'Laudato si': Francisco levanta a questão e entra no debate


Cidade do Vaticano (RV) - Na expectativa da publicação, na próxima quinta-feira, 18 de junho, da Encíclica do Papa Francisco Laudato Si, a Revista dos Jesuítas, Civiltà Cattolica, publica na sua última edição, vários artigos sobre a preocupação da Igreja em relação à ecologia. Nossa colega Crsitiane Murray fez uma síntese do editorial da revista dedicado ao tema:

- Como a Igreja tem entendido, nos últimos 50 anos, a preocupação ecológica e o tema do meio ambiente? Qual é a mensagem do Magistério petrino sobre este tema que tem se imposto mais e mais e que está prestes a se tornar, com a Encíclica do Papa Francisco, um capítulo significativo da Doutrina Social da Igreja?

“A exploração irracional da natureza não só prejudica gravemente o meio ambiente, mas também representa um grave problema social e humano”: esta mensagem básica de Paulo VI, que permaneceu praticamente despercebida durante décadas por líderes econômicos e políticos, é hoje repetida e enfatizada.

Entre os anos 70 e início dos 90, em muitas sociedades, a consciência de ameaças ecológicas aumentou de forma consistente e progressiva. São JPII começou a falar sobre as consequências do crescimento industrial, das enormes concentrações urbanas e do aumento significativo no consumo de energia. Citando ecologia ambiental e ecologia humana em sua encíclica Sollicitudo rei socialis (1987), especificou as raízes bíblicas da questão ecológica.  

Em janeiro de 1990, escreveu a Mensagem para o Dia Mundial da Paz centrada no tema ‘Paz com Deus Criador. Paz com toda a Criação’. Antes que se tornassem termos comuns, aquele texto já mencionava questões como aquecimento global e os efeitos da mudança climática. Ecologia e justiça começaram a ser questões inseparáveis.

Um novo passo foi dado na Encíclica Centesimus Annus (1991). João Paulo II relacionou a questão ecológica ao problema do consumismo e ao que ele definiu como um "erro antropológico": "O homem, seu desejo de ter e desfrutar, ao invés de ser e crescer, consome de forma excessiva e desordenada os recursos da terra e sua própria vida”.

Desde a Mensagem ‘Paz com Deus Criador, Paz com toda a Criação’ de 1990, até hoje, esta discussão se arrasta há 25 anos. Naturalmente, as questões em jogo são complexas: em primeiro lugar, nos campos científico e político e, depois, econômico e comercial.

Em 2005 chega Bento XVI e 2007, na mensagem para o Dia Mundial da Paz, retoma e consolida o trinômio inseparável "ecologia da natureza", "ecologia humana" e "ecologia social". Ali, o destaque vai para o fato de que em algumas regiões do planeta o desenvolvimento era em parte freado por causa do aumento dos preços da energia. O Papa questionava: "O que vai acontecer com essas pessoas? Que tipo de desenvolvimento ou de não-desenvolvimento será imposto sobre elas pela escassez de reabastecimento energético? Que injustiças e antagonismos a corrida às fontes de energia provocará? E como estes povos vão reagir excluídos desta corrida?". 

Certamente, a encíclica Caritas in Veritate (2009) foi um marco do seu pensamento "verde", reunindo os contextos ecológico, jurídico, econômico, político e cultural.

Francisco: salvaguarda e integração 

De dois anos para cá, desde o início de seu pontificado, o Papa Francisco acrescentou sua voz no debate mais recente do mundo. Com linguagem eficaz e direta, não hesitou em  afirmar que “é o homem que maltrata a natureza, continuamente. De certo modo nos apropriamos da natureza, da irmã terra, da mãe terra. Lembro-me daquilo que um velho agricultor me disse uma vez: “Deus perdoa sempre, nós – os homens – algumas vezes, a natureza nunca». Se a maltratar, ela vai te maltratar” (Coletiva de Imprensa em voo para Manila durante a sua viagem apostólica ao Sri Lanka e Filipinas, 15 de janeiro de 2015).
Um conceito-chave de Francisco, repetido várias vezes desde a missa inaugural do seu ministério, é a  ‘tutela’ da terra, em referência ao "Seja!" criativo de Deus, por um lado, e o louvor à Criação de Francisco de Assis, por outro.

Papa Francisco retomou estas primeiras palavras como Papa na Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, “Nós, os seres humanos, não somos meramente beneficiários, mas guardiões das outras criaturas. Não deixemos que, à nossa passagem, fiquem sinais de destruição e de morte que afetem a nossa vida e a das gerações futuras” (EG 215).

Preocupação ambiental como dimensão da fé

O Papa Francisco levanta questões e entra no debate. Esperamos que aceitando o desafio em termos de fé e de decisões operacionais, as pessoas sejam gratas pela coragem de um líder mundial de chamar todos para um futuro mais sustentável e inclusivo.

A preocupação com a ecologia humana e ambiental mostra uma dimensão fundamental da fé como é vivida hoje, para a salvação do homem e a construção da vida social. É portanto parte da doutrina social da Igreja. É por isso que hoje, é hora de termos toda uma carta encíclica - e não apenas alguns parágrafos - sobre o tema ecológico.

2015 é um ano crucial para a humanidade. Em julho, os países vão se reunir para a Terceira Conferência Internacional sobre o Financiamento do Desenvolvimento, em Adis Abeba. Em setembro, a Assembleia Geral das Nações Unidas deve encontrar um acordo sobre um novo conjunto de objetivos de desenvolvimento sustentável, para colocar em prática até 2030. Em dezembro, a Conferência sobre Mudanças Climáticas, em Paris decidirá os planos e os compromissos de cada governo para retardar ou reduzir o aquecimento global.

Em busca das implicações ecológicas da nossa fé 

Nunca antes na história, o Santo Padre e a Igreja foram um fator tão relevante em um processo tão global. É verdade que hoje, “a Religião - como disse o Patriarca Bartolomeu entrevistado pela Civiltà Cattolica - é provavelmente a força mais penetrante e poderosa da Terra. Na verdade, a fé não só desempenha um papel fundamental na vida pessoal de cada um de nós, mas tem também um papel vital como força de mobilização social e institucional”.

O Pontífice hoje enfrenta este desafio reconhecendo adequadamente a abordagem científica sobre as alterações climáticas, suas causas e consequências e os remédios necessários. O líder da principal religião do mundo conta com a sua fé, com o ensinamento da Igreja, e as melhores informações e os melhores conselhos disponíveis, demostrando que é nossa tarefa de recolher e analisar informações, julgar, tomar decisões, agir. É uma responsabilidade moral séria, à qual não se pode subtrair. A falta de resposta seria um pecado de omissão.

(CM)








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