2010-01-18 11:52:05

Na Sinagoga de Roma, Bento XVI assegura como irreversíveis o respeito e amizade entre Católicos e Judeus e aponta formas de acção comum


(18/1/2010) “Fortalecer os elos que nos unem e continuar a percorrer o caminho da reconciliação e da fraternidade” foi – segundo as palavras do Papa no seu discurso – o objectivo desta sua visita à Sinagoga de Roma. Evocando a histórica visita de João Paulo II, há vinte e quatro anos, Bento XVI declarou desejar manifestar assim a sua “estima e afecto” à comunidade dos Judeus de Roma assim como às comunidades hebraicas dispersas pelo mundo, confirmando e reforçando o caminho traçado pelo seu predecessor com este “momento de encontro e de amizade”.
O Santo Padre quis antes de mais assegurar que a actual posição da Igreja Católica em relação ao povo judeu, na sequência do Vaticano II, é irreversível:

“A doutrina do Concílio Vaticano II representou para os Católicos um ponto firme ao qual referir-se constantemente na atitude e nas relações com o povo hebraico, assinalando uma nova e significativa etapa. O acontecimento conciliar deu um impulso decisivo, caminho irrevogável de diálogo, de fraternidade e de amizade, que se aprofundou e desenvolveu nestes quarenta anos com passos e gestos importantes e significativos…”

Declarando que também ele próprio tem querido, nestes anos de pontificado, mostrar a sua proximidade e o seu afecto para com o povo da Aliança, Bento XVI recordou a sua viagem à Terra Santa, em Maio do ano passado, assim como os muitos encontros tidos com Comunidades e Organizações Hebraicas e as sua visitas às sinagogas de Colónia e de Nova Iorque.

“A Igreja não deixou de deplorar as faltas dos seus filhos e filhas, pedindo perdão por tudo o que pôde favorecer de algum modo as chagas do anti-semitismo e do anti-judaísmo. Possam estas chagas sanar para sempre!”

Bento XVI evocou o século XX como “uma época verdadeiramente trágica para a humanidade”, com guerras que semearam destruição, morte e sofrimento. Um tempo em que (afirmou) “ideologias terríveis que tinham na raiz a idolatria do homem, da raça e do Estado, levaram uma vez mais o irmão a matar o seu irmão”.

“O singular e dilacerante drama da Shoa representa, de algum modo, o vértice de um caminho de ódio que nasce quando o homem esquece o seu Criador e se coloca a si mesmo no centro do universo”.

Como já declarara a quando da sua visita a Auschwitz, em 2006, Bento XVI, reconhecendo que “os potentados do Terceiro Reich queriam esmagar o povo judeu na sua totalidade”, observou que, em última análise, “com o aniquilamento deste povo, pretendiam matar aquele Deus que chamou Abraão”. Neste contexto, o Papa recordou expressamente os Judeus romanos arrancados às suas casas, diante destas paredes, para serem conduzidos e mortos em Auschwitz.

“Como é possível esquecer os seus rostos, os seus nomes, as lágrimas, o desespero de homens, mulheres, crianças? Naquele dia, tragicamente chegou também a Roma o extermínio do povo da Aliança de Moisés, antes anunciado e depois sistematicamente programado e realizado na Europa sob o domínio nazista.
Infelizmente, muitos ficaram indiferentes, mas muitos, mesmo entre os católicos italianos, animados pela fé e pelo ensinamento cristão, reagiram com coragem, abrindo os braços para socorrer os Judeus bloqueados e fugitivos, muitas vezes com o risco da própria vida, merecendo perene gratidão”.

Numa leve alusão ao Papa Pio XII, o actual pontífice recordou que “também a Sé Apostólica desenvolveu uma acção de socorro, muitas vezes escondida e discreta”, acrescentando:

“A memória destes acontecimentos deve levar-nos a reforçar os elos que nos unem para que cresçam cada vez mais a compreensão, o respeito e o acolhimento.
A nossa proximidade e fraternidade espirituais encontram na Bíblia Sagrada… o fundamento mais sólido e perene, segundo o qual somos constantemente colocados perante as nossas raízes comuns, a história e o rico património espiritual que partilhamos”.

