Geração perdida: Crise humanitária no OM norteia reunião do Cor Unum


Cidade do Vaticano (RV) – O Pontifício Conselho Cor Unum promove em 17 de setembro uma reunião sobre a crise humanitária síria e iraquiana e que terá a participação dos organismos de caridade católicos que atuam na região do Oriente Médio, assim como dos bispos da região. Trata-se do terceiro encontro, após aqueles realizados em 2013 e 2014 no Vaticano, para tratar da solidariedade às vítimas do conflito deflagrado em 2011. O Secretário do Cor Unum, Mons. Gianpietro Dal Toso concedeu uma entrevista ao L’Osservatore Romano.

- Quais são os objetivos da reunião de 17 de setembro?

“A reunião de 17 de setembro nasce de diversas exigências. A primeira é a de focalizar de maneira correta a crise no Oriente Médio, que hoje não é mais somente síria ou somente iraquiana, mas considerando as especificidades, trata-se de uma única crise, na qual as questão frequentemente convergem e às vezes até mesmo se confundem. Na mídia nós vemos seguidamente somente a ponta do iceberg: o problema do chamado Estado Islâmico e das consequências geopolíticas que isto cria, o envolvimento dos Estados Unidos e da Rússia, os aspectos militares da guerra e assim por diante. Mas assim corremos o risco de perder de vista o coração do que está acontecendo: a incidência que o conflito tem sobre a vida das pessoas. Gostaria de dizer que a crise, antes de ser política e diplomática, é uma emergência humanitária e humana. A mais grave dos últimos decênios.  Mais além do drama dos refugiados, que está aos olhos de todos, as situações talvez mais graves atingem as milhares de pessoas que permaneceram e permanecem nestes países. Na Síria – segundo dados os dados da ONU – são mais de 12 milhões os que têm necessidade urgente de ajuda, no Iraque, são quase 9 milhões. A maior parte são crianças e famílias inteiras. Trata-se de números enormes. Estas pessoas hoje necessitam comida, alojamento, tratamento médico, mas amanhã estarão sem trabalho e os mais jovens sem um adequado nível de instrução. Poderemos ter, por esta razão, verdadeiras gerações perdidas. O primeiro objetivo da reunião é, portanto, o de entender como reforçar a resposta da Igreja à situação humanitária”.

- Este ano também será apresentada uma pesquisa conduzida por diversas entidades eclesiais que atuam no contexto do Oriente Médio...

“Exato. E esta é a segunda razão do encontro. No ano passado, com alguma agências caritativas, instituímos um serviço chamado “Humanitarian Focal Point”, baseado no Cor Unum, para tratar desta crise. Conduzimos uma pesquisa sobre a ajuda humanitária no contexto da crise sírio-iraquiana, entre os diversos organismos de caridade que operam na área, as dioceses e as comunidades religiosas da Síria e Iraque. A pesquisa diz respeito a sete países (Síria, Iraque, Líbano, Jordânia, Turquia, Egito e Chipre) e envolveu 55 entidades eclesiais. Existe uma questão de fundo: nos países diretamente atingidos pelo conflito nos encontramos ainda diante de uma fase de primeira emergência. Todavia, após quatro anos, devemos começar a pensar seriamente também no futuro para entender se e quais perspectivas estas pessoas poderão ter amanhã, não mais hoje. E as perspectivas, infelizmente, não parecem serem um mar de rosas. É necessário ser realistas: esta guerra parece querer durar longamente. Mas se também as armas tivessem que calar logo - uma coisa que todos desejamos e para a qual rezamos e trabalhamos - entre a emergência e a pacificação definitiva, deveremos enfrentar um “período intermediário” no qual se terá muito por fazer para reconstruir a pessoa e criar um clima de respeito recíproco”.

- Algum dado poderia ser antecipado?

