Bento XVI: Carinho dos brasileiros "permanece indelével nas minhas lembranças"
Cidade do Vaticano (RV) – O Papa Bento XVI recebeu nesta segunda-feira o Embaixador
do Brasil junto à Santa Sé, Almir Franco de Sá Barbuda, para a apresentação de suas
credenciais.
Em seu discurso, o Pontífice recordou sua visita ao Brasil em
2007, afirmando que O carinho que recebeu dos brasileiros "permanece indelével" em
suas lembranças. E agradeceu o apoio manifestado, seja do governo, seja da diplomacia
brasileira junto à Santa Sé, para a organização da XXVIII Jornada Mundial da Juventude,
"que se realizará, se Deus quiser, em 2013 no Rio de Janeiro".
Bento XVI recordou
a fecunda história do nosso país com a Igreja Católica, iniciada na primeira missa
celebrada em 26 de abril de 1500, e que deixou testemunhos em muitas cidades e monumentos,
como é o caso do Cristo Redentor, que se tornou símbolo de identificação mundial do
Brasil.
"Porém, mais do que construções materiais, a Igreja ajudou a forjar
o espírito brasileiro caracterizado pela generosidade, laboriosidade, apreço pelos
valores familiares e defesa da vida humana em todas as suas fases", afirmou o Papa.
O
Pontífice citou o Acordo assinado entre a Santa Sé e o Governo Brasileiro em 2008.
Bento XVI falou deste Acordo como a garantia que possibilita à comunidade eclesial
desenvolver todas as suas potencialidades em benefício de cada pessoa humana e de
toda a sociedade brasileira. Tendo em vista que a contribuição da Igreja não se limita
a concretas iniciativas assistenciais ou humanitárias, mas, sobretudo, o crescimento
ético da sociedade. Em especial, o Pontífice dedicou falou da contribuição da Igreja
no campo da educação, cujo prestígio é reconhecido por toda a sociedade.
"É
conveniente reafirmar que o ensino religioso confessional nas escolas públicas, tal
como foi confirmado no referido Acordo de 2008, longe de significar que o Estado assume
ou impõe um determinado credo religioso, indica o reconhecimento da religião como
um valor necessário para a formação integral da pessoa."
Por fim, no campo
da justiça social, Bento XVI recordou que o Governo brasileiro sempre poderá contar
com a Igreja, principalmente nas iniciativas que visam a erradicação da fome e da
miséria, ajudando os mais necessitados a livrarem-se da sua situação de indigência,
pobreza e exclusão. (BF)
Segue na íntegra o texto do Papa Bento XVI:
Senhor
Embaixador,
Ao receber as Cartas Credenciais que o designam como Embaixador
Extraordinário e Plenipotenciário da República Federativa do Brasil junto da Santa
Sé, apresento-lhe respeitosos cumprimentos de boas-vindas e agradeço-lhe as significativas
palavras que me dirigiu, nelas manifestando os sentimentos que lhe vão na alma ao
iniciar esta sua nova missão. Vi com grande satisfação as saudações que me transmitiu
da parte de Sua Excelência a Senhora Presidente da República Dilma Rousseff, pedindo
ao Senhor Embaixador a amabilidade de fazer-lhe chegar a minha gratidão pelas mesmas
e certificar-lhe dos meus deferentes votos do melhor êxito no desempenho da sua alta
missão, bem como das minhas orações pela prosperidade e bem-estar de todos os brasileiros,
cujo carinho experimentado na minha visita pastoral de 2007 permanece indelével nas
minhas lembranças. Registro com vivo apreço e profundo reconhecimento a disponibilidade
manifestada pelas diversas esferas governamentais da Nação, bem como da sua Representação
diplomática junto da Santa Sé, para apoiar a XXVIII Jornada Mundial da Juventude que
se realizará, se Deus quiser, em 2013 no Rio de Janeiro. Como recordava o Senhor
Embaixador, o Brasil, pouco tempo depois de despontar como Nação independente, estabeleceu
relações diplomáticas com a Santa Sé. Isso nada mais era senão o desbordar da fecunda
história conjunta do Brasil com a Igreja Católica, que teve início naquela primeira
missa celebrada no dia 26 de abril de 1500 e que deixou testemunhos em tantas cidades
batizadas com o nome de Santos da tradição cristã e em inúmeros monumentos religiosos,
alguns deles elevados a símbolo de identificação mundial do País como a estátua do
Cristo Redentor com seus braços abertos, num gesto de bênção à Nação inteira. Porém,
mais do que construções materiais, a Igreja ajudou a forjar o espírito brasileiro