De entre as “numerosas implicações que derivam da herança comum da Lei e dos Profetas”, Bento XVI quis recordar algumas:

“antes de mais, a solidariedade que liga a Igreja e o povo hebraico ao nível da sua própria identidade espiritual e que oferece aos cristãos a oportunidade de promover um renovado respeito pela interpretação hebraica do Antigo Testamento; a centralidade do Decálogo como comum mensagem ética de valor perene para Israel, a Igreja, os não crentes e toda a humanidade; o empenho para preparar ou realizar o Reino do Altíssimo no cuidado do criado confiado por Deus ao homem para que o cultive e o proteja responsavelmente”.

Contra a tentação de construir para si outros ídolos, vitelos de ouro, as “Dez Palavras” (do Decálogo) – sublinhou o Papa – pedem que se reconheça o único Senhor:
“Despertar na nossa sociedade a abertura à dimensão transcendente, testemunhar o Deus único, é um precioso serviço que Judeus e Cristãos podem oferecer constantemente”.

Bento XVI recordou ainda que os Dez Mandamentos, “as Dez Palavras pedem o respeito, a protecção da vida, contra todas as injustiças e abusos, reconhecendo o valor de cada pessoa humana, criada à imagem e semelhança de Deus”

“Quantas vezes, em todas as partes da terra, perto e longe, se espezinham a dignidade, a liberdade, os direitos do ser humano. Testemunhar conjuntamente o valor supremo da vida contra todo o egoísmo, é oferecer um importante contributo a favor de um mundo em que reine a justiça e a paz, o shalom desejado e proposto pelos legisladores, profetas e sapientes de Israel”.

Bento XVI recordou ainda que os Dez Mandamentos chamam a conservar e promover a santidade da família. “Testemunhar que a família continua a ser a célula fundamental da sociedade e o contexto de base em que se aprendem e exercem as virtudes humanas é um precioso serviço a oferecer para a construção de um mundo de rosto mais humano”.
Finalmente, o preceito fundamental do amor ao próximo:

“Como ensina Moisés na Shemà – e Jesus reafirma no Evangelho – todos os mandamentos se resumem no amor de Deus e na misericórdia para com o próximo. Tal Regra empenha Judeus e Cristãos a exercerem, no nosso tempo, uma generosidade especial para com os pobres, as mulheres, as crianças, os estrangeiros, os doentes, os débeis, os necessitados… Com o exercício da justiça e da misericórdia, Hebreus e Cristão são chamados a anunciar e a dar testemunho ao Reino do Altíssimo que vem, e pelo qual rezamos e actuamos cada dia na esperança”.

“Nesta direcção, podemos dar passos conjuntamente, conscientes embora das diferenças que existem entre nós – observou o Papa, que concluiu com um premente convite ao diálogo, respeito e testemunho comum:

“Cristãos e hebreus têm uma grande parte de património espiritual em comum, rezam ao mesmo Senhor, têm as mesmas raízes, mas permanecem muitas vezes desconhecidos um ao outro. Toca a nós, em resposta à chamada de Deus, actuar para que permaneça sempre aberto o espaço do diálogo, do respeito recíproco, do crescimento na amizade, no testemunho comum perante os desafios do nosso tempo, que nos convidam a colaborar a bem da humanidade neste mundo criado por Deus, o Omnipotente e Misericordioso”.

As últimas palavras da sua vibrante alocução às mais de mil pessoas concentrada no “Templo Maior” – a grande Sinagoga de Roma – foram pronunciadas pelo Papa em língua hebraica: um versículo do Salmo 117, convidando todos os povos a cantarem o louvor do Senhor, porque é grande o seu amor por nós e a sua fidelidade permanece para sempre,









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