A solicitude do Papa e da Igreja por Timor Leste, nas palavras de Bento XVI ao seu
primeiro Embaixador junto da Santa Sé
(21/5/2007) “Um veemente apelo” às autoridades de Timor Leste, “para que façam tudo
o que lhes for possível para restaurar uma ordem pública eficiente com meios legais,
restituindo aos cidadãos a segurança na vida quotidiana” – foi lançado hoje pelo Papa
Bento XVI, no discurso dirigido ao primeiro Embaixador da República Democrática de
Timor Leste, Justino Maria Aparício Guterres, recebido no Vaticano para a apresentação
das Cartas Credenciais. Recordamos que (como anotou o diplomata timorense, na sua
saudação ao pontífice), no passado dia 8 de Abril, domingo de Páscoa, na sua mensagem
Urbi et Orbi, o Santo Padre evocou a situação daquela jovem nação, suplicando, “primeiro
a Cristo ressuscitado, mas depois também aos homens e mulheres de boa vontade, a força
da reconciliação e o dom da paz entre a população de Timor Leste”.
Em
razão das suas prerrogativas e funções – observou hoje Bento XVI – é o Estado o primeiro
garante das liberdades e dos direitos da pessoa humana, que lhe devem ser reconhecidos
em virtude da sua própria dignidade: enquanto ser espiritual, o homem é o valor fundamental
e vale mais do que todas as estruturas sociais em que participa. Ora, será esta atenção
aos direitos do homem por parte das autoridades timorenses que há-de dar a todos os
cidadãos confiança nas instituições nacionais, encarregadas de assegurar a sua protecção.
Considerações
estas – esclareceu o Papa – ditadas pelo seu “afecto e solicitude de Pastor pelo amado
povo” de Timor Leste e “um sinal de esperança que a Igreja depõe num provir mais justo
e prometedor” para o país. Bento XVI referiu com apreço “a maturidade cívica”
ainda recentemente revelada pelo povo timorense, ao afluir em elevado número às urnas
para a eleição do novo Presidente da República. O que mostra também a esperança que
os timorenses depositam no “processo de construção de um Estado de direito democrático”.
Aos
novos representantes e servidores deste povo, que já sofreu demais, - exortou o Papa
- peço que não desiludam tal esperança mas se empenhem numa progressiva democratização
da sociedade, procurando aumentar a participação de todos os grupos numa ordem da
vida pública que seja representativa e juridicamente tutelada. Como é sabido, o mundo
assistiu, incrédulo e preocupado, à grave crise gerada pelo desespero de uns e pela
impaciência de outros que transtornou o último biénio da vida nacional de Timor-Leste,
fazendo reaparecer na alma colectiva os fantasmas do passado sob as formas de medo,
suspeita e divisão. Que a recordação daqueles dias trágicos torne o governo e a oposição
particularmente solícitos em empreender a via do diálogo e da colaboração, evitando
a tentação de se abandonarem ao confronto com o adversário político, não só porque
é moralmente inaceitável mas também porque esta atitude se revela sempre prejudicial
para a consolidação de uma correcta dialéctica democrática e para o desenvolvimento
integral de todos os cidadãos do País. Todos sabem como a tarefa que hoje se apresenta
aos responsáveis da vida política, social e económica de Timor-Leste é árdua e não
está isenta de obstáculos – reconheceu Bento XVI. Não faltam incompreensões internas
e externas; não se dispõe de todos os recursos necessários para responder às numerosas
necessidades de habitação, saúde, educação, emprego; nem todos estão dispostos a prescindir
de interesses pessoais ou partidários. Para não encalharem de novo em tais obstáculos
(pediu o Papa), faço apelo à fé cristã que, há quatrocentos anos, se radicou no vosso
solo pátrio e hoje é senha e glória de noventa e oito por cento da população timorense,
bem ciente de ter encontrado na Igreja, com os seus Pastores na vanguarda, uma instância
inspiradora e promotora de uma cultura de solidariedade e convivência pacífica na
justiça, impelindo as vontades a colaborarem a favor do progresso e do bem comum,
sem esquecer a atenção que merecem os mais pobres e desamparados. Quase a concluir
o seu discurso ao primeiro Embaixador de Timor Leste junto da Santa Sé, o Papa teceu
algumas considerações gerais, sobre a atenção que a Santa Sé dedica à dignidade e
promoção das pessoas e dos povos, assim como o seu desejo de que cada um possa ocupar
o seu lugar e oferecer a própria colaboração na vida nacional e internacional. O
desenvolvimento dos povos – observou - depende em grande parte duma autêntica integração
numa ordem mundial solidária. À Igreja cabe não tanto propor programas operativos
concretos, que são alheios à sua competência, como sobretudo iluminar melhor a consciência
moral dos responsáveis políticos, económicos e financeiros. Para isso, ela põe em
evidência o princípio da solidariedade como fundamento de uma verdadeira economia
de comunhão e participação de bens, na ordem tanto internacional como nacional. Esta
solidariedade exige que se compartilhem, de modo equitativo, os esforços por resolver
os problemas do sub-desenvolvimento e os sacrifícios necessários para superar as crises
económicas e políticas, tendo em conta as necessidades das populações mais indefesas. Mas
esta solidariedade manifesta-se também como uma comunhão de serviços e permuta de
conhecimentos. Com efeito, mediante uma assistência técnica e uma formação apropriada,
é preciso encorajar os países que saem de períodos difíceis a favorecerem instituições
democráticas estáveis, a valorizarem as suas próprias riquezas para o bem de todos
os habitantes e a assegurarem às populações uma digna educação moral, cívica e intelectual.
Bento XVI congratulou-se “com a Organização das Nações Unidas e demais entes governamentais
e não governamentais pela solidariedade demonstrada para com o povo de Timor-Leste
pedindo-lhes que não o abandonem nesta fase de consolidação nacional”. “Com efeito
é através da promoção integral das pessoas que se ajudará os países a desenvolverem-se,
a serem fautores do seu progresso e parceiros da vida internacional e a enfrentarem
o futuro com confiança. / Não se pode esquecer que não poucos dos problemas sócio-económicos
e políticos na vida dos povos, têm as suas raízes e grande repercussão na ordem moral.
Neste campo, a Igreja, fiel ao mandato recebido do seu divino Fundador, procura iluminar
a partir do Evangelho as realidades temporais, movida sempre pelo seu afã de servir
o bem comum e as grandes causas do homem. Bento XVI concluiu assegurando que os
Pastores, sacerdotes e comunidades religiosas de Timor-Leste continuarão incansavelmente
no cumprimento da sua missão evangelizadora, assistencial e caritativa. Eles – sublinhou
o Papa - são os continuadores duma plêiade de homens e mulheres que, chamados a uma
vocação de serviço desinteressado, dedicaram as suas vidas a mitigar a dor, a instruir
e a educar, dando testemunho de abnegada entrega em favor dos mais necessitados… estes
servos do Evangelho que, até aos lugares mais remotos do País, levam ajuda e conforto,
infundindo amor e esperança. O Embaixador Justino Maria Aparício Gueterres, de
61 anos, é casado e pai de duas filhas. Formado em Letras e especializado em Antropologia,
foi docente de Sociologia e de Antropologia no Seminário Maior de Díli e de Cultura
Timorense no Instituto Católico para a Formação dos Professores de Baucau.