Brasília, 09 abr (RV) - “O Brasil precisa de energia de qualidade, mas a usina
de Belo Monte não trará energia limpa e barata. Que energia limpa é essa que afetará
milhares de famílias, trará doenças, apodrecerá um lago e acabará com o meio de subsistência
de tantas pessoas?”.
A questão foi levantada ontem pelo presidente do Conselho
Indigenista Missionário (CIMI) e bispo prelado do Xingu (PA), Dom Erwin Kräutler,
durante um debate transmitido ao vivo pela Rede Vida de Televisão, de Brasília. O
encontro foi organizado pela Comissão Brasileira Justiça e Paz (CBJP), pelo CIMI e
pela Comissão para Amazônia, com apoio da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
(CNBB), com o objetivo de envolver a população no debate sobre a obra pública.
Além
de Dom Erwin, compuseram a mesa o pesquisador de Eletrotécnica e Energia da Universidade
de São Paulo (USP), Francisco Hernandez; o diretor de Licenciamento do Ibama, Pedro
Alberto Bignelli; e o presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício
Tolmasquim.
Na avaliação do bispo do Xingu, a energia que será gerada pela
usina de Belo Monte não será tão barata como o governo propaga, e as consequências
negativas para a região e a população local não justificam a obra. “Falar só das coisas
boas é meia verdade, e meia verdade é mentira” - disse.
A respeito dos reais
impactos da obra na sociedade, Dom Erwin afirmou que ela afetará pelo menos 30 povos
indígenas. “Haverá ainda perda de biodiversidade e deslocamento compulsório da população
rural e urbana”.
“Essa obra vai ser a maior agressão já vista na Amazônia”
- declarou. “O projeto foi imposto de cima para baixo; foi feito aqui em Brasília
e o povo não foi consultado. É uma falácia dizer que o povo não será atingido. O governo
só fala das vantagens e nunca das desvantagens que Belo Monte trará. Cerca de 30 mil
pessoas serão chutadas de lá e levadas sei lá pra onde”.
Por parte do governo,
o presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim, defendeu
que o projeto da Usina de Belo Monte tem impacto ambiental 10 vezes menor do que a
média brasileira: “Para cada MegaWatt de energia gerado no país, alaga-se mediamente
meio km2. No caso de Belo Monte, o alagamento corresponderia a 0,05 km2: uma relação
excepcionalmente baixa” - avaliou.
O representante do governo ressaltou ainda
que o custo da produção de energia a partir de Belo Monte vai ser praticamente a metade
do verificado em outras formas de geração. Ele sublinhou também que a energia produzida
a partir de hidrelétricas pode receber complementos de energia eólica e da gerada
a partir do bagaço de cana-de-açúcar.
Tolmasquim garantiu que a construtora
vencedora do leilão terá que investir R$ 3 bilhões em atividades para a preservação
do meio ambiente e para as condições sociais da população local: “O imposto a ser
arrecadado pela usina será 19 vezes maior do que todos os recursos gerados pelo Estado”.
Já para o pesquisador da Universidade de São Paulo, Francisco Hernandez, o
tema é polêmico porque se trata da 3ª maior usina hidrelétrica do mundo, ficando atrás
apenas de Três Gargantas, na China; e Itaipu.
Mas em sua avaliação, Belo Monte
é um projeto inviável e deve ser abandonado: “Reconheço a importância da geração de
energia, mas sou contra a usina porque sei dos impactos desastrosos que ela trará”
– afirmou, citando que “o Rio Xingu seria desviado de 100 a 120 quilômetros do leito
original, causando grandes prejuízos para a população local”.
Enquanto isso,
as 15 etnias indígenas que vivem às margens do rio, no Parque Nacional do Xingu, continuam
mobilizadas para uma manifestação contra a construção da hidrelétrica. Antes do dia
20, estão previstos atos na reserva Capoto-Jarina, em Mato Grosso, São Paulo, Brasília,
e na Vila Ressaca, próximo a Altamira. (CM)