Papa Francisco prefacia obra sobre trapistas assassinados na Argélia


Cidade do Vaticano (RV) -  “Em Tibhirine se vivia o diálogo da vida com os muçulmanos; nós, cristãos, queremos ir de encontro ao outro, onde quer que ele esteja, para estabelecer laços de amizade espiritual e o diálogo fraterno que poderão vencer a violência”. Foi o que escreveu o Papa Francisco no Prefácio do livro “Tibhirine. L’heritage” (Tibhirine. A herança), organizado por Christophe Henning. A obra recolhe testemunhos de diversas personalidades sobre os frutos da mensagem de paz e de convivência entre cristianismo e islã, dos sete monges trapistas sequestrados e mortos na Argélia em 1996. O Prefácio, com data de 2 de janeiro de 2016, intitulado “Um sinal sobre a montanha”,  foi publicado no L’Osservatore Romano.

“Não fugiram diante da violência: combateram com as armas do amor, da acolhida fraterna, da oração comunitária”, comenta o Papa Francisco. “Deram testemunho com o seu sangue”, “na sua carne”, venceram o ódio no dia da grande provação”. “Mas é com toda a sua vida que são testemunhas (mártires) do amor – recorda o Papa – e não sem dificuldades”. “Doamos o nosso coração inteiramente a Deus, e já muito nos custa que no lo tome para si em parte”, afirmava Padre Christian de Chergé, Prior da pequena comunidade. Isto não diz respeito somente aos monges e monjas: todos nós somos chamados a dar a nossa vida no detalhe de nossos dias, em família, no trabalho, na sociedade, a serviço da “casa comum” e do bem de todos”, escreveu Francisco.

Eis o Prefácio na íntegra, numa tradução livre do Programa Brasileiro:

                                            Um sinal sobre a montanha

“Ninguém tem amor maior que este: dar a vida pelos próprios amigos” (João 15,13).

Christian de Chergé e os seus companheiros escolheram viver de modo simples a sua vocação contemplativa naquela bela e árida região do Atlas argelino. Os monges estavam presentes em Tibhirine desde 1938, mas o mosteiro era frágil: eram os “hóspedes” da casa do islã, trabalhavam a terra e compartilhavam a vida pobre dos camponeses. Os irmãos levavam uma vida comunitária despojada, irredutivelmente voltada a Deus que os unia. Sete vezes ao dia, em sua capela, elevava-se o louvor de sua oração.

Sequestrados na noite entre 26 e 27 de março de 1996, os sete monges de Tibhirine foram assassinados após longos dias de sequestro, vítimas da luta fratricida que dilacerava o país. Mas não foram os assassinos que tomaram-lhes a vida: a haviam dado antecipadamente, precisamente como os outros doze religiosos e religiosas, entre os quais o nosso irmão bispo Pierre Claverie, morto na Argélia durante aqueles anos escuros.

Não fugiram diante da violência: a combateram com as armas do amor, da acolhida fraterna, da oração comunitária. Instrumento de paz, de diálogo e de amizade, os monges responderam assim ao convite dirigido por São João Paulo II aos bispos do Maghreb durante sua visita ad limina em 1986: “Vocês vivem aquilo que o Concílio diz da Igreja. Ela é um sacramento, ou seja, um sinal, e não se pede a um sinal para fazer número”. Pequena Igreja orante em meio a um povo de orantes, os monges eram um sinal sobre a montanha.

Os irmãos cistercienses do Atlas deram testemunho com o seu sangue, vivendo em modo trágico esta prescrição da Regra de São Bento: que “Cristo (…) nos conduza a todos à vida eterna” (Capítulo 72). Na sua carne, venceram o ódio no dia da grande prova. Mas é com toda a sua vida que são testemunhas (mártires).  E não sem dificuldades. “Doamos o nosso coração inteiramente a Deus, e já muito nos custa que no lo tome para si em parte”, afirmava Padre Christian de Chergé, Prior da pequena comunidade. Isto não diz respeito somente aos monges e monjas: todos nós somos chamados a dar a nossa vida no detalhe de nossos dias, em família, no trabalho, na sociedade, a serviço da “casa comum” e do bem de todos”.

Vinte anos após a sua morte, somos convidados a ser sinais de simplicidade e de misericórdia, no exercício cotidiano do dom de si, a exemplo de Cristo. Não haverá outro modo de combater o mal que tece a sua teia em nosso mundo. Em Tibhirine se vivia o diálogo da vida com os muçulmanos; nós, cristãos, queremos ir de encontro ao outro, onde quer que esteja, para estabelecer laços de amizade espiritual e diálogo fraterno, que poderão vencer a violência. “Para conquistar o coração do homem, é necessário amar”, confidenciava Christophe, o mais jovem da comunidade. Eis a mensagem que podemos conservar em nosso coração. É simples e grande: à exemplo de Jesus, fazer de nossa vida um “Te amo”.

Papa Francisco








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