Brasilia/Cidade do Vaticano, 28 ago (RV) - Após nove horas de julgamento, o ministro
e relator Carlos Ayres Britto votou pela manutenção da reserva indígena no modelo de demarcação
contínua - ou seja, a favor dos índios e contra os arrozeiros que defendem a forma
descontínua. As terras, na fronteira do Brasil com a Venezuela e a Guiana, são
disputadas por índios e empresários. Embora a reserva tenha sido homologada em 2005,
por decreto do presidente Luis Inácio Lula da Silva, os arrozeiros nunca saíram de
lá. A ação em exame foi impetrada pelos senadores Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR) e
Augusto Botelho (PT-RR), que pedem a anulação da demarcação contínua, alegando prejuízos
à economia de Roraima. O presidente do STF atendeu o pedido de suspensão. O julgamento ainda
não tem nova data para ser retomado. Na prática, o parecer apóia a posição dos índios,
que exigem a expulsão dos empresários que se dedicam ao cultivo de arroz e estão instalados
na região. Os rizicultores que passaram a explorar as terras partir de 1992 não têm,
de acordo com o relator Britto, qualquer direito adquirido sobre a terra. "A presença
dos arrozeiros subtrai dos índios extensa área de solo fértil e degrada os recursos
ambientais necessários à sobrevivência dos nativos da região." Centenas de índios
que assistiram à audiência e outros que aguardavam na entrada do STF lamentaram a
decisão, que, no fundo, deixa a situação tudo na mesma, mas por tempo indeterminado. A
advogada Joênia Wapixana, membro da tribo Wapixana e que vive na reserva, representou
os índios na audiência e disse que a suspensão só faz prolongar as tensões na região. Com
o rosto pintado com as cores tradicionais de sua tribo, a advogada, no entanto, disse
confiar no Supremo e que os índios não recuarão em sua reivindicação por justiça. Os
produtores de arroz, por sua vez, comemoraram a suspensão do processo. Na reserva
e na cidade de Boa Vista, capital do estado de Roraima, fontes oficiais disseram que
o dia foi de tensão, devido à possibilidade de uma decisão definitiva causar protestos
de uma ou outra parte. A Polícia Militar passou o dia inteiro a postos e em situação
de "alerta" na região, onde permanecerá pelo menos até na sexta-feira. Maior das
600 reservas indígenas que existem no Brasil, a reserva Raposa Serra do Sol ocupa
uma área de 1,7 milhão de hectares, equivalente a 13% do território nacional, é habitada
por 18.000 membros das tribos Macuxi, Taurepang, Wapixana, Ingariko e Patamona. Uma
delegação da reserva indígena visitou a redação da RV em julho passado, no âmbito
de sua campanha em defesa de suas terras. Cristiane Murray conversou com Jacyr e Pierângela.
Escute: ENTREVISTA Entretanto, na
manhã de ontem, 20 bispos, três capelães e dois representantes do Ministério da Defesa
chegaram a Roraima a bordo do avião Amazonas, da Aeronáutica. Eles foram recebidos
por soldados e oficiais da Base Aérea e pelo comandante da 1ª Brigada, general Eliézer
Monteiro. Segundo Dom Osvino José Both, arcebispo do ordinariado militar e chefe da
comissão, o objetivo da visita é conhecer a Amazônia. Os bispos provêm de vários
estados brasileiros e, segundo Dom Osvino, a visita não está relacionada com a questão
da terra indígena Raposa Serra do Sol. Ele afirmou que a visita já estava agendada
desde o ano passado. Na programação, constam palestras sobre a estrutura do Exército
Brasileiro em Roraima, contingente, número de pelotões de fronteira e de batalhões.
A delegação visitou a Fronteira de Surucucu e pernoitou em Boa Vista. Hoje, segue
para São Gabriel da Cachoeira, Maturacá e Tefé, Município do Amazonas, de onde embarcam
para Guajará-Mirim, em Rondônia. Eles passam também por Porto Velho (RO) e Manaus
(AM) e de lá finalizam a viagem em Brasília. “Nosso interesse é saber como a Igreja
trabalha nessa região, como vive o povo e como se vive na Amazônia. Vai ser um desafio,
mas é também uma alegria. É uma visita de observação e de conhecimento”, disse. (CM)