2016-05-02 14:04:00

Envolvimento de Forças de Paz da ONU em violações de mulheres


No artigo da autoria de Sara Gandolfi, afirma-se que, segundo estimativas da ONU mais de 60 mil mulheres foram estupradas durante a guerra civil na Serra Leoa entre 1991 e 2002; mais de 40 mil na Libéria, entre 1989 e 2003; pelo menos 200 mil na RDC, durante os últimos 12 anos de feroz conflito. 

A violência contra as mulheres como arma de guerra, não é todavia - afirma a autora – um fenómeno apenas dos tempos modernos e da África. No âmbito da chamada “limpeza étnica na Ex-jugoslávia, entre 1992 e 1995, terão sido violadas mais de 60 mil mulheres de todas as idades, mas há ainda vários outros exemplos.  E o que acontece é que se trata de delitos terríveis que permanecem, na maior parte dos casos, impunes.  

Os estupros em tempo de guerra são tão antigos quanto as guerras – afirma a jornalista. Mas o que emerge daquilo que contam mais 100 meninas da Prefeitura de Kemo, na República Centro-africana, é ainda mais horroroso porque – escreve Sara Gandolfi – quem as violou foram precisamente aqueles que as deveriam proteger: os militares das Forças de Paz da ONU, os chamados capacetes azuis.  Não é a primeira vez,  continua ela, que as forças de paz são citadas em episódios de brutalidade.

No ano passado um soldado francês tinha sido indagado alegadamente por abusos nos campos de refugiados em Bangui, mas desta vez as acusações contra os militares da França, capacetes azuis do  Gabão e do Burundi são muito circunstanciados e o Secretário Geral da ONU, Ban Ki-moon, sentiu-se no dever de exprimir a sua indignação. Além disso, no passado dia 31 de Março, o Conselho de Segurança da ONU decidiu abrir uma investigação: “será tolerância zero, de modo particular se estiverem envolvidas crianças”  disse o Presidente de turno, o angolano Ismael Abraão Gaspar Martins.  Os factos ocorridos remontam a 2013 e as vítimas eram na altura quase todas menores: 108 adolescentes que tinham confiança naqueles militares chegados de fora para procurar pôr termo ao sangrento conflito entre as milícias Séléka (muçulmanas) e os Anti-Balaka (cristãs). Mas, antes pelo contrário. Representavam para elas um grande perigo.

Referindo que o caso veio ao de cima graças à associação Aids-Free-World que interceptou algumas mensagens internas à ONU, em que se referiam factos até então descobertos pelos investigadores do UNICEF, a autora do artigo descreve factos aqui inenarráveis, factos ocorridos nos campos de refugiados geridos pela SANGARIS, a força francesa de intervenção imediata na RCA.

Segundo o artigo do jornal quotidiano “Corriera della Sera”, no ano passado a ONU recebeu 99 denuncias de casos de abusos e moléstias sexuais, 20 a mais do que em 2014. A maior parte, 69, dizem respeito a funcionários civis, polícias ou militares das missões de paz. Os países mais atingidos são precisamente a RCA e a vizinha RDC. Neste último país, há um médico ginecologista, o Dr. Denis Mukwege que fundou em 1998 o “Hospital de Panzi” em que cura as mulheres violadas, e é hoje, afirma Sara Gandolfi, o maior perito mundial na reconstituição dos órgãos sexuais femininos horrorosamente danificados pelos estupradores. Aliás, ele é conhecido pelo homem que conserta as mulheres. Ele já operou centenas de meninas com menos de cinco anos e que ficaram com o aparelho genital completamente destruído devido ao estupro.

Citando o Dr. Mukwege, Corriere della Sera, recorda que o estupro se tornou numa arma de guerra: “todos os grupos armados, desde Boko Haram, na Nigéria, aos jihadistas na Síria e Iraque utilizam o corpo da mulher para humilhar o adversário, para reduzir a força do inimigo. É quanto se viu no Ruanda, na Bósnia, na Colômbia, no Congo, no Sul do Sudão e também nalguns países da Ásia. A comunidade internacional deveria – segundo o médico congolês – impedir isso tal como fez com as armas nucleares, químicas e biológicas. Dever-se-ia estabelecer uma linha vermelha, assim como se fez para as armas de destruição de massa”. 

Contudo as leis não bastam, pois que a impunidade é a norma um pouco por todo o lado em matéria de estupro em contexto de conflitos. Então é preciso partir da “educação – diz o Dr. Denis Mukwege – Premio Sakarov 2014 – E acrescenta: no Congo há jovens de 20 anos que nasceram em consequência de um estupro e que viram violar a própria mãe. Ex-crianças soldado a quem se fez a lavagem do cérebro para que violassem mulheres do campo adversário… São pessoas psicologicamente instáveis. Se a sociedade não as ajudar, a violência corre o rico de continuar.

Abusadas, humilhadas, mortificadas fisicamente e psicologicamente. O estupro é quase sempre pior que a morte para a vítima, porque à dor ajunta-se o repúdio da comunidade em que vivem, as doenças, os filhos fruto da violência (no Ruanda são cerca de meio milhão). E a autora conclui recordando muitos casos semelhantes acontecidos, no Japão, na Itália … durante as guerras… casos globalmente considerados como “efeito colateral” da guerra, exactamente como no caso das 108 adolescentes centro-africanas que julgavam ser protegidas pelas forças de paz da ONU e que acabaram por ser vítimas precisamente deles próprios.

(DA) 








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