“Emergiram alguns resultados muito importantes, quer em mérito aos fundos destinados, quer em mérito aos setores de intervenção nos quais atua a Igreja. Das respostas que recebemos, além da questão dos fundos mobilizados, é importante saber que os beneficiários diretos da ajuda foram mais de 4 milhões a cada ano. Deve-se dizer, no entanto, que os dados para 2015 são ainda provisórios e, portanto, destinados a crescer. Mas aquilo que é importante, e é aquilo que a pesquisa sublinha, é a capilaridade da intervenção da Igreja e a sua multidimensionalidade. Os setores primários de intervenção são a ajuda alimentar, o fornecimento de bens não-alimentares, a educação, a saúde e o apoio para os alojamentos. Por fim, existe um último aspecto, não numérico mas substancial, sobre o qual seremos chamados a refletir em 17 de setembro: também na Igreja devemos promover uma maior colaboração e sinergia entre as diversas instituições. Além disto, como disse mais vezes o Papa Francisco, recordemo-nos sempre que “onde existem pessoas que sofrem, lá está presente Cristo”. É a ele que devemos olhar, e em torno a ele construir uma verdadeira comunhão”.

- Existem outras novidades que dizem respeito ao encontro deste ano?

“Existem pelo menos três. Antes de tudo trataremos o tema das comunidades cristãs. É bom ressaltar que a Igreja ajuda todos sem distinção. Os mais de 10 mil agentes eclesiais ativos na área (entre profissionais e voluntários) desenvolvem a sua missão, garantindo assistência material e espiritual a todos, cristãos e não cristãos, muçulmanos, sobretudo. Por outro lado, é evidente que a Igreja nutre grande preocupação pela sorte das comunidades cristãs do Oriente Médio e pela fuga de suas casas e das terras que historicamente e espiritualmente são o berço da mensagem de Jesus. Devemos nos perguntar, sem levar em consideração a pertença religiosa e sem preconceitos ideológicos: qual seria o Oriente Médio sem cristãos? A fuga deles, num futuro próximo, será um problema para toda a sociedade, mesmo para quem pertence a outras religiões, dado o papel histórico de tais comunidades. Recordemo-nos que muitíssimos refugiados que escapam da destruição da guerra, esperam um dia poder retornar para casa, quando acabar a emergência. Por isto devemos procurar ajudá-los a permanecer, obviamente em uma situação de segurança, e de contribuir para a paz e a reconciliação. Uma outra novidade é que na reunião acolheremos o Sub-Secretário ONU para Assuntos humanitários, Stephen O’Brien. De fato, no terreno já existem formas de colaboração com as agências da ONU e nos parece oportuno que nos ouçam para reforçá-las. Trata-se da primeira vez, em absoluto, que Nações Unidas, Santa Sé e organismos de caridade se encontrarão a este nível no Vaticano para tratar dos aspectos humanitários da crise”.

- Quais são as perspectivas após o 17 de setembro para o Cor Unum?

“Em mérito à crise síria e iraquiana, o Papa, com a colaboração do Cor Unum e do Pontifício Conselho para a Cultura, quis que os fundos recolhidos no Pavilhão Expo da Santa Sé, graças às ofertas que os visitantes deixam, sirvam para financiar projetos educativos para as crianças refugiadas na Jordânia. Estaremos por isto logo empenhados na realização destes projetos, e no geral, continuaremos a promover, dia por dia, a colaboração entre todas as entidades eclesiais, procurando junto a eles individuar pouco a pouco as prioridades e as situações mais críticas que vão, naturalmente, se modificando. Usaremos ainda, no nosso trabalho, também novas realidades, que vão sendo acrescentadas à comunidade eclesial e às agências que já fazem referência ao discastério. Nesta ótica sinto gosto em anunciar que já no dia sucessivo à reunião, aplicaremos pela primeira vez o artigo 15 § 2 do Motu proprio Intima Ecclesia Natura, que nos permite atribuir a personalidade jurídica canônica a organismos de caridade internacional. Faremos  o reconhecimento de uma agência com sede nos EUA e que opera em todo o mundo em favor dos pobres,  já no dia 18 de setembro”. (JE/OR)








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