Tóquio, 24 mar (RV) - O panorama descortinado de uma elevação ao lado do mar
é sempre encantador, mesmo quando as ondas se projetam contra as rochas, transformando
sua água em espuma. Ao ouvir os estrondos ficamos boquiabertos, pela força que a massa
líquida em movimento é capaz. Podemos baixar também à praia e, prazerosamente, sentir
a areia sob nossos pés ao caminhar, ou transformá-la em “colchonete” para nos espreguiçar
ao sol, ao som do marulhar do vai e vem das ondas visitando a praia.
Pareceria
incrível acreditar que tão fascinante beleza e tranquilidade em algum lugar do mundo
viessem a se transformar em horror, em força indomável a triturar casas, a rolar veículos
e barcos como brinquedos, a tragar, avidamente, vidas e a deixar para trás tudo o
que pode ser contido dentro da palavra, em letras maiúsculas: DESTRUIÇÃO.
Morando
num país de tecnologia de ponta,embora não lhe faltem circunstâncias para revelar
suas deficiências, fomos inundados por imagens avassaladoras, em tempo real, de um
espetáculo macabro.
Fazer perguntas sobre a tragédia vivida faz parte do espírito
de busca do ser humano. Por que as ondas se levantaram tanto aqui enquanto, em outros
lugares, elas deslizavam tranqüilas e calmas? Por que o oceano cometeu esse assalto
devastador? De onde vem essa fúria indomável? O que fizemos para que as ondas cavalgassem
sobre a terra? O que fizemos às costas, à surdina do mar, cantado em versos e prosa?
Algumas das respostas podem ficar por conta do desenvolvimentismo todo poderoso e
arrogante, que não respeita os equilíbrios sagrados, enclausura mares, aterra suas
praias, levanta quebra ondas e reclama dele espaços físicos, que lhe são necessários
para que sua energia se expanda e retome a calma, depois que os elementos, nas entranhas
da terra, se acomodem. O homem deverá aprender a língua da natureza para dialogar
com ela, desistindo do monólogo, que é sua marca registrada.
A tragédia assolou
a terra. Ali estão milhares de pessoas, cuja única riqueza é a vida. Cada uma delas
abriga dentro de si os “tsunamis” compostos das emoções e sentimentos, que precisam
ser elaborados, para reencontrar sua tranquilidade.
A trágica experiência,
vivida no Oriente, pode nos fazer redescobrir o que foi encoberto com o materialismo:
a fé na vida, que nunca acaba; esperança de uma vida sustentada; a solidariedade,
que faz pessoas diferentes se abraçarem.
“Não ha nada de oculto que não seja
revelado”. O grande terremoto de 11 de março de 2011, seguido de tsunami, expôs aos
olhos do ser humano o monstro nuclear “Fukushima Daichiichi”, com seus seis reatores
fora de controle. O átomo que Deus criou unido, o homem o separou, para criar seu
próprio instrumento de destruição. Já foi experimentado em Hiroshima e Nagasaki provando
que é eficiente.
O mundo está cheio de incógnitas, diante do sério perigo que
a energia nuclear representa para a humanidade. Podemos estar diante de tsunamis radioativos
invisíveis, que podem deixar nossas casas intactas, mas as pessoas, sem vida.
Nem
tudo é calamidade. A amizade e a solidariedade aplacam as fúrias dos mares encapelados
do passado. É animador saber que a China vem ao encontro de seu velho inimigo, como
amiga, para ajudar esquecendo as oxidadas batalhas. As sacudidas sofridas por ambos
os países, nos últimos anos, as lágrimas derramadas, as vidas que já não estão aqui,
ensinam que somos uma só humanidade fraterna.
O Japão, que já deu exemplo de
como é possível surgir das cinzas da Segunda Guerra Mundial, poderá ser o símbolo
de que é preciso construir uma sociedade nova, que priorize o ser humano em harmonia
com a natureza.
Das tragédias vividas pelo povo japonês e de sua capacidade
de soerguimento, podemos sonhar na construção de uma sociedade que respeita a vida
em todas as suas manifestações. Aqui é onde nasce o sol sobre um planeta sem males.