Editorial: A provação da fé


Cidade do Vaticano (RV) – Iniciamos a semana no Vaticano com a realização, na manhã de terça-feira, do Consistório ordinário, presidido pelo Papa Francisco para a assinatura dos decretos para a Canonização de 5 Beatos, indicando a data para a proclamação de Santidade. Grande alegria em todo o mundo pela Canonização de Madre Teresa de Calcutá, que será elevada às honras dos altares no próximo dia 4 de setembro.

No mesmo Consistório, Francisco também confirmou as datas para a Canonização de outros 4 futuros Santos: domingo 5 de junho serão canonizados o sacerdote polonês Estanislau de Jesus Maria e a religiosa Maria Elisabetta Hesselblad, fundadora das Brigidinas. Domingo 16 de outubro, enfim, serão proclamados Santos José Sanchez del Rio, mártir a 14 anos no México em 1929, e José Gabriel do Rosário Brochero, figura de sacerdote muito popular na Argentina e a quem sempre foi devoto Jorge Mario Bergoglio.

Quanto o mundo atual necessita de modelos de santidade e os novos santos são filhos do mundo de hoje, das necessidades e dos anseios. Chama à atenção a santidade de Madre Teresa, talvez porque muitos a conheceram e ela é filha do nosso tempo, ou porque ela tocou com as mãos as dores e sofrimentos da “tão falada civilização moderna”. Recordamos que o milagre que elevará Madre Teresa à glória máxima dos altares foi reconhecido pelo Vaticano e atribuído à futura santa pela cura inexplicável de um brasileiro da cidade de Santos.

E recordando Madre Teresa, nos vem também à memória a dor vivida pela Congregação das Missionárias da Caridade, por ela fundada, com o assassinato no Iêmen de 4 de suas religiosas, que ali realizavam a sua missão em prol dos últimos.

Mais a Igreja está próxima de Jesus, mais participa da sua paixão, disse um sacerdote na Arábia Setentrional. As irmãs assassinadas estavam dando suas vidas para servir idosos e pessoas com deficiências.

Na segunda-feira, durante a Santa Missa na Capela da Casa Santa Marta, o Papa Francisco voltou a falar das dores do mundo atual citando um sem-teto morto de frio em Roma, as irmãs de Madre Teresa assassinadas no Iêmen, as pessoas que adoecem na “Terra do fogo”, perto de Nápoles. Diante destes “vales tenebrosos”, disse Francisco, a única resposta é confiar em Deus.

“Quando nós, hoje, olhamos para os muitos vales obscuros, tantas desgraças, tanta gente que morre de fome, de guerra, crianças com problemas, tantas... Quando você vê que se fecham as portas aos prófugos e eles ficam ao relento, com o frio... a pergunta: mas Senhor, onde estás?”

E outra pergunta do Papa: “Por que uma criança sofre?” Não sei – foi a sua resposta, acrescentando: para mim é um mistério. Somente Jesus no Getsêmani me traz uma luz – não à mente, mas à alma: ‘Pai, este cálice, não. Mas seja feita a Sua vontade’. Entrega-se à vontade do Pai.

Na quarta-feira, durante a Audiência Geral na Praça São Pedro, Francisco, falando da Misericórdia e consolação, afirmou que na vida há situações, como a solidão, o sofrimento e a morte, que nos fazem sentir abandonados por Deus. Basta pensar na situação dramática de tantos irmãos nossos forçados a deixar a sua pátria, levando nos olhos a imagem da casa destruída e, no coração, o medo e tantas vezes a dor pela perda de pessoas queridas. Também nestes casos, podemos ter a vontade de perguntar: Onde está Deus? Recordando a experiência dos israelitas no exílio, Francisco recordou que Deus enxuga todas as lágrimas dos nossos olhos e nos liberta de todos os temores.

Vivemos em um mundo em que se registra um crescendo exponencial do medo, de casos de intolerância, de extremismos, de fundamentalismos, de violências. Perigos que atingem a liberdade individual do homem, sobretudo no que diz respeito à liberdade de religião, de professar a sua fé, de se expressar, como fizeram as irmãs da Caridade, trucidadas no Iêmen. São desafios que requerem como resposta uma ação de todos, como nos ensinam os Beatos que serão canonizados em breve, como nos ensina em particular Madre Teresa que dedicou a sua vida para dar dignidade aos últimos, aos esquecidos, aos habitantes da sarjeta.

No universo de dor atual, que nasce dos conflitos e guerras, temos um exército de deserdados que perambula pelas fronteiras da Europa em busca de uma vida digna, de um sonho acalentado e que se quebra nas cercas de arame farpado e muros. Um êxodo forçado que está provocando “uma hemorragia irrefreável”. Fronteiras fechadas, corações fechados.

Neste mundo de sofrimento não podemos deixar de recordar os cristãos que estão pagando a caro preço a sua adesão a Cristo. Ameaçados, torturados e muitas vezes assassinados pelo simples fato de seguir Jesus. Estamos voltando no tempo ou criando um tempo novo, onde as perseguições, os martírios começam a fazer parte do nosso dia-a-dia, muitas vezes na mais completa indiferença?

Mas como então erradicar radicalismos e fundamentalismos? Certamente a resposta está na base desses fenômenos que alimentam a sua existência: combater a injustiça, a desigualdade social, a pobreza, meio ideal onde construir visões e praxes fundamentalistas. Um combate que passa pela educação, pelo diálogo e pelo respeito das diversidades. Elementos que podem semear e tutelar a paz evitando a dor do êxodo de milhões de pessoas. Basta pensar no Iraque, Síria, Líbia.

Estamos para iniciar a Semana Santa e nos faria bem recordarmos de nossos irmãos perseguidos naqueles lugares onde a pobreza e a perseguição colocam a dura prova a própria existência da Igreja.

Como disse o Papa, o verdadeiro e radical regresso do exílio e a luz consoladora depois da provação da fé realiza-se na Páscoa, experiência plena e definitiva do amor misericordioso de Deus. (Silvonei José)








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