Belo Horizonte, 11 set (RV) - O florão da América, ao comemorar os 189 anos
de sua Independência, cobriu-se de verde-amarelo e de outras cores, com a inclusão
de outros valores e patrimônios imateriais da cultura brasileira. Vestiu-se também
de preto. O 17º Grito dos Excluídos, congregando movimentos e pastorais sociais, ganhou
um pouco mais de sonoridade com o movimento de combate à corrupção que, historicamente,
assola instituições na sociedade brasileira. É uma lamentável pandemia que entranha
facilmente e, confortavelmente, se hospeda na cultura, isto é, nos hábitos e costumes,
até nos mais elementares. A consequência é o comprometimento da cidadania que o Dia
da Pátria poderia celebrar como conquista e comprovação de grandes e contundentes
avanços.
As nulidades ainda estão triunfando com força de perpetuar atrasos
e um modus vivendi que, justificados como cultura - na verdade uma subcultura, ou
melhor, uma contracultura -, impedem avanços, mais rapidez e inteligência estratégica
para geração de cenários novos enquanto superação da deficitária situação habitacional,
a erradicação da miséria e, particularmente, uma configuração mais nítida e incidente
da cultura da solidariedade.
Essas e outras demandas, com suas urgências,
precisam incontestavelmente de uma modificação significativa na realidade da corrupção
que envenena projetos, compromete programas, corrói o erário público, aumenta a indiferença
que anula o sentido, o comprometimento social e político das cidadanias. Além de estratégias
perversas - o uso equivocado da razão, que faz pouco efeito em função da cegueira
produzida pela ganância e pelo incontido amor ao dinheiro -, estão incluídos outros
agentes perniciosos que fortemente contribuem para complicar a solução deste enigma
moral.
É lamentável e desolador constatar a condição de refém que instituições
importantes na sociedade têm experimentado como uma verdadeira camisa de força, impeditiva
de avanços essenciais e de velocidade no parâmetro da rapidez que esta segunda década
do terceiro milênio pressupõe para que não se perca, ainda mais, o trem da história.
A incompetência é um destes agentes.
Na verdade, é comum encobrir a incompetência
com uma consciência de si que está, ridiculamente, além dos desempenhos mostrados
em tarefas, funções e missões. Aliás, não se consegue introduzir tão facilmente o
mecanismo de avaliação de desempenho. A resistência é sempre grande. Avaliar é oportunidade
de, por diálogos e medições, refletir competências. Pode revelar o blefe de aparências
e faz de conta. Esse mal assola todas as instituições. As religiosas, como as políticas,
governamentais e sociais estão vivendo esse problema. Constata-se um agravante disfarçado
num tipo de crítica pejorativa que se põe como defesa de mediocridades e sustento
de lideranças frágeis na condução de processos e nas respostas a exigências de transformações
mais profundas e rápidas.
Este cenário, configurado também com outras nuanças,
aponta que só o diálogo pode abrir um caminho novo. Esse entendimento inclui, de maneira
inteligente, supondo a postura crítica, a possibilidade de um julgamento que desvenda
complexidades, permite encontrar soluções novas e respostas adequadas. Ora, crítica
em diálogo não é discurso rasteiro próprio de magoados, de amantes do poder perdido,
dos amargurados e dos que adotam arbitrariedades para conseguir, a qualquer preço,
um lugar ao sol.
O sentido de pátria na cidadania, exigência própria e conduta
indispensável de cada cidadão, indica a premência da elaboração de uma definição mais
apurada da crise ética que se está vivendo, atingindo frontalmente a direção que alavanca
a vida no rumo correto para se perceber os riscos dos relativismos que emolduram a
cidadania e a vida contemporânea.
A complexidade da realidade, gerada pela
lista incontável de demandas, exige um debruçar-se sobre ela, não apenas com o critério,
por exemplo, do mercado que produz, incontestavelmente, a erosão das relações básicas
e inegociáveis. Exige-se a pinça afiada da ética para enfrentar adequadamente as crises
como a ecológica, humana, de sentido e exercitar a cidadania na desafiadora assimetria
que caracteriza a vivência da solidariedade - um remédio urgente e indispensável visando
o futuro, não tão mais caótico, da sociedade.
A escuta do clamor dos pobres
- exercício do verdadeiro e indispensável sentido social e equilíbrio no campo político
- para além das aberrações diárias no âmbito da representação do povo, e o luto que
caracteriza a indignação indispensável contra a corrupção, produz avanços para que
seja realidade a referência gentil pátria amada.
Dom Walmor Oliveira
de Azevedo Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte - MG