Cidade do Vaticano, 15 abr (RV) – Leia a seguir, na íntegra, o discurso de
Bento XVI aos bispos do Pará e Amapá, seguido da saudação do Presidente do Regional
Norte 2, Dom Jesus Maria Cizaurre, Bispo Prelado de Cametá.
Amados Irmãos
no Episcopado,
A vossa visita ad Limina tem lugar no clima de louvor e júbilo
pascal que envolve a Igreja inteira, adornada com os fulgores da luz de Cristo Ressuscitado.
Nele, a humanidade ultrapassou a morte e completou a última etapa do seu crescimento
penetrando nos Céus (cf. Ef 2, 6). Agora Jesus pode livremente retornar sobre os seus
passos e encontrar-Se como, quando e onde quiser com seus irmãos. Em seu nome, apraz-me
acolher-vos, devotados pastores da Igreja de Deus peregrina no Regional Norte 2 do
Brasil, com a saudação feita pelo Senhor quando se apresentou vivo aos Apóstolos e
companheiros: «A paz esteja convosco» (Lc 24,36). A vossa presença aqui tem um
sabor familiar, parecendo reproduzir o final da história dos discípulos de Emaús (cf.
Lc 24, 33-35): viestes narrar o que se passou no caminho feito com Jesus pelas vossas
dioceses disseminadas na imensidão da região amazônica, com as suas paróquias e outras
realidades que as compõe como os movimentos e novas comunidades e as comunidades eclesiais
de base em comunhão com o seu bispo (cf. Documento de Aparecida, 179). Nada poderia
alegrar-me mais do que saber-vos em Cristo e com Cristo, como testemunham os relatórios
diocesanos que me enviastes e que vos agradeço. Reconhecido estou de modo particular
a Dom Jesus Maria pelas palavras que acaba de me dirigir em nome vosso e do povo de
Deus a vós confiado, sublinhando a sua fidelidade e adesão a Pedro. No regresso, assegurai-o
da minha gratidão por tais sentimentos e da minha Bênção, acrescentando: «Realmente
o Senhor ressuscitou e apareceu a Simão» (Lc 24,34). Nesta aparição, palavras
- se as houve - diluíram-se na surpresa de ver o Mestre redivivo, cuja presença diz
tudo: Estive morto, mas agora vivo e vós vivereis por Mim (cf. Ap 1,18). E, por estar
vivo e ressuscitado, Cristo pode tornar-Se «pão vivo» (Jo 6, 51) para a humanidade.
Por isso sinto que o centro e a fonte permanente do ministério petrino estão na Eucaristia,
coração da vida cristã, fonte e vértice da missão evangelizadora da Igreja. Podeis
assim compreender a preocupação do Sucessor de Pedro por tudo o que possa ofuscar
o ponto mais original da fé católica: hoje Jesus Cristo continua vivo e realmente
presente na hóstia e no cálice consagrados. Uma menor atenção que por vezes é
prestada ao culto do Santíssimo Sacramento é indício e causa de escurecimento do sentido
cristão do mistério, como sucede quando na Santa Missa já não aparece como proeminente
e operante Jesus, mas uma comunidade atarefada com muitas coisas em vez de estar recolhida
e deixar-se atrair para o Único necessário: o seu Senhor. Ora, a atitude primária
e essencial do fiel cristão que participa na celebração litúrgica não é fazer, mas
escutar, abrir-se, receber… É óbvio que, neste caso, receber não significa ficar passivo
ou desinteressar-se do que lá acontece, mas cooperar – porque tornados capazes de
o fazer pela graça de Deus – segundo «a autêntica natureza da verdadeira Igreja, que
é simultaneamente humana e divina, visível e dotada de elementos invisíveis, empenhada
na ação e dada à contemplação, presente no mundo e, todavia, peregrina, mas de forma
que o que nela é humano se deve ordenar e subordinar ao divino, o visível ao invisível,
a ação à contemplação, e o presente à cidade futura que buscamos» (Const. Sacrosanctum
Concilium, 2). Se na liturgia não emergisse a figura de Cristo, que está no seu princípio
e está realmente presente para a tornar válida, já não teríamos a liturgia cristã,
toda dependente do Senhor e toda suspensa da sua presença criadora. Como estão
distantes de tudo isto quantos, em nome da inculturação, decaem no sincretismo introduzindo
ritos tomados de outras religiões ou particularismos culturais na celebração da Santa
Missa (cf. Redemptionis Sacramentum, 79)! O mistério eucarístico é um «dom demasiado
grande – escrevia o meu venerável predecessor o Papa João Paulo II – para suportar
ambigüidades e reduções», particularmente quando, «despojado do seu valor sacrificial,
é vivido como se em nada ultrapassasse o sentido e o valor de um encontro fraterno
ao redor da mesa» (Enc. Ecclesia de Eucharistia, 10). Subjacente a várias das motivações
aduzidas, está uma mentalidade incapaz de aceitar a possibilidade duma real intervenção
divina neste mundo em socorro do homem. Este, porém, «descobre-se incapaz de repelir
por si mesmo as arremetidas do inimigo: cada um sente-se como que preso com cadeias»
(Const. Gaudium et spes, 13). A confissão duma intervenção redentora de Deus para
mudar esta situação de alienação e de pecado é vista por quantos partilham a visão
deísta como integralista, e o mesmo juízo é feito a propósito de um sinal sacramental
que torna presente o sacrifício redentor. Mais aceitável, a seus olhos, seria a celebração
de um sinal que corresponda a um vago sentimento de comunidade. Mas o culto não
pode nascer da nossa fantasia; seria um grito na escuridão ou uma simples auto-afirmação.
