Comunicado do VIII Encontro das Presidências Episcopais das Igrejas lusófonas: bispos
preocupados com tráfico de pessoas
(29/9/2008) O VIII Encontro das Presidências Episcopais das Igrejas lusófonas realizou-se
em Macau, no Centro Diocesano de Convenções, de 24 a 28 de Setembro de 2008. Participaram
no Encontro 12 Prelados: de Angola, D. Damião Franklin, Arcebispo de Luanda e Presidente
da Conferência Episcopal de Angola e S. Tomé; do Brasil, D. Luiz Soares Vieira, Arcebispo
de Manaus e Vice-Presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e
D. João Alves dos Santos, bispo de Paranaguá e referencial da Pastoral afro-brasileira;
de Cabo Verde, D. Arlindo Gomes Furtado, bispo de Mindelo; da Guiné-Bissau, D. Pedro
Carlos Zilli, Bispo de Bafatá; de Macau, D. José Lai, bispo de Macau; de Moçambique,
D. Tomé Makhwelina, arcebispo de Nampula e Presidente da Conferência Episcopal de
Moçambique e D. Francisco Chimoio, arcebispo de Maputo e Vice-Presidente da mesma
Conferência; de Portugal, D. Jorge Ferreira da Costa Ortiga, arcebispo de Braga e
Presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) e D. Carlos Moreira Azevedo,
bispo auxiliar de Lisboa e Secretário da CEP; de S. Tomé e Príncipe, D. Manuel António
Mendes dos Santos, bispo da respectiva diocese; de Timor-Leste, D. Alberto Ricardo
da Silva, bispo de Dili. Participaram, ainda, P. José Maia, Presidente do Conselho
de Administração da Fundação Evangelização e Culturas (Portugal), o cónego Luís Xavier,
Vigário episcopal responsável pela pastoral da comunidade de língua portuguesa em
Macau e o P. Ildo Fortes, do Patriarcado de Lisboa, ao serviço da diocese de Mindelo.
D. José Lai acolheu os participantes com fraterna simpatia e oriental encanto.
Será inesquecível na memória grata de todos o modo generoso e eficaz como a diocese
de Macau preparou o Encontro. 2.O Encontro constituiu um espaço de partilha sobre
a realidade das Igrejas de cada país, na presente situação sócio-económica e política.
A informação recolhida foi abraçada em comunhão de Igrejas. Alguns pontos mais sensíveis
mereceram especial destaque. 2.1.A afluência repentina de pessoas às grandes cidades
faz aumentar a pobreza e o desrespeito pelos direitos humanos, favorece a corrupção
e a economia informal, dificulta a organização das comunidades cristãs e é terreno
fértil para novos grupos religiosos, que usam a prosperidade como teologia e seduzem
a população, ansiosa por bem-estar e com cultura religiosa débil. 2.2.As igrejas
e os seus pastores continuam a seguir com dolorosa atenção o drama demasiado frequente
do tráfico de pessoas, sobretudo crianças e mulheres, promovido por influentes grupos
internacionais. Reconhecem o trabalho realizado por várias instituições, seja na denúncia,
seja na resposta preventiva, seja, ainda, no acolhimento das vítimas. 2.3.Sente-se,
por diversos indícios, e enfrenta-se, em vários locais, um movimento tendente a reduzir
a influência da Igreja na sociedade. Existe, de facto, uma diferente concepção acerca
da vida humana, da vivência da afectividade, do papel da estabilidade familiar e da
educação para valores abertos à transcendência. Começa, no entanto, contraditoriamente,
a evidenciar-se o papel da religião e das comunidades cristãs para uma feliz convivência
social, assente na paz e na justiça, no respeito pela vida e numa educação sexual,
determinada por afectos sadios. 2.4.Os bispos presentes congratulam-se com o aumento
de vagas para estudantes africanos, abertas em universidades do Brasil, de Portugal
e outros países. Pedem que se criem condições de dignidade humana (abrigo e alimentação)
para esse momento de formação, trampolim fundamental para o desenvolvimento das comunidades
de origem, às quais importa regressar. Ficou manifesta a necessidade de viabilizar
o acompanhamento espiritual e religioso dos estudantes. 2.5.Os bispos consideram
essencial proporcionar meios para o crescimento de uma reflexão filosófica e teológica
sólida e, em diálogo com as culturas contemporâneas e locais, capaz de sustentar iniciativas
pastorais e promover a qualidade da fé cristã do povo, perante as propostas de desenvolvimento
que desprezam a visão integral do ser humano. 2.6.Os participantes auguram a auto-sustentabilidade
das próprias igrejas, através de uma gestão eficaz, de uma educação para a partilha
evangélica dos bens e de um real sentido de pertença. Essas condições permitirão privilegiar
a formação de agentes pastorais, as necessárias deslocações de longo curso, bem como
a manutenção de infra-estruturas. Foi apontado como caminho a constituição de fundos
para ultrapassar a efemeridade das ajudas, bem como a organização de comunidades locais
convertidas à lógica do dom. 2.7.Os bispos notam uma emergência do papel da sociedade
civil nas responsabilidades sociais e políticas, geradora da participação de todos
em soluções viáveis e que fraccione o monolitismo da informação presente em alguns
países. 3.A viva memória de Macau, como lugar chave da actividade missionária
do Extremo Oriente e hoje como ponte e plataforma com a China, conduziu os participantes
