Rio de Janeiro, 07 set (RV) - Iniciamos o mês de setembro, temático mês da
Bíblia, que neste ano sugere para a reflexão nacional o livro de Jonas e nos recorda
o envio de todos nós para evangelizar a grande cidade. No próximo dia 30, celebraremos
a memória de São Jerônimo, presbítero e Doutor da Igreja, que teve o grande mérito
de produzir uma tradução das línguas originais da Bíblia para o latim, a assim chamada
Vulgata. São Jerônimo assim o fez para popularizar o texto da Escritura Sagrada. Isso
possibilitou, sem dúvida, outras traduções e mais facilidade para o seu estudo e aprofundamento.
Por
essa razão, a Igreja deseja, neste mês, recordar a importância da Bíblia, Palavra
de Deus revelada, que é um dos textos mais importantes do mundo humanamente falando
e, para nós cristãos, é a luz que conduz nossos passos. Suas inúmeras traduções para
os mais diversos idiomas e dialetos são enormes. A sua difusão e estudo nos mais diversos
países e culturas demonstra a sua força de comunicação.
Para nós, católicos
apostólicos romanos, Cristo é o Verbo, a Palavra de Deus que se fez carne e veio habitar
entre nós. A Sagrada Escritura e a Tradição nos fazem uma promessa de vida humanizada
na pessoa de Jesus. Precisamos desta Palavra de Salvação, pois não podemos viver plenamente
sem conhecer verdadeiramente a Deus.
A Bíblia é a revelação de Deus
numa linguagem humana e compreensível para todos, através de séculos. Muito embora
tenha sido escrita durante longos períodos não contínuos ela apresenta-se como uma
unidade perfeita. E também entre seus diversos autores, mesmo que não tenham se conhecido,
existe uma harmonia e coerência iluminadas pelo Espírito Santo, o autor principal
da Bíblia.
Ela contém diversas formas literárias, história, biografias,
poemas, provérbios, frases, cartas, leis, instruções e outras inúmeras manifestações
literárias do ser humano. Escreveram com a cultura humana, porém inspirados por Deus.
Devemos
nos perguntar sobre a importância da leitura e do estudo da Bíblia hoje. Ela nos traz
respostas para inúmeras perguntas que o ser humano se faz, como: qual o sentido da
vida? Como faço para alcançar a felicidade? Por que é tão difícil ser bom? Por que
há tanto mal no mundo? Ela nos traz a história da nossa salvação!
Em
suas páginas e livros encontramos os caminhos para as respostas a todas essas indagações,
que são absolutamente naturais em nossa vida. Em suas páginas podemos encontrar essa
fidelidade do Senhor, que nos traz alívio para o inconstante da vida hodierna, a futilidade
que querem impor na vida do ser humano.
É essencial que saibamos, pois,
reconhecer a vontade de Deus sobre nossa existência. A proposta do texto sagrado e
interpretado pelo magistério da Igreja é justamente essa: explicitar a vontade Deus
sobre o homem.
O Concílio Ecumênico Vaticano II indica-nos alguns critérios
sempre válidos para uma interpretação da Sagrada Escritura conforme o Espírito que
a inspirou. Antes de tudo é preciso prestar grande atenção ao conteúdo e à unidade
de toda a Escritura, pois, por muito diferentes que sejam os livros que a compõem,
a Sagrada Escritura é una em virtude da unidade do desígnio de Deus, do qual Cristo
Jesus é o centro e o coração (cf. Lc 24, 25-27; Lc 24, 44-46). É também necessário
ler a Escritura no contexto da tradição viva de toda a Igreja. Segundo Orígenes, "a
Sagrada Escritura é escrita no coração da Igreja antes do que em instrumentos materiais".
De fato, a Igreja leva na sua Tradição a memória viva da Palavra de Deus, e é o Espírito
Santo que lhe dá a interpretação da mesma segundo o sentido espiritual (cf. Orígenes,
Homiliae in Leviticum, 5, 5). Ainda mais um critério: é necessário prestar atenção
à analogia da fé, ou seja, à unidade de cada uma das verdades da fé entre elas e com
o plano integral da Revelação e a plenitude da divina economia nele encerrada.
Existe
uma unidade inseparável entre Sagrada Escritura e Tradição, porque ambas provêm de
uma mesma fonte: A Sagrada Tradição e a Sagrada Escritura relacionam-se e comunicam-se
intimamente entre si; porque, surgindo ambas da mesma fonte, de certo modo se fundem
e tendem para o mesmo fim. Com efeito, a Sagrada Escritura contém a Palavra de Deus
enquanto consignada por escrito sob a inspiração do Espírito Santo; a Sagrada Tradição,
por seu lado, transmite integralmente aos sucessores dos Apóstolos a Palavra de Deus,
confiada aos Apóstolos por Cristo Senhor e pelo Espírito Santo, para que, com a luz
do Espírito da Verdade, a guardem, exponham e difundam fielmente na sua pregação,
donde se segue que a Igreja não tira somente de um livro a certeza de todas as coisas
reveladas. Por isso, se devem receber e venerar ambas com igual afeto de piedade e
reverência (cfr. Dei Verbum, 9)
.
Devemos deixar evidente e claro que
é no contexto eclesial onde se permite que a Sagrada Escritura seja compreendida como
autêntica Palavra de Deus, que se torna guia, norma e regra para a vida da Igreja
e o crescimento espiritual dos fiéis batizados.
Convido a todos para
que o centro de nossa adesão à Trindade passe pela valorização da “lectio divina”,
aqui no Brasil chamada de “leitura orante” da Sagrada Escritura. Devemos, primeiro,
ouvi-la. Mas ouvir não basta, é preciso meditar, isto é, assimilar. Encontraremos
muitas dificuldades, mas rezem para compreender, como exorta Santo Agostinho (De Doctr.
christ. 3, 56; em: PL, 34, 89), porque, procurando o auxílio dos exegetas, guiados
pela Igreja Católica, as dificuldades tornar-se-ão estímulo para uma compreensão maior,
levando, posteriormente, a uma união mais íntima com a Palavra de Deus.
Ao
redor do feriado passado todos os grupos dos círculos bíblicos se reuniram por vicariato
para se animarem a continuar buscando nessa fonte o alimento e inspiração para serem
discípulos missionários! Que o mês da Bíblia nos ensine a rezar e meditar bem a Palavra
Revelada de Deus, e consequentemente, à luz do Espírito Santo, colocá-la em prática!
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Orani João Tempesta, O. Cist.
Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio
de Janeiro, RJ