Editorial: O mercado dos novos escravos


Cidade do Vaticano (RV) – No último dia 23 de agosto comemoramos o Dia Internacional da Lembrança do Tráfico de Escravos e sua Abolição, estabelecido pela ONU, para recordar o levante que ocorreu na ilha de Santo Domingo, na noite entre 22 e 23 de agosto de 1791, e que levou à abolição do tráfico de escravos transatlântico.

O levante ocorreu mais de 224 anos atrás, mas hoje esse fenômeno ainda é atual e envolve milhões de pessoas ao redor do mundo, e não poupa nem mesmo as crianças. São milhões de pessoas, 21 milhões de acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), as vítimas do tráfico de seres humano no mundo, um fato em contínuo crescimento que está se transformando em um dos negócios mais rentáveis no planeta.

Os setores mais envolvidos são a agricultura, serviços domésticos, as empresas de transporte e a mendicância. Altas também as cifras da exploração sexual. Por exemplo, são cerca de 500 mil ao ano as mulheres que chegam à Europa e são forçadas a entrar nas redes de prostituição.

Nos dias passados foi publicado na Espanha um relatório do Serviço dos Jesuítas para os Refugiados (SJR), com o título “O tráfico de seres humanos, o negócio do comércio das pessoas”. Um dos problemas sérios que é preciso enfrentar, primeiramente, observa o relatório, é a falta de estatísticas sobre este fenômeno que os Estados querem esconder. Não existe, de fato, um sério monitoramento em nível local do problema e, ao mesmo tempo, já são numerosas as pesquisas realizadas por agências internacionais que apresentam um cenário alarmante.

De acordo com as Nações Unidas, o contrabando de seres humanos através das fronteiras interessa pelo menos 4 milhões de pessoas e tem um faturamento que vai entre os 7 e os 10 bilhões de dólares anuais.

O Papa Francisco em muitas ocasiões sublinhou que “o tráfico de seres humanos é uma chaga no corpo da humanidade, uma ferida na carne de Cristo, um crime contra a humanidade”. O tráfico de pessoas, submete em especial os mais vulneráveis da sociedade a uma verdadeira “escravidão”.

São milhões as vítimas de trabalhos forçados num tráfico de mão de obra e exploração sexual. Isto não pode continuar. Seria uma derrota para o mundo permitir que seres humanos sejam tratados como objetos, enganados, violentados, vendidos, ou até mortos ou feridos no corpo e na alma, sendo por fim descartados e abandonados. “É uma vergonha”, sentenciou certa vez Francisco sem usar meios termos.

Vemos nos últimos dias um exército de deserdados tentando passar fronteiras a todo custo para chegar “à terra da esperança”, em busca de uma vida melhor. Ao mesmo tempo vemos também novos muros sendo construídos para evitar a entrada de miseráveis expulsos de suas terras e casas: muitos deles poderão cair nas mãos de pessoas sem escrúpulos e se tornarem vítimas de trabalhos escravos nas terras que os acolhem.

Na sua mensagem aos brasileiros por ocasião do início da Campanha da Fraternidade em março de 2014, Francisco pedira o comprometimento dos cristãos e pessoas de boa vontade  para que mais ninguém seja vítima do tráfico humano. O tema da Campanha foi precisamente “Fraternidade e Tráfico Humano”. Nas suas palavras, Francisco afirmava que não é possível ficar impassível, sabendo que existem seres humanos tratados como mercadoria. A dignidade humana é igual em todo o ser humano.

Infelizmente, num sistema econômico global dominado pelo lucro, desenvolveram-se novas formas de escravidão em alguns aspectos piores e mais desumanas que aquelas do passado. Portanto, como cristãos, somos chamados a denunciá-las e combatê-las.

Toda a sociedade é chamada a crescer nesta consciência e todos nós somos chamados a contribuir para tornar o mundo mais humano e mais consciente desses desafios. (Silvonei José)

 








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