Dom Flávio: extinção da reserva no Pará será um massacre cultural


Santarém (RV) – O governo brasileiro extinguiu quarta-feira (23/08) a Reserva Nacional do Cobre e seus associados (Renca), uma área na região da Amazônia entre os estados de Pará e Amapá, de 47 mil quilômetros quadrados entre o Pará e o Amapá – o equivalente ao tamanho do estado do Espírito Santo. A região, que é rica em ouro e outros minérios, engloba também nove áreas protegidas, entre florestas estaduais, reservas ecológicas e terras indígenas

Medida repercutiu negativamente em todo o mundo

A extinção deve permitir que cerca de 30% da área, que hoje é protegida, seja usada pela mineração privada. Apesar do nome, o local é muito conhecido por ter uma grande quantidade de ouro.

Criada em 1984, duas terras indígenas povoam a Renca. No lado paraense está a TI Rio Paru d`Este, onde habitam duas etnias, os Aparai e os Wayana. No lado do Amapá, encontra-se o território indígena do povo Wajãpi. Eles vivem em relativo isolamento, conservam modos de vida milenares, e protegem uma área superior a 17 mil quilômetros quadrados de floresta amazônica.  

Para o arcebispo de Santarém, Dom Flavio Giovenale, a concessão destas áreas à atividade extrativista privada faz parte da negociação do governo para se manter no poder.

“Foi uma decisão como tantas outras que estão acontecendo ultimamente... nos pegou totalmente de surpresa, como um raio no céu sereno sem nuvens que avisasse ‘olha vai ter tempestade’. Ninguém suspeitava e ninguém esperava que uma das reservas mais antigas do Brasil pudesse ser aberta à exploração mineral e agrícola, de madeira. Para nós, foi uma surpresa enorme mesmo e agora estamos tentando ver o que fazer”.

Qual o interesse do governo nesta reserva?

“Esta reserva tem muitas jazidas minerais, de ouro. E quando se fala de ouro, os olhos brilham mais do que o ouro. Este é o interesse comercial. Depois, tem o interesse político, porque é uma resposta ao apoio que a bancada agrícola e do poder mineral deu na luta contra o pedido de impeachment do Presidente Temer. Ele está agora pagando o apoio que recebeu para se manter no poder”.

Quem vive nesta reserva e como será prejudicado?

São duas populações indígenas, porque dentro desta grande reserva, há sub-reservas: duas são de razão antropológica (de respeito aos indígenas) e duas ou três reservas de tipo ecológico. É o conjunto todo desta mega-reserva que foi agora aberta. Então, historicamente, as populações indígenas são muito afetadas... será um verdadeiro choque, através de doenças e de um massacre cultural. O receio é que em poucos anos, aquelas populações percam a sua autonomia. O governo diz que não, que no território das reservas indígenas não será permitida a atividade econômica, mas na Amazônia, é difícil saber até aonde vai uma reserva indígena, onde começa outra e existe o histórico que os madeireiros não observam absolutamente onde tem território indígena e onde não tem. Eles avançam onde é de seu interesse”.

Como ajudar, além de tentar divulgar o que está acontecendo?

A única forma é esta: conscientizar para algumas reações, como abaixo-assinados, ou pessoas importantes que possam também dizer a sua opinião para fazer pressão, porque atualmente, é um jogo de pressão: a pressão do grupo que apoiou a luta contra o impeachment do Presidente, com interesses econômicos fortíssimos, com outros que podem defender as causas indígenas, do povo, da ecologia, e que possam dizer ‘espera, tem uma responsabilidade não só econômica, porque o ouro é importante dentro da economia de um país, e das empresas mineradoras', mas a vida é mais importante! Então, penso que as pressões podem funcionar, sim”. 

(cm)








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