"Desmundanizar" a Igreja, para a manter fiel à sua missão de estar no mundo sem ser
do mundo: Bento XVI aos católicos empenhados na Igreja e na sociedade
(25/9/2011) O último encontro da viagem á Alemanha foi dedicado por Bento XVI aos
“católicos comprometidos na Igreja e na sociedade”, Por fidelidade à sua missão,
a Igreja tem contínua necessidade de mudança e de adaptação aos novos tempos. Mas
em que sentido é que a Igreja deve mudar? Não, decerto, por tática. Conforme ao mistério
de Cristo, o Deus incarnado, o cristão e a Igreja hão-de estar bem presentes ao mundo
e no mundo, mas sem ser do mundo, sem se conformarem com este. Para ser fiel a si
mesma, a Igreja há-de esforçar-se incessantemente por “desmundanizar-se”, destacar-se
da mundanidade deste mundo (o que não significa retirar-se dele). Esta, em grandes
traços, a mensagem central que Bento XVI quis deixar aos “católicos empenhados na
sociedade e na Igreja”, no encontro que com eles teve na Sala de Concertos de Friburgo.
A concluir esta sua viagem, este discurso aparece também como que uma síntese do que
de mais importante o Papa queria transmitir aos católicos do seu país de origem .
-Evocando
a progressiva diminuição da prática religiosa e o crescente afastamento duma parte
notável de baptizados da vida da Igreja, Bento XVI interrogou-se a Igreja não deverá
porventura mudar. Não deverá a Igreja, nos seus serviços e estruturas, adaptar-se
ao tempo presente, para chegar às pessoas de hoje que vivem em estado de busca e na
dúvida?
Naturalmente – reconheceu – “cada cristão e a comunidade dos crentes
são chamados a uma contínua conversão”. A questão é de ver como se há-de configurar
concretamente esta mudança. Será porventura uma renovação parecida com a que realiza,
por exemplo, um proprietário de uma casa mediante uma reestruturação ou a pintura
do seu prédio? Ou trata-se de uma correcção para retomar a rota e percorrer, de modo
mais ágil e directo, um caminho? “Certamente – admitiu - têm importância estes e outros
aspectos. Mas, no caso da Igreja, o motivo fundamental da mudança é a missão apostólica
dos discípulos e da própria Igreja. De facto a Igreja deve verificar incessantemente
a sua fidelidade a esta missão”. O que implica certo distanciamento em relação ao
meio em que está mergulhada:
“Para cumprir a sua missão, ela deverá continuamente
manter a distância do seu ambiente, deve por assim dizer desmundanizar-se.”
Com
a incarnação do Filho de Deus, existe um intercâmbio, uma permuta, entre Deus e os
homens . Claro que “tal permuta só é possível pela generosidade de Deus que aceita
a pobreza do mendigo como riqueza, para tornar suportável o dom divino, que o homem
não pode recambiar com nada de equivalente”. “A Igreja insere-se totalmente nesta
atenção condescendente do Redentor pelos homens. Ela mesma está sempre em movimento,
deve colocar-se continuamente ao serviço da missão que recebeu do Senhor”. Porém,
advertiu Bento XVI, “no desenvolvimento histórico da Igreja manifesta-se também uma
tendência contrária, ou seja, a de uma Igreja que se acomoda neste mundo, tornando-se
auto-suficiente e adaptando-se aos critérios do mundo. Deste modo, dá uma importância
maior, não ao seu chamamento à abertura, mas à organização e à institucionalização”.
Há, portanto, que manter sempre um esforço de destaque, de desprendimento...
“Para
corresponder à sua verdadeira tarefa, a Igreja deve esforçar-se sem cessar por destacar-se
da mundanidade do mundo. Assim fazendo, ela segue as palavras de Jesus: Eles não são
do mundo, como também Eu não sou do mundo.”
“Em certo sentido (reconheceu
textualmente o Papa), a história vem em ajuda da Igreja com as diversas épocas de
secularização, que contribuíram de modo essencial para a sua purificação e reforma
interior. De facto, as secularizações (expropriação de bens da Igreja, cancelamento
de privilégios, etc) – sempre significaram uma profunda libertação da Igreja de formas
de mundanidade: despojava-se, por assim dizer, da sua riqueza terrena e voltava a
abraçar plenamente a sua pobreza terrena”.
“Os exemplos históricos mostram
que o testemunho missionário de uma Igreja «desmundanizada» refulge de modo mais claro.
Liberta do seu fardo material e político, a Igreja pode dedicar-se melhor e de modo
verdadeiramente cristão ao mundo inteiro, pode estar verdadeiramente aberta ao mundo”.
Mas esta abertura ao mundo – precisou Bento XVI – não se destina a obter
a adesão dos homens a uma instituição com suas próprias pretensões de poder, mas sim
a fazê-los reentrar em si mesmos, conduzindo-os deste modo a Deus. “Através deste
estilo de abertura da Igreja ao mundo, delinea-se também, ao mesmo tempo, a forma
em que se pode realizar, eficaz e adequadamente, a abertura ao mundo por parte do
indivíduo cristão.” Não é de modo algum uma táctica oportunista...
“Não se
trata de encontrar uma nova táctica para relançar a Igreja. Trata-se, isso sim, de
depor tudo aquilo que seja apenas táctica, prucurando a plena sinceridade, que não
descura nem reprime nada da verdade do nosso hoje, mas realiza a fé plenamente no
hoje vivendo-a precisa e totalmente na sobriedade do hoje, levando-a à sua plena identidade,
tirando dela aquilo que só na aparência é fé, quando na verdade não passa de convenções
e hábitos nossos.” Antes deste encontro, o Papa tinha-se encontrado com os juízes
do Tribunal Constitucional alemão, despedindo-se em seguida de um grupo de benfeitores
da Igreja, dos membros do comité organizador da visita e das forças de segurança germânica.