Servem fiéis leigos não arrogantes, nem polémicos, mas que saibam em que é que crêem
ou não crêem: Bento XVI na beatificação do Card. Newmam
(19/9/2010) Termina neste Domingo a viagem apostólica ao Reino Unido de Bento XVI
que depois do primeiro dia passado na Escócia e dos dois em Londres, transferiu-se
para Birmingham onde presidiu a Missa para a beatificação do cardeal britânico John
Henry Newman, uma das maiores figuras eclesiais no século XIX que o Papa quis apresentar
como modelo de pensador e líder espiritual quando a Igreja Católica atravessa um momento
delicado. Perante mais de 50 mil pessoas, que assinalaram com palmas o momento
solene, o Arcebispo de Birmingham, D. Bernard Longley, pediu formalmente que o Papa
beatificasse John Henry Newman e o vice-postulador da causa de canonização leu uma
pequena biografia. Bento XVI proferiu, em seguida, a fórmula de beatificação, anunciando
que a festa litúrgica do Beato Newman será celebrada a 9 de Outubro, precisamente
a data da sua conversão, em 1845. Um retrato do novo beato foi destapado e as suas
relíquias colocadas junto ao altar, antes de o Papa cumprimentar o Arcebispo local
e o vice-postulador da causa do Cardeal Newman, que continuará agora a trabalhar para
a sua canonização. Na homilia da Missa, Bento XVI começou por sublinhar o profundo
sentido, na vida dos cristãos, do domingo, “o dia do Senhor, o dia em que o Senhor
Jesus ressuscitou dos mortos”, logo evocando também uma celebração especial que tem
lugar neste dia na nação britânica: a comemoração dos 70 anos da “Batalha da Inglaterra”.
“Para mim, que vivi e sofri ao longo dos tenebrosos dias do regime nazista na Alemanha
(declarou o Papa Ratzinger), é profundamente comovente encontrar-me aqui convosco,
nesta ocasião, e recordar tantos dos vossos concidadãos que sacrificaram a sua própria
vida, resistindo corajosamente às forças daquela ideologia maligna”.
“Setenta
anos depois, recordamos com vergonha e com horror a tremenda quantidade de morte e
destruição que a guerra traz consigo ao deflagrar e renovamos o nosso propósito de
agir a favor da paz e da reconciliação, em qualquer lugar onde surgir a ameaça de
conflitos”.
Passando depois a referir a figura de John Henry Newman, agora
proclamado Bem-aventurado, Bento XVI convidou a prestar glória e louvor a Deus pelas
virtudes heróicas deste santo homem inglês. Numa Inglaterra com grande tradição de
santos mártires (observou o Papa), “é justo e conveniente reconhecer hoje a santidade
de um confessor, um filho desta nação, que, embora não tenha sido chamado a derramar
o próprio sangue pelo Senhor, lhe prestou contudo um eloquente testemunho ao longo
de uma vida dedicada ao ministério sacerdotal, especialmente na pregação, no ensino
e nos escritos”. Foi na esteira de outros Santos e Mestres das Ilhas Britânicas,
como São Beda, Santa Hilda, Santo Aelredo e Duns Scoto (entre outros), que “aquela
graciosa tradição de ensino, de profunda sabedoria humana e de intenso amor ao Senhor
deu ricos frutos no Bem-aventurado John Henry” – sublinhou o Papa, que recordou o
lema do cardeal Newman – “O coração fala ao coração”, que permite penetrar na sua
compreensão da vida cristã como chamada à santidade:
“O Evangelho de hoje
diz-nos que ninguém pode ser servo de dois patrões e o ensinamento do Beato John Henry
sobre a oração explica que o cristão é colocado de maneira definitiva ao serviço do
único verdadeiro Mestre, o único que tem direito à nossa dedicação incondicionada,
Newman ajuda-nos a compreender o que isto significa na nossa vida quotidiana: diz-nos
que o nosso divino Mestre atribuiu a cada um de nós uma tarefa específica, um serviço
bem definido, confiado unicamente a cada indivíduo”.
“O serviço específico
a que foi chamado o Beato John Henry Newman comportou a aplicação da sua subtil inteligência
e da sua prolífica pena a muitos dos mais urgentes problemas do dia”.
“As
suas intuições sobre fé e razão, sobre o espaço vital da religião revelada na sociedade
civilizada, e sobre a necessidade de abordar a educação de um modo amplamente fundamentado
e com um largo horizonte, não foram apenas de profunda importância para a Inglaterra
vitoriana, mas continuam ainda hoje a inspirar e iluminar muitos em todo o mundo”.
Firmemente contrário a uma visão redutiva ou utilitarista da educação, Newman
propunha um ambiente educativo conjugando formação intelectual, disciplina moral e
empenho religioso. Nesse sentido, ele desejava leigos crentes e esclarecidos, para
formar as novas gerações. Como ele próprio escreveu no seu famoso apelo para um laicado
inteligente e bem instruído:
“Quero um laicado não arrogante, não precipitado
nos discursos, não polémico, mas homens que conheçam a sua religião, que nela penetrem,
que saibam bem onde se elevam, que saibam em que é que crêem ou não crêem, que conheçam
suficientemente o próprio credo ao ponto de poderem dar contas dele, que conheçam
bem a história ao ponto de a defenderem. Hoje, no momento em que o autor destas
palavras é elevado à honra dos altares, rezo para que, mediante a sua intercessão
e o seu exemplo, quantos são empenhados na tarefa do ensino e da catequese, se inspirem
no maior esforço da sua visão, tal como se apresenta claramente diante de nós”.
Introduzindo, no final da Missa, a costumada recitação do Angelus dominical, Bento
XVI começou por evocar a beatificação, neste sábado, em Sevilha, de Madre Maria da
Puríssima da Cruz, fazendo votos de que a nova bem-aventurada “seja de inspiração,
para as jovens, a seguirem o seu exemplo de total amor a Deus e ao próximo”.
O
Papa recordou o amor a Nossa Senhora, manifestado por John Newman, que dedicou à Imaculada
Conceição o primeiro Oratório por ele fundado e que colocou a Universidade católica
Irlandesa sob a protecção de Maria, Sede da Sabedoria. Citando um texto em que o novo
Beato meditava sobre os dons da graça com que Deus cumulou a Mãe de Cristo, Bento
XVI sublinhou que é precisamente exaltando essa graça do Salvador que os fiéis invocam
a intercessão de Maria:
“É tendo como base esses abundantes dons de graça
que nós a honramos, e tendo em conta a sua íntima ligação com o seu divino Filho,
que nós procuramos naturalmente a sua intercessão pelas nossas necessidades e pelas
necessidades de todo o mundo”.