O secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), Kofi Annan, pediu "coragem
e ousadia" aos 191 países com assento na assembleia geral da instituição, para a aprovação
do seu programa de reformas, que compreende as mais drásticas alterações ao funcionamento
da ONU desde a sua criação, em 1945.
Num documento de 63 páginas intitulado Maior Liberdade - Desenvolvimento, Segurança
e Direitos Humanos para Todos, Annan define um ambicioso programa para restaurar a
confiança e a proeminência da ONU, depois da sucessão de "escândalos" que minaram
a credibilidade e a importância da organização, sobretudo a partir da crise diplomática
que levou à intervenção militar norte-americana no Iraque.
Para Annan, a futura comemoração do 60º aniversário da ONU, em Setembro, constitui
uma "oportunidade histórica" para reinventar a organização, fortalecendo o seu papel
em termos da definição das políticas de segurança e de respeito pelos direitos humanos
a nível mundial. O secretário-geral quer um novo Conselho de Segurança que reflicta
a realidade geopolítica, quer criar uma nova Comissão dos Direitos Humanos que sancione
o comportamento dos países que desrespeitam os seus povos e quer um acordo internacional
sobre as condições em que o uso da força pela comunidade internacional é admissível.
A proposta do secretário-geral estabelece um "meio-termo" de compromisso entre os
desejos dos países ocidentais, que reclamam resoluções mais "realistas" por parte
da ONU em assuntos como o combate ao terrorismo ou à proliferação nuclear, e os anseios
dos países em vias de desenvolvimento, preocupados em reforçar a componente de erradicação
da pobreza e da doença que afecta os estados mais atrasados e em particular as nações
do continente africano. No que diz respeito a conflitos, Kofi Annan espera que os
países cheguem a consenso para a definição das condições em que a comunidade internacional
autorize o uso da força, "inclusive de forma preventiva", propondo como parâmetros
os casos de genocídio, limpeza étnica e crimes contra a humanidade. Numa indirecta
aos EUA, o secretário-geral frisou que "no mundo de hoje, nenhum Estado, por mais
poderoso que seja, consegue proteger-se sozinho", considerando que a legitimidade
política para as missões de guerra deve sempre emanar do Conselho de Segurança.
O secretário-geral coloca depois um novo enfoque nas missões de manutenção e construção
de paz da ONU, sugerindo a criação de uma nova comissão de paz e desenvolvimento (Peacebuilding),
que ajude os países a recuperar de situações de guerra - uma ideia apresentada num
documento conjunto do antigo primeiro-ministro de Portugal, Durão Barroso, e do Presidente
da República de Moçambique, Joaquim Chissano.
Em termos de direitos humanos, o documento procura ultrapassar as críticas à actividade
da Comissão dos Direitos Humanos, na sequência dos participação de países como Cuba,
Líbia e Sudão. Kofi Annan propõe a extinção da comissão e a sua substituição por um
novo Conselho dos Direitos Humanos, eleito directamente pela assembleia geral, e onde
tenham apenas assento países que "respeitem os mais elevados critérios em termos de
direitos humanos".