caracterizado pela generosidade, laboriosidade, apreço pelos valores familiares e
defesa da vida humana em todas as suas fases. Um capítulo importante nesta frutuosa
história conjunta foi escrito com o Acordo assinado entre a Santa Sé e o Governo Brasileiro,
em 2008. Tal Acordo, longe de ser uma fonte de privilégios para a Igreja ou supor
uma afronta à laicidade do Estado, visa apenas dar um caráter oficial e juridicamente
reconhecido da independência e colaboração entre estas duas realidades. Inspirada
pelas palavras do seu Divino Fundador, que mandou dar «a César o que é de César e
a Deus, o que é de Deus» (Mt 22,21), a Igreja exprimiu assim a sua posição no Concílio
Vaticano II: «No domínio próprio de cada uma, comunidade política e Igreja são independentes
e autônomas; mas, embora por títulos diversos, ambas servem a vocação pessoal e social
dos mesmos homens» (Const. Gaudium et spes, 76). A Igreja espera que o Estado, por
sua vez, reconheça que uma sã laicidade não deve considerar a religião como um simples
sentimento individual que se pode relegar ao âmbito privado, mas como uma realidade
que, ao estar também organizada em estruturas visíveis, necessita de ver reconhecida
a sua presença comunitária pública. Por isso cabe ao Estado garantir a possibilidade
do livre exercício de culto de cada confissão religiosa, bem como as suas atividades
culturais, educativas e caritativas, sempre que isso não esteja em contraste com a
ordem moral e pública. Ora, a contribuição da Igreja não se limita a concretas iniciativas
assistenciais, humanitárias, educativas, etc., mas tem em vista, sobretudo, o crescimento
ético da sociedade, impulsionado pelas múltiplas manifestações de abertura ao transcendente
e por meio da formação de consciências sensíveis ao cumprimento dos deveres de solidariedade.
Portanto o Acordo assinado entre o Brasil e a Santa Sé é a garantia que possibilita
à comunidade eclesial desenvolver todas as suas potencialidades em benefício de cada
pessoa humana e de toda a sociedade brasileira. Dentre estes campos de mútua
colaboração, apraz-me salientar aqui, Senhor Embaixador, o da educação, para o qual
a Igreja contribui com inúmeras instituições educativas, cujo prestígio é reconhecido
por toda a sociedade. Com efeito, o papel da educação não pode se reduzir a uma mera
transmissão de conhecimentos e habilidades que visam à formação de um profissional;
mas deve abarcar todos os aspectos da pessoa, desde a sua faceta social até ao anelo
de transcendência. Por esta razão, é conveniente reafirmar que o ensino religioso
confessional nas escolas públicas, tal como foi confirmado no referido Acordo de 2008,
longe de significar que o Estado assume ou impõe um determinado credo religioso, indica
o reconhecimento da religião como um valor necessário para a formação integral da
pessoa. E o ensino em questão não pode se reduzir a uma genérica sociologia das religiões,
porque não existe uma religião genérica, aconfessional. Assim o ensino religioso confessional
nas escolas públicas além de não ferir a laicidade do Estado, garante o direito dos
pais a escolher a educação de seus filhos, contribuindo desse modo para a promoção
do bem comum. Enfim, no campo da justiça social, o Governo brasileiro sabe que
pode contar com a Igreja como um parceiro privilegiado em todas as suas iniciativas
que visam a erradicação da fome e da miséria. A Igreja «não pode nem deve colocar-se
no lugar do Estado, mas também não pode nem deve ficar à margem na luta pela justiça»
(Encíclica Deus caritas est, 28), pelo que a ela sempre se mostrará feliz em auxiliar
na assistência aos mais necessitados, ajudando-lhes a livrar-se da sua situação de
indigência, pobreza e exclusão. Senhor Embaixador, ao concluir este encontro,
renovo-lhe os meus votos de bom êxito na sua missão. No desempenho da mesma, estarão
sempre à sua disposição os vários Dicastérios que formam a Cúria Romana. De Deus Onipotente,
por intercessão de Nossa Senhora Aparecida, invoco as maiores Bênçãos para a sua pessoa,
para os que lhe são caros e para a República Federativa do Brasil, que Vossa Excelência
tem a honra, a partir de agora, de representar junto da Santa Sé.
Vaticano,
31 de outubro de 2011. [Benedictus PP. XVI]