A cimeira da FAO em Roma para enfrentar a crise alimentar mundial: identidade de pontos
de vista na análise do problema, mas diversidade de respostas para a sua solução
(4/6/2008) Produzir mais: esta a solução mais simples para a actual crise alimentar,
provocada pela escalada dos preços das matérias-primas agrícolas e pelo aumento dos
custos de produção - em especial devido aos recordes dos combustíveis. A ideia foi
partilhada, esta terça feira, pelo secretário-geral das Nações Unidas, aos participantes
da reunião extraordinária da Organização para a Alimentação e Agricultura (FAO), em
Roma. Ban Ki-Moon sublinhou que a produção mundial de alimentos terá de crescer em
50% até 2030 para responder ao previsível aumento da procura. E falou de uma "oportunidade
histórica para revitalizar a agricultura".
Este encontro de Roma ganhou contornos
invulgarmente políticos devido à crise alimentar provocada pelo aumento para o valor
mais alto em 30 anos do custo dos alimentos, a preços reais. Segundo os números da
FAO, a actual crise provocou situações de fome em perto de 100 milhões de pessoas
em todo o mundo. A emergência do actual contexto levou a que muitos dos principais
responsáveis políticos fizessem questão de estar na capital italiana durante o encontro
que dura até esta quinta feira. "Os governos puseram de lado decisões muito difíceis,
nestes últimos tempos, e subestimaram a necessidade de investimentos na agricultura.
Hoje, o mundo inteiro paga um preço demasiado alto", declarou Ban Ki-Moon durante
o discurso de abertura do encontro.
"Se os países em vias de desenvolvimento
tivessem investido na agricultura o que gastaram em armas, o problema alimentar estaria
neste momento resolvido", declarou, por sua vez, Jacques Diouf, director geral da
FAO. Esta organização, integrada nas Nações Unidas, avançou ainda com algumas sugestões
para aliviar o peso da crise actual. Em 2008, a produção dos cereais crescerá 3,8%
, mas os preços não vão baixar, devido à necessidade de reconstituir reservas alimentares
e pela cada vez maior procura na China e Índia. Segundo Jacques Diouf, director-geral
da FAO, "não há mais tempo para conversas, a instabilidade climática e os desastres
dos últimos anos, provocam anualmente 262 milhões de vítimas de calamidades naturais,
dos quais 98% vive em países em desenvolvimento".
Outro factor que está ligado
à emergência alimentar é o dos biocombustíveis, cuja procura "aumentará em 12 vezes
até 2016, passando de 15 a 110 milhões de toneladas", declarou Diouf, que aproveitou
para pedir aos líderes mundiais 30 mil milhões de dólares anuais para relançar a agricultura.
Num
discurso empolgado, o director geral da FAO, indicou que em 2006 o mundo gastou 1,2
mil de dólares em armamento, enquanto se estragou comida no valor de 100 mil milhões
de dólares. E o excesso de consumo por pessoas obesas chegou a 20 mil milhões a nível
mundial.
O ministro da Agricultura Jaime Silva que representa Portugal na
cimeira da FAO em Romadefendeu ontem uma “ajuda estrutural, que tem
falhado, aos países onde há fome” e uma cooperação especial entre Portugal e os países
lusófonos para combater a crise alimentar. Após uma reunião com representantes do
sector das pescas e antes de partir para Itália para a reunião extraordinária da FAO,
Jaime Silva referiu que é necessário dar uma resposta à fome em vez de se discutir
teoricamente o assunto. “A FAO, e todos os seus membros, têm de dar resposta, mas
têm que dar resposta hoje porque a fome já lá estava ontem”, frisou o ministro, defendendo
que se evite a discussão teórica. Segundo o ministro da Agricultura, o “problema da
fome é um problema que a FAO trata há vários anos, e que ano após ano se mantém numa
dimensão insustentável para o mundo civilizado”. Jaime Silva lembrou também que
a situação da fome no mundo tem vindo a ser agravada com a crise dos combustíveis
e o aumento das matérias-primas. O governante disse que “temos de transferir conhecimento,
temos de cooperar para que cada Estado a nível mundial, particularmente os em vias
de desenvolvimento, tenham capacidade para produzir muito das suas necessidades alimentares,
ou pelo menos, para produzir o essencial das suas necessidades básicas”, adiantou.
Portugal deve, diz Jaime Silva, cooperar com os países de expressão portuguesa, directamente
e através da União Europeia. Uma preocupação também sublinhada pelas Caritas Portuguesa
e pela Oikós como nos refere o nosso correspondente em Portugal Domingos Pinto.