Papa João Paulo II ao novo embaixador de Suazilândia: a fome é com frequência o resultado
da desintegração social, provocada pelo conflito e pela violência. Todos devem trabalhar
juntos para encontrar modos de impedir que tais males se propaguem
Quinta-feira, 28 de Maio de 1998 DISCURSO DO PAPA JOÃO PAULO II A SUA ALTEZA REAL
O PRÍNCIPE DAVID M. DLAMINI, EMBAIXADOR DA SUAZILÂNDIA JUNTO À SANTA SÉ POR OCASIÃO
DA APRESENTAÇÃO DAS CARTAS CREDENCIAIS
Alteza Real Dou-lhe as boas-vindas
ao Vaticano por ocasião da apresentação das Cartas Credenciais mediante as quais Sua
Majestade o Rei Mswati III o designa Embaixador Extraordinário e Plenipotenciário
do Reino da Suazilândia junto da Santa Sé. Agradeço-lhe as amáveis palavras de saudação
que Vossa Excelência me transmitiu da parte do seu Rei; com clarividente recordação
da minha visita ao seu país, realizada há alguns anos, retribuo as saudações e peço-lhe
que comunique os meus bons votos a Sua Majestade e ao inteiro povo da Suazilândia.
Vossa Excelência salientou o facto de o Reino da Suazilândia e a Santa Sé
entretecerem vínculos de amizade e cooperação que se tornam cada vez mais vigorosos,
em virtude dos objectivos que compartilhamos na nossa comum obra em prol da paz e
do bem-estar a todos os níveis da sociedade. O nosso encontro hodierno oferece-nos
a oportunidade para reflectir juntos sobre as solicitudes que nos unem enquanto nos
esforçamos por promover cada vez maiores compreensão e colaboração. Efectivamente,
a única finalidade dos esforços da Santa Sé na área dos assuntos internacionais é
a edificação de um mundo mais justo e humano, assente sobre os sólidos fundamentos
do respeito pela dignidade humana e pelos direitos do homem. Não pode haver dúvida
de que, se a comunidade internacional quiser alcançar este objectivo, deve empenhar-se
numa real e efectiva solidariedade para com todos os povos, tanto na promoção das
novas possibilidades em vista do desenvolvimento humano, que hoje estão a surgir,
como na superação das insídias à paz que estão sempre presentes.
Se olharmos
para o seu continente, podemos identificar determinados desafios que a solidariedade
internacional deve enfrentar a fim de salvaguardar o desenvolvimento humano integral
na África, assim como de assegurar o bem-estar político, económico e social do mundo
em geral. Entre as preocupações mais urgentes está a necessidade de pôr termo aos
conflitos armados, oferecer alimentos aos famintos e assistir a multidão de refugiados.
Cada um destes problemas constitui, por si só, uma fonte de enorme sofrimento; contudo,
eles justamente podem ser considerados em conjunto, dado que cada um é tanto causa
como efeito dos demais. Na África, a fome é com frequência o resultado da desintegração
social, provocada pelo conflito e pela violência. Entre as vítimas da guerra e da
miséria encontram-se as pessoas que se sentem obrigadas a abandonar o próprio lar
e a procurar abrigo noutras paragens, com a ulterior dispersão e o deslocamento de
homens, mulheres e crianças em toda a África. Durante estes últimos anos do século
XX, estatísticas fundadas confirmam que existem 6 milhões de refugiados, além de 16
milhões de pessoas deslocadas no próprio país de origem. O resultado óbvio são mais
guerras, miséria e refugiados; assim continua o círculo vicioso, com efeitos devastadores.
Quem se preocupa pelo bem-estar da África e das outras regiões do planeta,
onde se verificam tragédias análogas, não pode poupar qualquer esforço no sentido
de oferecer imediato socorro às vítimas das guerras, da miséria e dos deslocamentos.
Todos, inclusivamente os governantes das nações e os directores das organizações internacionais,
devem trabalhar juntos para encontrar modos de impedir que tais males se propaguem
e, em última análise, de lhes pôr termo. A maioria das pessoas reconhece que à violência
deve suceder o diálogo, a alimentação jamais pode ser usada como instrumento de negociação
e a distribuição dos auxílios humanitários há-de ser desobstruída e incondicional.
Infelizmente, nem sempre é fácil passar das declarações de princípio para os planos
de acção, e é a este mesmo propósito que a Santa Sé tem exortado inúmeras vezes a
comunidade internacional a agir com decisão e efectiva solidariedade, tendo em vista
ajudar as pessoas que deveras se encontram em necessidade.
Enquanto este apelo
se dirige à inteira comunidade internacional, uma particular exortação à solidariedade
é feita também aos países da própria África. As nações africanas não podem depender
da assistência estrangeira para tudo; elas dispõem de muitos homens e mulheres que
têm todos os requisitos humanos e as aptidões intelectuais para enfrentar os desafios
do nosso tempo. Como eu disse ao Corpo Diplomático no início do corrente ano: na África
«é necessária mais solidariedade "africana", para sustentar os países em dificuldade,
e também para que não lhes sejam impostas medidas ou sanções discriminatórias» (Discurso
ao Corpo Diplomático, 10 de Janeiro de 1988, ed. port. de L'Osservatore Romano de
17.1.1998, n. 4). A cooperação na análise e na avaliação das opções políticas, os
acordos recíprocos em vista de suprimir o tráfico das armas, a participação activa
nos programas de promoção da paz e da reconciliação: estes são outros tantos modos
de aumentar a credibilidade africana aos olhos do restante do mundo e hão-de encorajar
outros países a incrementarem a assistência e a serem mais respeitosos no que concerne
à soberania das nações envolvidas.
Este é o mesmo conceito de solidariedade
que inspira a Igreja católica no seu empenhamento em benefício dos projectos humanitários.
A caridade cristã encoraja o envolvimento activo dos católicos da Suazilândia – embora
estes constituam apenas uma exígua minoria entre os seus concidadãos – na obra de
desenvolvimento do progresso humano no próprio país, especialmente mediante a actividade
da Igreja nos campos da educação, da assistência médica e dos serviços sociais. Agradeço-lhe,
Senhor Embaixador, as palavras de apreço pelo compromisso da Igreja nestes sectores
e estou persuadido de que, com a garantia legal da liberdade religiosa na Suazilândia,
a comunidade católica poderá continuar a pregar a Boa Nova da salvação e a dar testemunho
da mesma mediante concretas obras de caridade e misericórdia.
Alteza Real,
a minha esperança é de que durante o período do seu serviço, a amizade e a compreensão
que têm caracterizado os relacionamentos entre o Reino da Suazilândia e a Santa Sé
continuem a aumentar. Asseguro-lhe a plena cooperação da Cúria Romana no exercício
da sua sublime missão e invoco sobre Vossa Excelência e o inteiro povo da Suazilândia
abundantes bênçãos de Deus Todo-Poderoso.