Críticas de Saramago mostram que não compreende a Bíblia : para o secretário da CEP
a polémica despoletada pelo Nobel português pode ser oportunidade para valorizar
a cultura bíblica
(19/10/2009) A polémica despoletada pelas declarações de José Saramago a respeito
da Bíblia, que classificou como “um manual de maus costumes, um catálogo de crueldade”
deve levar a Igreja Católica a valorizar a cultura Bíblica e combater a ignorância
a respeito desse texto fundamental. Em declarações à Agência ECCLESIA, D. Manuel
Clemente, Bispo do Porto e presidente da Comissão Episcopal responsável pela área
da cultura, indica que "uma personalidade como José Saramago, que tem mérito literário
inegável, deveria ser mais rigoroso quanto fala da Bíblia, porque não se pode dizer
dos factos e dos autores bíblicos o que Saramago diz”. O Bispo do Porto afirma
que “bastaria ler a introdução a qualquer livro da Bíblia, nomeadamente o Génesis,
para saber que são leituras religiosas acerca do história de Israel”, depois recolhidas
como” história bíblica para todos os cristãos e todos os crentes”. D. Manuel Clemente
diz que Saramago utilizou um discurso de “tipo ideológico, não histórico nem científico”
e revela uma “ingenuidade confrangedora” quando faz incursões bíblicas. Já o Pe.
Manuel Morujão, secretário da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), lamenta a “superficialidade”
com que Saramago se debruçou sobre a Bíblia, considerando que “entrar num género de
ofensa não fica bem a ninguém”, sobretudo a quem tem um estatuto de prémio Nobel da
Literatura. “Uma crítica não deve ser uma ofensa, deve ser feita com respeito e
humildade. Há aqui um claro exagero, que não gostávamos de ver nele (José Saramago,
ndr)”, acrescenta, antes de considerar que as afirmações do Nobel da Literatura “ferem
os sentimentos” de mais de 2 mil milhões de crentes. Para o biblista português
Fernando Ventura, Capuchinho, José Saramago tem a exigência intelectual de se informar
antes de escrever. “A Bíblia pode ser lida por alguém que não tem fé, mas supõe
alguma honestidade intelectual de quem o lê”, afirmou, acusando Saramago de “uma falta
gigantesca” dessa honestidade. Mais grave, acrescenta o Pe. Ventura, é o desconhecimento
“do que são géneros literários” ou do lugar do “mito” na literatura, o que considera
especialmente negativo num escritor, que se debruçou “sobre um âmbito que não domina”. “Não
saber situar o texto no contexto é imperdoável para um escritor”, atira. O biblista
espera que esta polémica sirva como “provocação” para que os católicos se questionem
sobre a melhor maneira de responder a um “golpe publicitário” que atinge um meio marcado
por uma “atroz ignorância bíblica”. Apesar de admitir a ignorância de muitos católicos
em relação à Bíblia, o Pe. Manuel Morujão diz que um escritor da craveira de José
Saramago tem mais responsabilidades do que o cidadão comum. Para o secretário da CEP,
o “estatuto Nobel” não lhe dá o direito de entrar em campos que “não conhece suficientemente”. “A
Bíblia, que tem 76 livros, tem de ser interpretada na diversidade dos géneros literários”,
aponta. Este responsável diz mesmo que esperava “mais” do prémio Nobel, “independentemente
da sua ideologia”, e recomenda “humildade” nas opiniões, para que estas não se apresentem
como “pseudodogmas”. O Pe. Manuel Morujão conclui desejando que se promova “muito
mais a cultura bíblica” e o conhecimento de um texto em que “Jesus até manda amar
os inimigos”. ( Em Ecclesia)