A verdadeira liturgia supõe que Deus responda e nos mostre como podemos adorá-Lo.
«A Igreja pode celebrar e adorar o mistério de Cristo presente na Eucaristia, precisamente
porque o próprio Cristo Se deu primeiro a ela no sacrifício da Cruz» (Exort. ap. Sacramentum
caritatis, 14). A Igreja vive desta presença e tem como razão de ser e existir ampliar
esta presença ao mundo inteiro. «Fica conosco, Senhor!» (cf. Lc 24, 29): estão
rezando os filhos e filhas do Brasil a caminho do XVI Congresso Eucarístico Nacional,
daqui a um mês em Brasília, que deste modo verá o jubileu áureo da sua fundação enriquecido
com o “ouro” da eternidade presente no tempo: Jesus Eucaristia. Que Ele seja verdadeiramente
o coração do Brasil, donde venha a força para todos homens e mulheres brasileiros
se reconhecerem e ajudarem como irmãos, como membros do Cristo total. Quem quiser
viver, tem onde viver, tem de que viver. Aproxime-se, creia, entre a fazer parte do
Corpo de Cristo e será vivificado! Hoje e aqui, tudo isto desejo à esperançosa parcela
deste Corpo que é o Regional Norte 2, ao conceder a cada um de vós, extensiva a quantos
convosco colaboram e a todos os fiéis cristãos, a Bênção Apostólica.
Vaticano,
15 de abril de 2010
Saudação a Sua Santidade, o Papa Bento XVI, na "Visita
ad Limina" dos Bispos do Regional Norte 2
Beatíssimo Padre,
Os bispos
do Regional Norte 2 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil nos sentimos profundamente
felizes e honrados em poder saudar Vossa Santidade, por ocasião de nossa "Visita ad
Limina Apostolorum". Somos conscientes da importância deste encontro com o Sucessor
de Pedro, Bispo de Roma e da visita aos sepulcros dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo,
em vista de confirmar nossa fé em Cristo Jesus, revigorar a responsabilidade pastoral
e tornar mais visível a nossa comunhão eclesial. O Conselho Episcopal Regional
Norte 2, da Conferência Episcopal dos Bispos do Brasil congrega os bispos das dioceses
e prelazias dos Estados do Pará e Amapá e está formado por nove dioceses e cinco prelazias
territoriais. São Igrejas particulares que, no meio da Amazônia, com todas as limitações
impostas pela geografia e o clima, trabalham pela evangelização dos povos de forma
perseverante. Com alegria, queremos lhe comunicar que o Senhor da Messe continua
a semear no coração dos jovens o desejo de servi-lo na vida sacerdotal. Ano após ano
o nosso clero diocesano vem aumentando, graças a Deus, e com ele a possibilidade de
servir melhor o Povo de Deus. Igualmente, manifestamos nossa gratidão ao Senhor pela
presença testemunhal no meio do povo mais pobre das comunidades de vida consagrada. Damos
testemunho, também, do admirável trabalho pastoral de nossas lideranças leigas que
através das Comunidades Eclesiais de base, das pastorais, movimentos e serviços, com
grande espírito missionário se alimentam da Palavra de Deus e a levam a todos aqueles
que não a conhecem suficientemente. Nossas Igrejas contam com ministérios leigos atuantes
e com lideranças cada vez mais comprometidas com a causa do Reino. Porém, como
pastores estamos preocupados com o constante avanço das igrejas pentecostais, ante
o qual nos sentidos interpelados em nossos métodos e, principalmente, no dinamismo
missionário, tão insistentemente colocado em evidência pela Conferência de Aparecida. No
âmbito social, estamos empenhados pela preservação do meio ambiente e a defesa da
exploração racional e sustentável da floresta amazônica que, por causa da ambição
de cunho capitalista, a cada ano vem sofrendo constante redução da área de cobertura
florestal. Olhamos com preocupação a situação de violência urbana alimentada pelo
consumo de drogas, pela falta de educação familiar e pela busca de dinheiro fácil.
Também nos preocupa a violência rural que tem como pano de fundo a questão da propriedade
sobre a terra e é gerada pela ambição daqueles que para consegui-la, mandam matar.
Entre os bispos aqui presentes, três deles já foram ameaçados de morte. Queremos
para o nosso povo, que é pobre, um modelo de desenvolvimento sustentável que traga
progresso para todos e favoreça a promoção humana. Mas, infelizmente, não é esse o
modelo de desenvolvimento que o Governo e as grandes empresas pensaram para a nossa
região. Em diversas ocasiões temos nos manifestado contra os grandes projetos na Amazônia
que não escutam nem levam em conta a opinião do povo. Antes de finalizar, em nome
de todos os bispos da Amazônia desejo agradecer a importante ajuda que, nos dois últimos
anos, concedeu às dioceses e prelazias para a manutenção dos seus seminários. Muito
obrigado por este gesto fraterno que nunca esqueceremos. Beatíssimo Padre, que
Nossa Senhora de Nazaré, padroeira da Amazônia o cubra com a sua maternal proteção. Pedimos
que Vossa Santidade conceda a nós, ao nosso clero, aos consagrados e às consagradas,
aos seminaristas, às famílias e a todos os fiéis leigos de nossas Igrejas Particulares
sua paterna Bênção Apostólica.
Roma, 15 de abri de 2010
Dom Jesus Maria
Cizaurre, OAR, Bispo Prelado de Cametá Presidente do Regional Norte 2 da CNBB