2017-09-17 19:30:00

Vim trazer a voz dos sem voz e explicar o que se passa – Card. Nzapalainga


 

Organizar o serviço da Caritas em África por forma a melhor servir as necessidades das populações africanas. Uma tarefa em que os bispos são chamados a desempenhar um papel de responsabilidade e coordenação. E é para tomarem cada vez maior consciência deste papel e a porem em prática que a Caritas-África convocou um importante encontro em Dakar de 18 a 20 deste mês. Três dias de trabalho intenso em que participam cardeais e bispos à cabeça de Conferências Episcopais e das Cáritas nacionais, para além de directores e organizações parceiras, de modo particular a Cáritas Internacional.

A agenda do encontro prevê uma releitura dos documentos do Papa Bento XVI e do Papa Francisco sobre a dimensão social da Evangelização.

Este é o terceiro encontro importante da Cáritas-África nos últimos 7 anos. Mumemo (Moçambique) em 2010; Kinshasa em 2012, e agora o de Dakar. O historial e avaliação da aplicação das recomendações dos dois precedentes encontros é outro ponto da agenda.

Procurar-se-á também compreender o impacto que a criação do Dicastério do Vaticano para a Promoção do Desenvolvimento humano integral pode ter no desempenho do Serviço das Cáritas. O Presidente desse Dicastério, Cardeal Turkson, intervirá, de facto, na abertura do encontro.

Outros cardeais e bispos, ao todo cerca de uma centena, já vão chegando na tarde deste domingo 17 ao Hotel King Fad, de Dakar, lugar do encontro. De entre eles o Cardeal Dieudonné Nzapalainga, arcebispo de Bangui, República Centro-africana, país em conflito interno desde há anos e em cuja catedral, o Papa Francisco inaugurou o Ano Jubilar da Misericórdia.

Na sua intervenção prevista para terça-feira, 19/9, o Cardeal partilhará com os participantes a experiencia do seu país no domínio da colaboração inter-religiosa para a paz.

Antecipando à Rádio Vaticano o núcleo da mensagem que traz, o Cardeal disse, evocando a situação precária que se vive ainda no RCA país:  

“Actualmente, a situação em Bangui permanece calma, mas digo e repito que é uma calma precária porque sentimos que os espíritos não estão todos apaziguados e que será preciso fazer um pouco mais…

Grande parte do país está ocupado pelos rebeldes

No interior do país, há uma grande preocupação. Das 16 Prefeituras, 14 estão ocupadas pelos rebeldes e isto constitui uma grande preocupação para nós e creio também para as autoridades nacionais e a comunidade internacional. Há vexames, violações, há populações que são ameaçadas, há confrontos, temos a sensação de que essas pessoas são abandonadas ao seu destino, muitos membros da população civil são feitas reféns… Eis porque vim aqui trazer o grito dos sem voz. Vim também explicar o que se passa.

Não é guerra de religião

Não se trata de uma guerra de religião. Os líderes religiosos permaneceram sempre unidos desde o início desta crise. O Pastor Nicola e o Imã Oumar Koubine (?) e eu próprio constituímos aquilo que chamamos de Plataforma das Confissões Religiosas, uma forma nossa de praticar a caridade: convidar as pessoas a se respeitarem, a estimarem-se  uns aos outros, a respeitar a dignidade sobretudo da vida que é sacra, convidar as pessoas a se aceitarem, a colaborar, a construir um novo país.

Ter coragem e audácia de detectar os problemas

Temos a impressão de que se usa a religião para fins políticos. Assim, as pessoas têm a sensação de que o mal vem de tal ou tal religião e vice-versa. E nós dizemos não. Temos de ter a coragem e a audácia de detectar as causas do nosso problema, as causa da pobreza, as pessoas são pobres também por causa do analfabetismo: muitas das nossas crianças não conseguem ir para à escola desde há 15 anos. Acabamos um ano escolar, vamos agora começar outro, mas nas 14 prefeituras ocupadas muitas crianças não puderam estudar como deve ser. Então estamos a preparar analfabetos! Estes são os futuros rebeldes e presas fáceis para o endoutrinamento quando se deseja que se empenhem na rebelião.

Transformar tudo através da educação

Queremos transformar  tudo isto através da educação. Eis porque dizemos não a esta maneira de desviar; dizemos que nós adultos temos responsabilidade e que não devemos sacrificar a juventude por razões politicas, porque se pretende ter um lugar de ministro, porque se quer ter acesso a minas… no nosso país luta-se porque se pretende ter acesso ao ouro, a diamantes, à madeira; luta-se porque se pretende ser, mais cedo ou mais tarde, ministro… estas as razões, mas as pessoas não as dizem e põe-se como pano de fundo, quando não mesmo em primeiro plano, a religião. E então, é necessário neste tipo de encontro esclarecer uns aos outros, convidando também a fazer com que a solidariedade permaneça em volta da pessoa africana, a fim de que a atenção fixada sobre o país com a ida do Papa não desvaneça, porque a ida do Papa foi salutar, fez com que, as pessoas se erguesse no sentido físico, espiritual e humanos. Em Bangui hoje pode-se circular em todos os bairros, o que antes era impossível, e só temos a dar graças a Deus por isso…

São estas as preocupações que trago para este encontro de Dakar, ao conhecimento da Igreja e convidar a rezar por nós, a ser solidários, a nos apoiar para que continuemos a testemunhar com os outros religiosos, a cuidar juntos dos nossos irmãos e irmãs”.

O  serviço da Cáritas neste contexto não deve ser nada fácil!?

“O serviço da Cáritas não é fácil pela simples razão de que as pessoas da Cáritas que vão ajudar, muitas vezes não estão sequer em condições de segurança, estão expostas. Ultimamente, em Bangassou, quando estavam lá para ajudar, foram feitas reféns durante horas ou mesmo dias. Estão, está a ver que a vida dos que se empenham  para ajudar os seus irmãos não é respeitada. Acreditamos, por isso, que devemos criar condições para que haja apaziguamento nos corações de uns e de outros, para que uns e outros possam compreender que é possível que alguém em nome da Caritas venha ajudar e que a ajuda que leva não é só para católicos ou protestantes. Essa ajuda é para todos os seres humanos e para todo o ser humano. Aquele que está em condições de necessidade é nosso irmão. Devemos ajudá-lo, é a missão da Cáritas! E a Cáritas tem meios limitados porque a crise que abalou o país tocou também a Cáritas que tem dificuldade em encontrar recursos humanos e financeiros para fazer face, mas continua a estar ali como uma sentinela para alertar, para solicitar, para ir para a frente, para ajudar as pessoas a encontrar o caminho da esperança.”

(Dulce Araujo, em Dakar). 








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