A Mensagem de Bento XVI para o Dia Mundial da Paz apresenta uma perspectiva ética
muito exigente: “Na Verdade, a Paz”. O texto retoma e aprofunda o magistério de João
Paulo II a este respeito, considerando a paz como muito mais do que a ausência de
guerra. Ela é, para o Papa, um dom celeste, uma graça divina que exige do homem o
exercício da maior responsabilidade que lhe é exigida: conformar a história à ordem
divina, na justiça, na liberdade, na verdade e no amor.
Na primeira vez em
que assina esta mensagem, o Papa reitera a “firme vontade da Santa Sé” de continuar
a servir a causa da paz e reflecte em torno de dois conceitos fundamentais, a verdade
e a mentira, lembrando o que aconteceu no século XX, quando se “mistificou” a verdade
em função de programas ideológicos e militares, com resultados trágicos. “Basta pensar
naquilo que aconteceu no século passado, quando aberrantes sistemas ideológicos e
políticos mistificaram de forma programada a verdade, levando à exploração e à supressão
de um número impressionante de homens e mulheres, exterminando mesmo famílias e comunidades
inteiras”, escreve.
A sociedade construtora de paz que Bento XVI chama a construir
deve condenar, de forma vigorosa o terrorismo e o fanatismo religioso. Sobre os actos
terroristas, “inspirados por um niilismo trágico e desconcertante” e pelo “fanatismo
religioso, hoje frequentemente denominado fundamentalismo”, o Papa refuta “a pretensão
de impor com a violência, em vez de propor à livre aceitação dos outros, a própria
convicção acerca da verdade”.
Os totalitarismos do século XX e o terrorismo
no novo século mostram, assim, que a questão da verdade e da mentira, quando se procura
construir uma moral social, não é supérflua. Para a teologia católica, expressa aqui
por um dos seus maiores mestres da actualidade, é o esquecimento da “plena verdade
de Deus” que está na origem dos erros acima referidos.
Da verdade e da mentira
dependem a história humana, porque a verdade revela a paz. Para tal, a mensagem do
Papa apresenta a gramática da “lei moral universal”, relançando o magistério do seu
predecessor. Ao contrário do fundamentalismo, aqui é possível radicar um discurso
forte sobre os direitos humanos, ligando a verdade à justiça: Bento XVI fala explicitamente
de um direito à paz e de um direito ao desenvolvimento das pessoas e dos povos.
Aos
católicos, em particular, a Mensagem deixa um desafio, o de “intensificar, em todas
as partes do mundo, o anúncio e o testemunho do «Evangelho da paz», proclamando que
o reconhecimento da verdade plena de Deus é condição prévia e indispensável para a
consolidação da verdade da paz”.
“A paz apresenta-se então de um modo novo:
não como simples ausência de guerra, mas como convivência dos diversos cidadãos numa
sociedade governada pela justiça, na qual se realiza também, na medida do possível,
o bem de cada um deles”, - assim se resume a ideia central do Papa para o próximo
dia 1 de Janeiro.