A vocação da Universidade é a formação científica e cultural das pessoas para o desenvolvimento
de toda a comunidade: Bento XVI recebendo alunos e professores da Universidade de
Parma
Para além da formação académica e da investigação científica, uma Universidade está
chamada a “oferecer aos jovens a possibilidade de maturação intelectual, moral e cívica,
confrontando-se com as grandes interrogações que interpelam a consciência do homem
contemporâneo”. – Recordou-o Bento XVI recebendo nesta segunda de manhã, no Vaticano,
um numeroso grupo de estudantes e professores da Universidade italiana de Parma. Num
período em que tanto se fala de reforma universitária e de autonomia das Universidades,
o Santo Padre deteve-se a reflectir sobre as condições de uma autêntica reforma e
sobre a verdadeira liberdade de uma instituição universitária.
A Universidade
de Parma conta actualmente trinta mil estudantes e 1.100 docentes. O programa de estudos
abrange três âmbitos: Saúde (três Faculdades), Estudos Humanísticos (cinco Faculdades)
e Sector Técnico-científico (quatro Faculdades). Em 1991 o então cardeal Joseph Ratzinger
ali pronunciou uma conferência sobre “Os caminhos da fé no meio das mutações
do tempo presente”. Recordando agora aquele seu anterior contacto pessoal com
esta Universidade, o Papa propôs-se reflectir desta vez sobre a “lição” deixada por
São Pedro Damião, que estudou em Parma em 1025, ali ficando depois, durante alguns
anos, como professor. Bento XVI sublinhou a actualidade que mantém ainda hoje aquela
que é, a seu ver, “a característica central da personalidade” de São Pedro Damião:
a “síntese entre vida eremítica e actividade eclesial, a harmónica tensão entre os
dois pólos fundamentais da existência humana – a solidão e a comunhão”. Uma “herança
espiritual” a que os jovens universitários de hoje não hão-de ficar indiferentes:
“As
novas gerações estão hoje fortemente expostas a um duplo risco, devido sobretudo à
difusão das novas tecnologias informáticas: por um lado, o perigo de ver reduzir-se
cada vez mais a capacidade de concentração e de aplicação mental no plano pessoal;
por outro lado, o risco de se isolarem individualmente numa realidade cada vez mais
virtual”.
“Desintegra-se assim em mil fragmentos a dimensão social, ao mesmo
tempo que a dimensão pessoal se dobre cada vez mais sobre si mesma, tendendo a fechar-se
a relações construtivas com o outro, com o diferente de si”.
“A Universidade,
por sua natureza, vive precisamente do correcto equilíbrio entre o momento individual
e o comunitário, entre a investigação e reflexão de cada um e a partilha e confronto
abertos aos outros, num horizonte tendencialmente universal”.
Também na nossa
época, como nos tempos de Pedro Damião, época “marcada por particularismo e incertezas
e pela carência de princípios unificadores” – considerou o Papa, “os estudos universitários
deveriam “oferecer aos jovens a possibilidade de maturarem do ponto de vista intelectual,
moral e cívico, confrontando-se com as grandes interrogações que interpelam a consciência
do homem contemporâneo”.
São Pedro Damião ficou conhecido como um dos grandes
“reformadores” da Igreja depois do ano 1000. Muito se fala hoje de “reforma” da Universidade.
Ora – interrogou-se o Papa – qual é o genuíno conceito de reforma. Os escritos e sobretudo
o testemunho pessoal de Pedro Damião mostram que “uma autêntica reforma deve ser antes
de mais espiritual e moral, isto é, deve partir das consciências”. Aspecto a ter bem
presente quando se pensa numa reforma universitária:
“As modificações estruturais
e técnicas são efectivamente eficazes se acompanhadas de um sério exame de consciência
da parte dos responsáveis a todos os níveis, mas mais em geral de cada docente, de
cada estudante, de todo o pessoal técnico e administrativo… Se se pretende que um
ambiente melhore em qualidade e eficiência, ocorre antes de mais que cada um comece
por se reformar a si mesmo, corrigindo aquilo que pode prejudicar o bem comum ou de
algum modo criar-lhe obstáculo”.
Uma última observação, reservou-a o Papa
à questão da liberdade. A acção de Pedro Damião visava sobretudo conseguir com que
a Igreja se tornasse mais livre. Assim também – observou Bento XVI - a validade de
uma reforma da Universidade tem forçosamente como contraponto a sua liberdade:
“liberdade
de ensinamento, liberdade de investigação, liberdade da instituição académica em relação
aos poderes económicos e políticos. O que não significa que a Universidade se isole
da sociedade, auto-referenciando-se unicamente a si própria, nem muito menos que vise
interesses privados explorando os recursos públicos”.
“É claro que não é essa
a liberdade cristã!”
“Verdadeiramente livre, segundo o Evangelho e a tradição
da Igreja, é aquela pessoa, aquela comunidade ou aquela instituição que responde plenamente
à sua natureza e ao seu fim, e a vocação da Universidade é a formação científica e
cultural das pessoas para o desenvolvimento de toda a comunidade social e civil”.