Cidade do Vaticano, 27 mar (RV) - Neste final de semana estaremos chegando
ao grande momento do ano litúrgico e ao centro de nossa fé: a Páscoa, celebrada durante
o tríduo e que se perpetua na vida e na caminhada da Igreja que a atualiza a cada
Eucaristia. A Igreja que nos convidou durante quarenta dias a um tempo de conversão
e penitência, agora nos devolve os vários sinais renovados que nos fazem experimentar
que também a nossa vida se renova e dá um passo a mais na caminhada para que de páscoa
em páscoa cheguemos à Páscoa definitiva.
Na celebração do Tríduo Pascal, a
Igreja revive os momentos mais significativos da vida de seu divino fundador, Jesus
Cristo. O mistério da paixão, morte e ressurreição de Cristo condensa a grande mensagem
de Deus à humanidade inteira. Esse mistério, na verdade, deu novo significado às coisas
humanas. O sofrimento e a morte, dos quais ninguém fica livre neste mundo, recebem
uma potentíssima luz, que é jorrada do mistério que celebramos no Tríduo Pascal. O
sofrimento e a morte, quando associados ao mistério do Filho de Deus, adquirem novo
significado. Deixam definitivamente de ser interpretados como sinal de maldição. O
Filho de Deus os assumiu. Aliás, Jesus assumiu tudo o que é próprio da condição humana
com exceção do pecado, e, atravessando o vale sombrio, que também integra a nossa
condição, chegou às verdes campinas, aos prados eternos e às fontes borbulhantes.
Associados a Cristo pelo batismo, nossa grande meta são as pastagens eternas, para
as quais nos guia o Bom Pastor. A dor, o sofrimento e a morte já foram vencidos em
Cristo. Ora, na medida em que Cristo passa a viver em nós, também nos tornamos capazes
de vencê-los. A última palavra de Deus a respeito do seu Cristo foi a vida. E a sorte
de Cristo é a sorte de todos os que se lhe associam pela fé em sua Palavra, pelos
sacramentos que comunicam a graça, e pela caridade que nos une a Deus e aos irmãos.
A
Quaresma se conclui na Quinta-feira Santa de manhã, na celebração dos Santos Óleos,
e na renovação das promessas sacerdotais, eco das antigas celebrações de reconciliação
dos cristãos que, durante a Quaresma tinham feito a penitência devida, e agora retomavam
a inserção na Igreja. Os óleos bentos e consagrado serão distribuídos entre as Paróquias
como sinal de unidade e comunhão. À tarde começamos a grande celebração da Páscoa,
com os seus três momentos.
Na Quinta-feira Santa celebramos a instituição da
Eucaristia, do sacerdócio ministerial e o mandamento do amor. A celebração da Eucaristia,
instituída por Jesus na última ceia, perpetua o sacrifício salvífico do Senhor, garante
a sua presença constante à Igreja, é o alimento da vida eterna e evidencia o amor
com o qual o Senhor Jesus amou os homens até o fim. O sacramento da Eucaristia é pura
graça que, ao atingir os homens, faz-se capaz de transformá-los na medida da abertura
e da boa disposição de quem o recebe. A Igreja ensina que todas as vezes que celebramos
este grande sacramento, torna-se presente a obra da Redenção. Só o amor pode abraçar
a Cruz e transformá-la em instrumento de salvação. Só o amor de Jesus foi capaz de
instituir a Eucaristia para perpetuar a sua entrega ao Pai e aos homens e dar à Igreja
a possibilidade de participar de seu gesto de caridade. A Cerimônia do Lava-pés, realizada
na Missa da Ceia do Senhor, retrata o episódio narrado por São João, episódio motivado
pelo mesmo amor que levou Jesus ao calvário. Ninguém, a não ser Jesus, poderia ordenar
com mais autoridade: “Amai-vos como eu vos amei”.
A Sexta-feira Santa celebra
o grande dia da entrega, que havia sido sacramentalmente antecipada na celebração
da Eucaristia no contexto da última ceia. Santo Tomás de Aquino recorda-nos que na
figura do Crucificado não falta nenhuma virtude cristã. Em Jesus, despojado de toda
honra, glória e prazer mundanos, encontramos o exemplo da humildade, do amor a Deus
e aos homens, da abnegação, do perdão, da paciência, do amor à verdade, do abandono
irrestrito aos desígnios de Deus etc. Neste dia é muito frutuoso, além de participar
da ação litúrgica, meditar sobre a paixão e morte de Cristo e sobre as virtudes que
O levaram a suportar as ignomínias. Tivessem os homens a peito as virtudes de Jesus,
a face do mundo estaria transformada. É um dia de contemplação do grande mistério
da cruz que se renova a cada Eucaristia e que as tradições também adornaram com várias
outras celebrações devotas e apresentações.
No Sábado Santo, na noite do sábado
para o domingo, o Povo de Deus celebra a Vigília Pascal e rompe os aleluias festivos
da ressurreição com Missa solene. É o grande momento de anunciarmos que a Vida venceu
a morte e que a Luz vence as trevas. É também o momento de todo o povo de Deus renovar
as promessas batismais: viver o batismo hoje, eis a grande conclusão da Páscoa!
O
Senhor ressurgiu no Domingo, quando o sol ainda não se tinha levantado. A proclamação
da Páscoa é cantada e a Igreja inteira se regozija com o seu Senhor, que, vencedor
do pecado e da morte, tem a vida para sempre e o poder de comunicá-la a quem nele
confia. O vale tenebroso não pôde segurar o Senhor da Luz; as trevas da morte não
agarraram o Autor da Vida; o sofrimento não desfigurou para sempre nem diminuiu a
Beleza tão antiga e sempre nova. A alegria cristã repousa em seu fundamento inabalável,
isto é, na ressurreição do Senhor Jesus Cristo.
O sentido da vida humana esclarece-se
à luz do mistério da Páscoa de Jesus – paixão, morte e ressurreição. Associados ao
Filho de Deus, nossas maiores mazelas podem ser transformadas, e aquele que tinha
a sua vida por perdida, poderá recuperá-la renovada. Jesus, entre outras coisas, ensinou-nos
que a entrega sem reservas aos desígnios de Deus é fonte de salvação e de vida verdadeira.
E isso Ele nos ensinou principalmente com a própria vida.
Com isso iniciamos
oito dias de festa, chamados Oitava da Páscoa, e o Tempo Pascal, que se estende até
o domingo de Pentecostes. Enfim, nós iniciamos o oitavo dia, o dia se fim!
A
todos os nossos queridos amigos, diocesanos, e a você que nos lê neste momento, que
as alegrias pascais estejam sempre em seus corações e suas vidas! Neste tempo de tantas
palavras, tantos pecados, tantas acusações a Igreja proclama que a Vida continua sendo
a última Palavra e o grande anúncio: Cristo Ressuscitou verdadeiramente, Aleluia!
Feliz Páscoa a todos!
+ Orani João Tempesta, O. Cist.
Arcebispo de São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