivos funcionais e de eficácia, mas, como dizia Kwame Nkrumah, um dos ilustres filhos do Continente, “a África deve unir-se”. E a Igreja quer certamente ser exemplo, neste aspeto.
Dulce Araújo – Programa Português – Rádio Vaticano








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