2010-11-06 15:02:14

Em Santiago de Compostela o Papa alerta para confronto com o laicismo, e apela a um testemunho público da fé


(6/11/2010) O Papa iniciou neste sábado , em Santiago de Compostela, onde chegou cerca de 11h30, uma visita de 36 horas a Espanha, que termina amanhã em Barcelona com a consagração da Sagrada Família do arquitecto Antoni Gaudí. O périplo de Bento XVI suscita entusiasmo na Igreja espanhola e, se em terras galegas marca o fim do Ano Santo Compostelano, já na capital catalã gerou polémica.
Durante as oito horas de estadia em Santiago de Compostela, cidade que nunca visitou, o Papa encontrou à sua espera uma multidão de peregrinos, muitos dos quais oriundos do Norte de Portugal. A enchente prevista levou a que a missa, a meio desta tarde, daqui a pouco mais de uma hora seja celebrada ao ar livre, na Praça do Obradoiro, pois na catedral apenas poderiam estar 800 pessoas. Através de nove ecrãs gigantes colocados em vários pontos da cidade, os peregrinos poderão acompanhar a celebração .

Para a Igreja católica na Galiza, que não recebia uma visita papal desde João Paulo II, em 1982, a presença de Bento XVI é um tónico. Os seus responsáveis esperam revitalizar a tradição jacobeia em terras em que a Igreja tem problemas de escassez e envelhecimento: há 600 padres para 1073 paróquias e a média etária do clero é de 67 anos.

De Santiago de Compostela o enviado da Rádio Vaticano Pacheco Gonçalves: RealAudioMP3
Peregrino entre os numerosos peregrinos deste Ano Xacobeu, Bento XVI seguiu em Santiago os passos rituais dos fiéis ao chegar à catedral de Compostela, incluindo a passagem pela Porta Santa e o tradicional abraço à imagem de S. Tiago. Ele próprio fez questão de declarar, logo no aeroporto, ter vindo também ele a inserir-se na ampla série de homens e mulheres que, ao longo dos séculos, sobretudo da Europa mas não só, aqui se deslocaram. Uma deslocação não só ritual, evidentemente, mas de quem, para além da veneração do Santo, “se deixa transformar pelo seu testemunho de fé”– disse. E foi assim que os peregrinos de Santiago, de todos os tempos, “foram criando uma estrada de cultura, de oração, de misericórdia e conversão, que se concretizou em igrejas e hospitais, hospedarias, pontes e mosteiros”.

“Sinto uma profunda alegria por estar de novo em Espanha que deu ao mundo uma plêiade de grandes santos, fundadores e poetas, como Inácio de Loyola, Teresa de Jesus, João da Cruz, Francisco Xavier, entre muitos outros; e que no século XX suscitou novas instituições, grupos e comunidades de vida cristã e acção apostólica, e, nas últimas décadas, caminha em concórdia e unidade, em liberdade e paz, encarando o futuro com esperança e responsabilidade”.

Já no centro da cidade, na catedral, Bento XVI, em completa sintonia com o seu estilo pessoal que tende a sublinhar a dimensão espiritual da vida cristã e do seu próprio ministério e a redimensionar as inevitáveis manifestações exteriores, Bento XVI começou por um momento de oração pessoal na capela do Santíssimo, deslocando-se depois ao Pórtico da Glória e saudar os fiéis já congregados na Praça da Obradoro. Atravessando de novo o interior da catedral e usando uma saída lateral, o Papa realizou o rito dos peregrinos no Ano jubilar, passando a Porta Santa e venerando o túmulo do Santo. Foi então que, de junto do altar-mor da catedral, o Papa interveio numa alocução em que sublinhou o autêntico sentido do peregrinar cristão:

“Peregrinar não é simplesmente visitar um lugar qualquer para admirar os seus tesouros de natureza, arte ou história. Peregrinar significa, antes, sairmos de nós próprios para irmos ao encontro de Deus onde Ele se manifestou, onde a graça divina se mostrou com particular esplendor e produziu abundantes frutos de conversão e santidade entre os crentes”.

Aludindo ao tema da “genuína liberdade”, questão que justamente o preocupa, o Papa sublinhou que é precisamente a imagem divina, impressa no homem, que constitui “a verdade mais profunda do seu ser” e “a origem” da sua liberdade:

“Entre verdade e liberdade existe uma relação estreita e necessária. A busca honesta da verdade, aspirar a ela, é a condição para uma autêntica liberdade. Não se pode viver uma sem a outra. A Igreja, que deseja servir com todas as suas forças a pessoa humana e a sua dignidade, está ao serviço de ambas, da verdade e da liberdade”.


Voltando ainda à chegada ao aeroporto, de referir a intensa neblina que também hoje cobria Santiago. O restante tráfego aéreo foi desviado para os outros aeroportos da Galiza – Vigo e Coruña, tendo aterrando em Santiago de Compostela apenas os voos que transportavam, respectivamente, a delegação governamental de acolhimento ao Papa (presidida pelo ministro da Administração Interna) e aquele em que viajava o Príncipe das Astúrias, anfitrião oficial de Bento XVI, e a esposa. O avião que transportava o Pontífice e a sua comitiva aterrou alguns minutos antes da hora prevista (11.30).
Desde o primeiro momento, o Papa mostrava-se sorridente, descontraído, no modo simples e cordial que todos conhecemos.
O discurso do Príncipe Filipe, herdeiro do trono, foi para além das palavras de circunstância. Referindo ter ele próprio querido percorrer recentemente, com a esposa, uma etapa do caminho de Santiago – “maravilhoso itinerário espiritual e cultural” (disse), o herdeiro do trono espanhol exaltou a importância que esta rota de peregrinos teve para a construção da Europa:

“Este grande Caminho de encontro e de diálogo, tão vinculado à nossa história e cultura, que desde há séculos recorre e une a Europa, converteu-se num verdadeiro símbolo de concórdia, fraternidade e solidariedade. Promove valores e abre os espíritos. Convoca-nos à reflexão e ao reencontro connosco. Convida-nos a superarmo-nos, a enfrentar desafios e a alcançar novas metas”.

Recordando, com “apreço” o “compromisso” de Bento XVI “a favor da paz, da liberdade e da dignidade do ser humano, o Príncipe das Astúrias declarou que tal atitude “reconforta-nos muito especialmente nestes tempos complexos e de crise, que o mundo vive”. “Tempos … que requerem firmeza, empenho pessoal e esforço dos governantes da terra e de todos os homens e mulheres de boa vontade”.

“Desde Santiago, a Espanha contribuiu para promover valores e alargar os horizontes da Europa. Também hoje deseja , como país moderno, aberto e democrático, transmitir desde Santiago a sua voz comprometida e solidária com os problemas e necessidades de tantos povos e seres humanos” (fim de citação).
De Santiago de Compostela, para a RV, PG










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