Rio de Janeiro, 03 abr (RV) - Neste final de semana estaremos chegando ao grande
momento do ano litúrgico e ao centro de nossa fé: a Páscoa, celebrada durante o tríduo
e que se perpetua na vida e na caminhada da Igreja que a atualiza a cada Eucaristia.
A Igreja que nos convidou durante quarenta dias a um tempo de conversão e penitência,
agora nos devolve os vários sinais renovados que nos fazem experimentar que também
a nossa vida se renova e dá um passo a mais na caminhada para que de páscoa em páscoa
cheguemos à Páscoa definitiva.
Na celebração do Tríduo Pascal, a Igreja revive
os momentos mais significativos da vida de seu divino fundador, Jesus Cristo. O mistério
da paixão, morte e ressurreição de Cristo condensa a grande mensagem de Deus à humanidade
inteira. Esse mistério, na verdade, deu novo significado às coisas humanas. O sofrimento
e a morte, dos quais ninguém fica livre neste mundo, recebem uma potentíssima luz,
que é jorrada do mistério que celebramos no Tríduo Pascal. O sofrimento e a morte,
quando associados ao mistério do Filho de Deus, adquirem novo significado. Deixam
definitivamente de ser interpretados como sinal de maldição. O Filho de Deus os assumiu.
Aliás, Jesus assumiu tudo o que é próprio da condição humana com exceção do pecado,
e, atravessando o vale sombrio, que também integra a nossa condição, chegou às verdes
campinas, aos prados eternos e às fontes borbulhantes. Associados a Cristo pelo batismo,
nossa grande meta são as pastagens eternas, para as quais nos guia o Bom Pastor. A
dor, o sofrimento e a morte já foram vencidos em Cristo. Ora, na medida em que Cristo
passa a viver em nós, também nos tornamos capazes de vencê-los. A última palavra de
Deus a respeito do seu Cristo foi a vida. E a sorte de Cristo é a sorte de todos os
que se lhe associam pela fé em sua Palavra, pelos sacramentos que comunicam a graça,
e pela caridade que nos une a Deus e aos irmãos.
A Quaresma se conclui na Quinta-feira
Santa de manhã, na celebração dos Santos Óleos, e na renovação das promessas sacerdotais,
eco das antigas celebrações de reconciliação dos cristãos que, durante a Quaresma
tinham feito a penitência devida, e agora retomavam a inserção na Igreja. Os óleos
bentos e consagrado serão distribuídos entre as Paróquias como sinal de unidade e
comunhão. À tarde começamos a grande celebração da Páscoa, com os seus três momentos.
Na
Quinta-feira Santa celebramos a instituição da Eucaristia, do sacerdócio ministerial
e o mandamento do amor. A celebração da Eucaristia, instituída por Jesus na última
ceia, perpetua o sacrifício salvífico do Senhor, garante a sua presença constante
à Igreja, é o alimento da vida eterna e evidencia o amor com o qual o Senhor Jesus
amou os homens até o fim. O sacramento da Eucaristia é pura graça que, ao atingir
os homens, faz-se capaz de transformá-los na medida da abertura e da boa disposição
de quem o recebe. A Igreja ensina que todas as vezes que celebramos este grande sacramento,
torna-se presente a obra da Redenção. Só o amor pode abraçar a Cruz e transformá-la
em instrumento de salvação. Só o amor de Jesus foi capaz de instituir a Eucaristia
para perpetuar a sua entrega ao Pai e aos homens e dar à Igreja a possibilidade de
participar de seu gesto de caridade. A Cerimônia do Lava-pés, realizada na Missa da
Ceia do Senhor, retrata o episódio narrado por São João, episódio motivado pelo mesmo
amor que levou Jesus ao calvário. Ninguém, a não ser Jesus, poderia ordenar com mais
autoridade: “Amai-vos como eu vos amei”.
A Sexta-feira Santa celebra o grande
dia da entrega, que havia sido sacramentalmente antecipada na celebração da Eucaristia
no contexto da última ceia. Santo Tomás de Aquino recorda-nos que na figura do Crucificado
não falta nenhuma virtude cristã. Em Jesus, despojado de toda honra, glória e prazer
mundanos, encontramos o exemplo da humildade, do amor a Deus e aos homens, da abnegação,
do perdão, da paciência, do amor à verdade, do abandono irrestrito aos desígnios de
Deus etc. Neste dia é muito frutuoso, além de participar da ação litúrgica, meditar
sobre a paixão e morte de Cristo e sobre as virtudes que O levaram a suportar as ignomínias.
Tivessem os homens a peito as virtudes de Jesus, a face do mundo estaria transformada.
É um dia de contemplação do grande mistério da cruz que se renova a cada Eucaristia
e que as tradições também adornaram com várias outras celebrações devotas e apresentações.
No
Sábado Santo, na noite do sábado para o domingo, o Povo de Deus celebra a Vigília
Pascal e rompe os aleluias festivos da ressurreição com Missa solene. É o grande momento
de anunciarmos que a Vida venceu a morte e que a Luz vence as trevas. É também o momento
de todo o povo de Deus renovar as promessas batismais: viver o batismo hoje, eis a
grande conclusão da Páscoa!
O Senhor ressurgiu no Domingo, quando o sol ainda
não se tinha levantado. A proclamação da Páscoa é cantada e a Igreja inteira se regozija
com o seu Senhor, que, vencedor do pecado e da morte, tem a vida para sempre e o poder
de comunicá-la a quem nele confia. O vale tenebroso não pôde segurar o Senhor da Luz;
as trevas da morte não agarraram o Autor da Vida; o sofrimento não desfigurou para
sempre nem diminuiu a Beleza tão antiga e sempre nova. A alegria cristã repousa em
seu fundamento inabalável, isto é, na ressurreição do Senhor Jesus Cristo.
O
sentido da vida humana esclarece-se à luz do mistério da Páscoa de Jesus – paixão,
morte e ressurreição. Associados ao Filho de Deus, nossas maiores mazelas podem ser
transformadas, e aquele que tinha a sua vida por perdida, poderá recuperá-la renovada.
Jesus, entre outras coisas, ensinou-nos que a entrega sem reservas aos desígnios de
Deus é fonte de salvação e de vida verdadeira. E isso Ele nos ensinou principalmente
com a própria vida.
Com isso iniciamos oito dias de festa, chamados Oitava
da Páscoa, e o Tempo Pascal, que se estende até o domingo de Pentecostes. Enfim, nós
iniciamos o oitavo dia, o dia se fim!
A todos os nossos queridos amigos, diocesanos,
e a você que nos lê neste momento, que as alegrias pascais estejam sempre em seus
corações e suas vidas! Neste tempo de tantas palavras, tantos pecados, tantas acusações
a Igreja proclama que a Vida continua sendo a última Palavra e o grande anúncio: Cristo
Ressuscitou verdadeiramente, Aleluia! Feliz Páscoa a todos!
+ Orani João Tempesta, O. Cist. Arcebispo de São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