Belo Horizonte, 06 mar (RV) - A liberdade de expressão, enquanto valor fundamental
da cidadania e coluna de sustentação da democracia, está frontalmente golpeada na
formulação do 3° Plano Nacional de Direitos Humanos, do Governo Federal. Esse golpe
atinge também a vida, vale lembrar, para merecer atenção especial e reação da sociedade,
quanto à descriminalização e legalização do aborto. Não se pode cansar de dizer, para
iluminar a consciência moral na sociedade, que o aborto é um abominável delito e se
constitui numa desordem moral, particularmente grave. É uma gravidade que remete ao
confronto com exigências éticas fundamentais, aquelas que, em última instância, têm
a força de iluminar, regular e substituir as opções legislativas e políticas que são,
incontestavelmente, contrárias a princípios e valores inegociáveis.
É preciso
avaliar e acompanhar as propostas legislativas e cada programa político, esperando
sempre dos políticos um posicionamento claro - especialmente daqueles que regem suas
vidas pela consciência cristã - para diminuir e evitar os efeitos negativos e danosos
no plano da cultura e da moralidade pública. É lamentável que entendimentos errôneos
da laicidade estejam comprometendo o respeito a verdades resultantes do conhecimento
e do direito natural. Esse equívoco tem sido justificado em razão da compreensão também
inadequada quanto à busca sincera dessas verdades, dever de todos, enquanto contemporaneamente
são ensinadas por uma religião específica. É um tremendo e nefasto engano abrir mão
de verdades morais concernentes à sociedade, como o direito à vida, à liberdade, a
justiça e outros direitos humanos, por esta confluência existente entre pregação religiosa
e dever governamental e político de defesa e promoção integral da pessoa e do bem
comum.
Ora, quem rege sua consciência pelos valores cristãos tem o dever de
avaliar apuradamente a escolha de instrumentos políticos, como a adesão a um partido
e outras expressões de participação política, no compromisso de escolher o caminho
que mais possa assegurar coerência na vivência de sua fé. Neste sentido, o Compêndio
da Doutrina Social da Igreja n. 573, citando o Papa Paulo VI na sua Carta Apostólica
Octogésima adveniens n. 46, afirma que “as instâncias da fé cristã dificilmente podem
ser encontradas numa única posição política: pretender que um partido ou uma corrente
política correspondam completamente às exigências da fé e da vida cristã gera equívocos
perigosos. O cristão não pode encontrar um partido que corresponda plenamente às exigências
éticas que nascem da fé e da pertença à Igreja: a sua adesão a uma corrente política
não será jamais ideológica, mas sempre crítica, a fim de que o partido e o seu projeto
político sejam estimulados a realizar formas sempre mais atentas a obter o verdadeiro
bem comum, inclusive os fins espirituais do homem”.
A escolha do partido, da
corrente política e das pessoas a quem confiar a vida pública não se faz apenas individualmente
e deixando de lado princípios éticos e morais e os valores da fé. Essa indispensável
iluminação é garantia também de um exercício arejado das responsabilidades e competências
governamentais. Assim também serão evitadas as posturas, ideologicamente justificadas,
que levam a exageros e polarizações comprometedoras e propensas a totalitarismos de
toda ordem. Nesse caminho se localiza o risco de uma regulagem da liberdade de expressão,
cerceando a mídia no seu papel educativo e crítico insubstituível no contexto da sociedade.
O exercício profissional na mídia e as outras atividades cidadãs são igualmente desafiados
a pautar-se nos valores fundamentais da vida social.
A imprensa deve ser sempre
crítica, nunca caluniadora, e os cidadãos todos, sem exceção, especialmente os que
exercem autoridade política por delegação popular, devem construir seus exercícios
e desempenhar seus papéis com a lisura de quem respeita e promove o bem comum. Não
devem existir razões para temores e precauções com controles e cerceamentos indevidos.
Os meios de comunicação balizados nesses princípios que determinam o bem moral e a
estruturação ordenada e a condução da vida social, precisam ter ampla liberdade, sem
mordaças ideológicas, sem submissão a mecanismos políticos interesseiros, sem a camisa
de força das barganhas financeiras que possam comprometer seu serviço educativo e
crítico. A verdade, a justiça, o amor e a liberdade de expressão favorecem o autêntico
desenvolvimento.
Há um legítimo respeito à liberdade de expressão, capítulo
fundamental da cidadania, que estrutura a autonomia da mídia no seu serviço indispensável,
remetendo a responsabilidades graves quanto ao que se diz ou não. Os servidores da
área e os cidadãos todos, na sua competência de construir uma sociedade justa e solidária,
são instados à conduta de portadores de uma lisura moral inquestionável. Esta é a
verdadeira força que fecunda a esperança, a que vence o medo: o medo da liberdade
de expressão.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo Arcebispo Metropolitano de
Belo Horizonte