do Encontro à vontade de intensificar a vivência missionária como caminho essencial
e consequente dos que se comprometem a ser discípulos de Jesus Cristo. Todos foram
unânimes na urgência de acordar o espírito missionário católico nas consciências adormecidas
e distraídas dos passos largos e belos a percorrer na aventura da evangelização. Não
há precariedade de situações que justifique a ausência de acção missionária. Aliás
o ardor generoso do anúncio faz sempre crescer a igreja local. Graças à participação
do bispo coadjutor de Hong-Kong, John Tong, e do bispo de Macau, José Lai, os bispos
reunidos perceberam de modo mais agudo as dificuldades e projectos da Igreja para
a evangelização na China. A abertura à prática religiosa, ainda sujeita a rigoroso
controlo, motiva esperança para o paciente trabalho missionário. Um modo concreto
de ajudar a uma positiva evolução consistirá na oferta de livros e de ocasiões de
formação. Os notáveis esforços das várias igrejas para corresponderem à missão
evangelizadora têm implicado a proximidade dos pobres e o seu socorro nas aflições,
pois como afirmou o Santo Padre Bento XVI, em Munique, “a questão social e o Evangelho
são inseparáveis”. Pela imaginação da caridade importa prosseguir criando meios de
pastoral social e interpelando os dirigentes perante os atentados aos direitos humanos,
o tráfico de droga, o aumento da criminalidade, a corrupção sem freios e o descontentamento
profundo do povo. 4.Os participantes verificaram os mecanismos do ambivalente
processo da globalização, em curso acelerado. Esta etapa correspondente ao fim de
um ciclo ideológico, exponenciado pelo neoliberalismo, revela-se na mundialização
dos processos produtivos e respectivo mercado universal; no paradigma informacional,
criador da sociedade em rede; na preponderância da visão económica sobre a política
e a cultural, subjugando os Estados a interesses, sem ética e sem olhar de futuro.
Ao verificar como a globalização tem agravado os abismos entre pobres e ricos,
com o capital a agir sem travões sociais que corrijam as desigualdades, os Bispos
procederam a um discernimento deste processo contemporâneo. Pretendem acolher as vantagens,
em ordem a uma solidariedade global, qual rosto humano da mundialização da vida. De
facto, abrem-se enormes possibilidades para o desenvolvimento da subsidiariedade,
tais como o crescimento da responsabilidade ecológica, o reconhecimento prático dos
direitos universais ou o trabalho em rede, graças à tecnologia informática. Uma visão
ética da situação do sistema globalizador valorizará o sentido da universalidade,
como atitude a aprofundar nos cristãos. Mais disponíveis a esta visão deverão estar
os jovens, fundamentais para o horizonte futuro. O diálogo intercultural como preparação
para o entendimento religioso, sem imposições ou homogeneizações culturais, será um
caminho a desenvolver. A missão universal da Igreja e a tarefa de a todos anunciar
a salvação obriga os bispos a assumirem a hora presente, com o inconformismo aconselhado
por S. Paulo, e com a amplitude da esperança que abre caminho nas actuais condições
históricas. 5.As Presidências das diversas Conferências Episcopais registam o
bom acolhimento pela comunidade local, realidade confirmada nas recepções oferecidas
pela Direcção do Turismo, pelo Cônsul Geral de Portugal e de modo muito particular
pelo Chefe do Executivo da Região Administrativa Especial de Macau. Relevo merecem
as palavras dirigidas por Édmond Ho no que concerne à liberdade religiosa a viver,
respeitar e estimular. 6.Os bispos das igrejas de territórios lusófonos propõem-se,
concretamente: - proporcionar maior comunicação em rede, para permanente atenção
aos factos, preocupações e desafios dos vários países/territórios, pedindo à Agência
Ecclesia que desenvolva a ligação efectiva entre todos, em articulação com a Fundação
Evangelização e Culturas; - criar uma bolsa de voluntariado nos diferentes campos,
em correspondência com uma bolsa de necessidades, apresentadas pelas dioceses ou países;
- incentivar possibilidades de formação de padres e de leigos, seja através do
acolhimento a quem deseja aprofundar conhecimentos, seja pela disponibilidade de professores
para leccionarem filosofia e teologia em escolas ainda carentes de ajuda exterior;
- sensibilizar empresários católicos para investirem na área da saúde em regiões
com enormes necessidades; - reorganizar a actuação das instituições presentes
no sector da cooperação com países lusófonos: Fundação Evangelização e Culturas, Caritas
e Fundação Ajuda à Igreja que Sofre, criando uma mais efectiva, qualificada e universal
consciência, promotora do acompanhamento e ajuda a projectos em desenvolvimento nas
várias igrejas. - disponibilizar-se para, em consonância com a Comunidade de Países
de Língua Portuguesa (CPLP), oferecer o contributo de todas as igrejas lusófonas para
a viabilização de um programa de promoção e valorização da língua portuguesa, nas
áreas do ensino e da comunicação social. China, 27 de Setembro de 2008