Cidade do Vaticano, 29 set (RV) - Domingo passado comemoramos o Dia da Bíblia.
Dentro do mês de setembro este tema sempre retorna. Será muito importante que estejamos
abertos e atentos para esse grande dom de ouvir o Senhor, que inspirou os autores
sagrados e nos ilumina com a Palavra que é luz para os nossos caminhos.
O discípulo
amado nos ensina que: “Eles não são do mundo, como também eu não sou do mundo. Santifica-os
pela verdade. A tua palavra é a verdade. Como tu me enviaste ao mundo, também eu os
enviei ao mundo. Santifico-me por eles para que também eles sejam santificados pela
verdade. Não rogo somente por eles, mas também por aqueles que por sua palavra hão
de crer em mim”. (cf. Jo 17,19-23). Santificados pela palavra de Deus! Este é o resumo
deste ensinamento de Jesus.
O Senhor pede-nos uma prática progressiva e constante
no nosso processo de santificação pessoal. Santificação que nos é pedida pela aplicação
da verdade que está contida e explicitada na Sua palavra.
Nesta perspectiva,
a palavra de Deus é mais ampla do que apenas o texto sagrado, um sinal da própria
vontade de Deus, expressão de seu amor em relação ao seu plano para o homem.
O
Espírito Santo usa a palavra de Deus para realizar a sua ação de santificação do homem.
Cabe-nos discernir sobre este processo de santidade e a aplicação da Palavra para
que ela possa se realizar. Na verdade, este é um processo constante.
Portanto,
Palavra de Deus não é um manual de instruções, não uma especulação simplesmente pessoal,
mas palavra que deve ser sentida e que é uso especial que Deus se serve para realizar
maravilhas em nossas vidas, para nos dar a graça.
Esta Palavra nos santifica
para estudar, meditar e aplicar a verdade que Jesus nos promete sobre a nossa vida
cotidiana. A palavra é, assim, revelação perfeita da vontade de Deus sobre nós.
Em
suma, há na escritura ensinamento doutrinal e instrução moral, mas a sua verdade mais
profunda é a de ser um lugar privilegiado de encontro com Deus, e onde Ele nos fala
da vida, vida de mudança pessoal ao Seu encontro.
Lembremo-nos que a Escritura,
e também o próprio cristianismo, não são uma filosofia de vida, mas uma relação pessoal
do homem com Deus.
A Palavra Sagrada deve ser, portanto, para o cristão, um
aprofundamento deste íntimo relacionamento. O Concílio Vaticano II enfatizou a
importância da Palavra afirmando que esta é verdadeiro alimento do povo de Deus. Na
verdade, o pão da vida e o pão da palavra nos são dados na mesa eucarística. (Último
capítulo da Dei Verbum).
Portanto, um e outro pão são presença viva de Jesus,
palavra eterna do Pai, que estão durante o Seu sacrifício redentor, atualizado na
Eucaristia. A Igreja “venera as divinas escrituras tal com venera o corpo do Senhor”
(DV 21).
O Concílio, nesta esteira, também proclama e ensina que o “acesso
à Sagrada deve ser aberto para os fiéis”. O Concílio assim estimula o estudo, o conhecimento,
bem como as traduções da Escritura. Ele ainda incentiva, também, os diversos grupos,
até mesmo ecumênicos, que possam utilizar-se de textos mais apropriados ao diálogo.
Talvez
o capítulo mais central de todo o Concílio não esteja na própria Dei Verbum, e sim
na Lumem Gentium e, neste, no seu capítulo V, onde faz um apelo universal à santidade,
e que esta atinge a todos, não importando o estado de vida em que se encontre.
A
santidade é um apelo a uma metanoia profunda, a uma mudança de rumo, sendo Deus o
Amor e sendo este Amor partilhado com os homens.
E a própria Igreja somente
se santifica se ela também cresce na caridade e predestina-se a este. Perguntemo-nos,
pois, se crescemos nesta santificação.
E onde buscar esta fonte para nos tornarmos
santos, para amarmos como Ele mesmo amou? Diz-nos o mesmo Concílio: nos sacramentos
e na Palavra de Deus (DV 26).
Podemos perceber uma maior busca pelo estudo
da Bíblia e os diversos avanços no conhecimento do seu texto, seja pelos mais simples
até os grandes centros de estudo bíblico espalhados pelo mundo.
Neste ponto,
muito ajudaram a Filologia e mesmo a Arqueologia, certamente. Tudo isso é sinal da
graça de Deus! Porém, não podemos perder a perspectiva central: encontramo-nos com
o Senhor pela Bíblia, pela Sua Palavra! Nela podemos ouvi-Lo e responder-Lhe. Somos
chamados a ser Seus amigos. Ele nos quer em união com Ele.
Encontrá-Lo através
da Escritura é um dos segredos para transformarmos a nossa jornada de vida em caminhada
constante de alegria e de esperança renovadas.
† Orani João
Tempesta, O. Cist. Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro,
RJ