Dom Helder pedia Concílio com enfoque nos mais pobres


Cidade do Vaticano (RV) - No nosso espaço Memória Histórica - 50 anos do Concílio Vaticano II - vamos continuar a falar, na edição de hoje, sobre a participação de Dom Helder Câmara no evento conciliar.

Dom Helder tinha plena consciência de que eram certos gestos e símbolos que dariam o sentido do Concílio às pessoas através das imagens que a elas chegassem. Neste sentido, estava sempre em busca de gestos que pudessem causar algum impacto como, por exemplo, a sugestão a João XXIII - e mais tarde a Paulo VI - de que a celebração de encerramento do Concílio fosse marcada pela simplicidade e profundidade dos gestos, fato que acabou ocorrendo, ao menos em parte.

Dom Helder também sabia que o Concílio se desenvolvia em várias plataformas distintas, a começar pelas Congregações Gerais, o que fazia com que trabalhasse através do Ecumênico, da Igreja dos Pobres, da CNBB e do CELAM, para que chegassem à Aula conciliar intervenções vigorosas e preferencialmente coletivas, capazes de dar um rumo aos trabalhos conciliares. Também nas Comissões de Trabalho - onde os textos eram elaborados, refeitos e trabalhados para serem submetidos à votação - Dom Helder teve uma atuação significativa, dando mais tarde sua contribuição nas Comissões dos Bispos e Governo das Dioceses, na do Apostolado dos Leigos e na do Esquema XIII, sucessivamente convertido na Gaudium et Spes.

Não podemos deixar de mencionar a atuação de Dom Helder nas Conferências da Domus Maria, 94 no total, (às quais dedicamos inúmeros programas) e que eram uma forma de colocar o episcopado brasileiro e Latino-Americano em contado com as diversas correntes espirituais e teológicas que moviam o Concílio Vaticano II.

Dom Helder Câmara não falou nenhuma vez na Aula Conciliar, não obstante tenha preparado intervenções notáveis depositadas por escrito na Secretaria Geral. Deixa patente em todas elas a sua visão de caráter mais abrangente e estratégica frente aos grandes problemas contemporâneos e às responsabilidades e missão da Igreja

Assim que o Cardeal Secretário de Estado Domenico Tardini escreveu a todos os bispos, em 18 de julho de 1959, solicitando sugestões para a agenda do Concílio, Dom Helder respondeu em duas páginas e meia, com sugestões que diferem em muito do estilo de respostas enviadas pela maioria do episcopado mundial. Inicialmente, Dom Helder propõe que o latim não seja a única língua do Concílio, pois fora do ambiente da Cúria e das Universidades Romanas não era de uso corrente. Inquieta-se, também, com o método que será usado no Concílio para trabalhar com a gama de sugestões que chegariam de todo o mundo sobre diversos temas, propondo então que os mesmos fossem agrupados em seis grandes áreas: economia, artes, ciências, política, questões sociais e religiosas.

O que mais lhe preocupava, no entanto, era o enfoque das questões a serem debatidas. Enquanto muitos falam do conflito entre as grandes potências do Oriente e Ocidente no contexto da Guerra Fria, Dom Helder deseja que a atenção do Concílio se volte para os 2/3 da humanidade mergulhados na fome e na miséria. Ele defende que a Igreja na América Latina, por meio do CELAM, poderia ter uma atuação mais eficiente no combate aos problemas do que a Operação Pan-americana proposta pelos Chefes de Estado do continente. Dom Helder propunha ainda um trabalho conjunto entre as Igrejas mais ricas, situadas no Canadá e Estados Unidos, com os demais países do continente americano, para superar a grave situação do existente. No entanto, o maior enfoque deveria ser sobre os países empobrecidos da África e da Ásia.

Suas proposições manifestadas assim de antemão, já faziam antever esta visão mais ampla que ultrapassava os limites da Arquidiocese do Rio de Janeiro, onde era Bispo Auxiliar (1952-1964), ou da Arquidiocese de Olinda e Recife, da qual se tornou Arcebispo em 1964; assim como do Brasil e do próprio continente, de cujo órgão eclesial – o CELAM – era Secretário Geral.

 

Fonte: Dom Helder Câmara e o Concílio Vaticano II. José Oscar Beozzo








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