Dom Porras: o caminho da paz é possível na convulsionada Venezuela


Venezuela (RV) -  “A paz nos pede em tempos difíceis, uma atitude muito própria dos cristãos: o perdão e a reconciliação. As tradições religiosas têm uma sabedoria especial que podemos e devemos compartilhar”. O Arcebispo de Mérida (Venezuela), Dom Baltazar Porras, divulgou uma reflexão sobre o papel da paz na situação vivida na Venezuela. Eis a íntegra do texto:

“A mensagem de paz do Papa Francisco deste ano foi intitulada "A não-violência: um estilo de política para a paz". Precisamos incentivar uma cultura com atitudes pessoais e ações públicas, políticas que sigam por esse caminho. A simples ausência de violência não significa que exista paz, mas a não-violência é o princípio necessário para que a paz seja possível.

Na Venezuela, a maior parte da ação política das últimas duas décadas tem sido marcada pelo espectro da guerra. A linguagem ordinária é a de amigos-inimigos, estamos em uma revolução pacífica, porém armada, todos os conflitos comuns em uma sociedade plural e democrática são tratados como ameaças de invasão, guerra, golpe. Os cidadãos são classificados como cooperadores ou apátridas. Criou-se uma milícia e pretende-se que todos os cidadãos devam ter um uniforme militar e armas para "defender a pátria".

Existem grupos paramilitares denominados "coletivos" que atuam como comandos bem treinados, armados até os dentes e agindo à revelia, destruindo facilidade e propriedade. As quantidades de dinheiro gastas em armas de guerra e em arsenais anti-motim atingem valores astronômicos. É um negócio enorme que favorece a corrupção porque se trata de investimentos "secretos" que não passam pelos crivos controle político comum e cidadão.

Vivemos em um ambiente permanente de confronto "quase bélico", o que não é saudável sob nenhum aspecto. Embora seja possível identificar os interesses geoeconômicos e geopolíticos que alimentam o uso da força bruta a serviço de um objetivo político, deslizamos em um tobogã  em que a dinâmica da violência converte-se em um fim em si mesmo.

Aspiramos que não seja imposta pela força da vontade do mais fortes. Porém a chave está na eliminação das desigualdades e da exclusão que alimentam as lutas de classes e a imposição de sistemas políticos obsoletos.

Que a visão cristã do Papa Francisco nos ajude a conduzir os espíritos nos caminhos da paz. Ele escolheu o nome de Francisco pelo amor deste santo pelos pobres e por seus esforços em construir a paz.

Diante do drama das migrações forçadas, exclamou em Lampedusa "Quero fazer-me intérprete do grito que sobe de todas as partes da terra. É o grito de paz! O grito que diz fortemente: Queremos um mundo de paz, queremos que em nossa sociedade, dilacerada por divisões e conflitos, exploda a paz!

Na Exortação "Evangelii Gaudium" (n. 185) - dedicada à dimensão social da evangelização - desenvolve amplamente a questão da inclusão dos pobres, a paz e o diálogo social. Vale a pena não ignorá-lo. E, finalmente, nas suas mensagens para o Dia Mundial da Paz, o Papa nos dá chaves importantes para alimentar uma boa cultura de paz: a fraternidade, fundamento e caminho da paz (2014), não escravos, mas irmãos (2015) , vencer a indiferença e conquistar a paz (2016), e não-violência: um estilo de política para a paz (2017).

A paz nos pede em tempos difíceis, uma atitude muito própria dos cristãos: o perdão e a reconciliação. As tradições religiosas têm uma sabedoria especial que podemos e devemos compartilhar. A experiência de misericórdia e de reconciliação de Deus conosco torna possível o impossível: uma tríplice reconciliação: com nós mesmos, com os outros e com a natureza. É o caminho da paz, todavia, estamos nesta convulsionado Venezuela.

Dom Baltazar Porras, Arcebispo de Mérida (Venezuela)








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