A “conversão” cristã nunca está completada. Para além da conversão inicial, o cristão
há-de viver toda a existência como um caminho de crescente conformação a Cristo.
(22/4/2007) Esta a reflexão e exortação de Bento XVI, na homilia da Missa deste domingo
de manhã, em Pavia. Partindo das leituras proclamadas, nomeadamente dos Actos dos
Apóstolos - Pedro que prega Jesus Salvador, convidando à conversão – o Papa centrou
toda a sua atenção sobre a palavra-chave “conversão”, começando por sublinhar que
se trata sempre de um caminho pessoal, segundo as circunstâncias que a cada um é dado
viver. Ainda assim – observou – “no decurso da história da cristandade, o Senhor deu-nos
modelos de conversão”, pontos de referência. A começar pelo próprio apóstolo Pedro
e Paulo de Tarso e incluindo “um dos grandes convertidos da história da Igreja – Santo
Aurélio Agostinho”, de que fala precisamente a cidade de Pavia.
“Seguindo
atentamente o curso da vida de Santo Agostinho, pode-se ver que a conversão não foi
um acontecimento de um só momento, mas sim um caminho. E pode-se ver que este caminho
não estava concluído na fonte baptismal. Como antes do Baptismo, também depois
a vida de Agostinho continuou a ser, embora de modo diferente, um caminho de conversão
– até à sua última doença … … quando se auto-excluiu de receber a Eucaristia, para
voltar a percorrer uma vez mais o caminho da penitência para receber a salvação das
mãos de Cristo como dom das misericórdias de Deus. Podemos portanto falar das ‘conversões’
de Agostinho que, na realidade, foram uma única grande conversão, procurando o Rosto
de Cristo e caminhando depois juntamente com Ele”.
Bento XVI desenvolveu
então, de modo catequético, as três grandes etapas deste caminho de conversão, as
três “conversões” exemplificadas na vida de Santo Agostinho:
A primeira
conversão fundamental foi o caminho interior foi o caminho interior em direcção ao
cristianismo, até ao sim da fé e do Baptismo… … Vivia como todos os outros, e contudo
havia nele algo de especial: sempre foi uma pessoa em busca… Queria encontrar o caminho
recto, não se contentando em viver às cegas, sem sentido e sem meta. A paixão pela
verdade é a verdadeira palavra-chave da sua vida.
"A segunda conversão
de Santo Agostinho – prosseguiu o Papa – foi a que ele descreve no final do II Livro
das suas “Confissões”. Quando, escolhido para o episcopado, foi constrangido a abandonar
o pequeno mosteiro que, cinco anos antes, tinha criado com os seus amigos, para se
dar totalmente ao colóquio com Deus e à contemplação da beleza e da verdade da sua
Palavra. Nesse momento, dissipou-se para Agostinho o sonho de uma vida contemplativa.
De agora em diante, tinha que viver com Cristo para todos. Tinha que traduzir os seus
conhecimentos e pensamentos sublimes no pensamento e na linguagem da gente simples
da sua cidade… (Como escreveu o próprio Agostinho), ‘continuamente pregar, debater,
retomar, edificar, estar à disposição de todos – é uma carga pesada, um grande peso,
uma fadiga ingente’."
Foi esta a segunda conversão que este homem, lutando
e sofrendo, teve que realizar continuamente: sempre de novo estar ali, para todos;
sempre de novo, juntamente com Cristo, doar a própria vida, para que os outros pudessem
encontrá-lo a Ele, a verdadeira Vida.
Mas houve “ainda uma terceira etapa
decisiva no caminho de conversão de Santo Agostinho”. No final da sua existência,
após vinte anos de ministério episcopal, escreve as suas “Retratacções”, em que passa
em resenha a sua obra anterior. “Relativamente ao ideal de perfeição expresso nas
suas homilias sobre o Sermão da montanha”, ele próprio escreve:
"Entretanto
compreendi que só um é verdadeiramente perfeito e que as palavras do Sermão da montanha
se realizaram totalmente apenas num só: o próprio Jesus Cristo. Por sua vez toda a
Igreja – todos nós, incluindo os Apóstolos – temos que rezar em cada dia “perdoa as
nossas ofensas assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido”. Agostinho tinha
aprendido o último grau de humildade – não só a humildade de inserir o seu grande
pensamento na fé da Igreja, não só a humildade de traduzir os seus grandes conhecimentos
na simplicidade do anúncio, mas também a humildade de reconhecer que a ele próprio
e a toda a Igreja peregrinante era continuamente necessária a misericórdia de um Deus
que perdoa; e nós – acrescentava – tornamo-nos semelhantes a Cristo, o Perfeito, na
maior medida possível, quando nos tornamos, como Ele, pessoas de misericórdia."