Do diálogo à paz


Belo Horizonte (RV) - O diálogo é o único caminho para se conquistar a efetivação da paz, em todos os níveis, instâncias e segmentos da sociedade. No fundamento do diálogo, está o enorme desafio do entendimento. Os desajustes nas dinâmicas que levam ao entendimento prejudicam a busca pela verdade, não possuída, em caráter absoluto, por ninguém - por nenhuma autoridade religiosa ou sistema político-ideológico.  Só se aproxima da verdade quem dialoga. Essa constatação se aplica na administração de situações que ocorrem no ambiente doméstico, nas que se relacionam ao ambiente profissional, ao exercício da cidadania e também nas grandes tratativas de relações políticas internacionais. Buscar a paz acima de tudo é abrir-se ao diálogo. Só o entendimento conquistado pelo diálogo possibilita o avanço na direção da paz. O distanciamento desse dom de Deus é resultado da incompetência para o diálogo. Nesse ponto, há um detalhe de grande importância a ser observado para que o dialogar permita o entendimento e, consequentemente, o aproximar-se da verdade. Trata-se da superação das visões de mundo estreitas, que impossibilitam os avanços necessários para se alcançar a paz a partir do diálogo. 

É interessante pensar, como exemplo que clarifica essa análise, em um conflito de ordem familiar, baseado nas diferenças entre gerações. A velocidade das mudanças culturais e tecnológicas que afetam de modo mais intenso os jovens, localizando-os numa dinâmica muito peculiar de vida e de compreensão, não raramente colide com as visões, posturas e escolhas da geração adulta. O convívio de diferentes perspectivas requer boa administração para que o diálogo não fique comprometido e, consequentemente, falte paz às famílias. A competência para o diálogo é necessária na articulação do conhecimento, no uso das tecnologias e na compreensão das mudanças culturais. 

Caminhar rumo à paz, a partir do diálogo que leva ao entendimento, exige sensibilidade social e política.  O tipo de orientação que se dá à vida no exercício das próprias responsabilidades tem consequências que podem ser graves. Pode-se avaliar, entre as diversas e importantes situações, a reunião de um grupo em determinado parlamento. Se a visão de mundo desses representantes do povo for equivocada, se agirem orientados a partir de interesses cartoriais - o que indica pouco compromisso com o interesse do povo -, somente serão capazes de oferecer respostas medíocres diante das muitas necessidades sociais. 

Concretamente, pode-se pensar no projeto de reforma política desenvolvido no ambiente parlamentar sem a devida escuta da sociedade civil e, também, na proposta de diminuição da maioridade penal. Iniciativas que escancaram as limitações dos que se posicionam e votam de modo favorável a essas mudanças. A consequência é desastrosa, atrasa processos e inviabiliza o desenvolvimento da sociedade. O que se passa na esfera política não é muito diferente do que ocorre no âmbito religioso. O horizonte de compreensão, muitas vezes, torna-se estreito pela rigidez, pela hegemonia do conservadorismo ou pela falta de preparo intelectual. É alto o preço pago por se “rifar” projetos e pessoas - o outro que deve estar na ponta do diálogo que salva. 

A referência ao diálogo como caminho para a paz emoldura o conjunto de outros âmbitos e incursões que precisam permanentemente ser bem tratados.  Do diálogo entre diferentes culturas, passando pelo respeito aos direitos humanos, a responsabilidade no cuidado ambiental - livre da ganância, em parâmetros de verdadeira sustentabilidade -, até o primordial combate à pobreza, como condição indispensável na construção e conquista da paz.

Curioso é que o instrumento contemporâneo das redes sociais e toda a tecnologia digital à disposição, eivadas de informações, podem ter sua força de serviço enfraquecida e comprometida por conta da incompetência individual de dialogar em busca da verdade. Mal maior forma-se quando desmorona o mais importante santuário de cada pessoa: a sua consciência. Esse importante lugar para o diálogo, em função de interesses, com o objetivo de elaborar justificativas e de esconder razões espúrias, torna-se ambiente em que mentiras ganham aparência de verdades.  Corrompida a consciência, não haverá mesmo saída para a paz. 

A incompetência para o diálogo que constrói a paz impossibilita que sejam alcançadas as muitas soluções necessárias, induz a sociedade a pensar, erroneamente, que a solução de suas crises depende apenas dos números e cifras. Perpetua uma dinâmica cultural da dependência e da mediocridade. É hora de investir na educação para o diálogo a partir da convicção incontestável de que ele é o caminho para a paz.

Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte








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