2014-08-21 17:39:16

Padre Lombardi, sobre viagem à Coreia: Papa toca corações porque testemunha o Evangelho com simplicidade


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Ao fim da viagem apostólica a Coreia, o nosso diretor geral, padre Lombardi, faz um balanço partindo da contribuição da visita do Papa à causa da reconciliação entre as duas Coreias, evocada várias vezes não só diante das autoridades institucionais e eclesiásticas, mas também com os jovens. A entrevista é de Alessandro De Carolis.


O tema da divisão entre as duas partes da Coreia e, mais amplamente, o tema da reconciliação e da paz, foi uma constante nesta viagem. A abordagem do Papa foi sempre claramente evangélica, claramente cristã, no sentido de favorecer, incutir as atitudes profundas que são a premissa da reconciliação e da paz. O Papa sabe muito bem que não é um político e uma autoridade com poderes político-militares para alcançar a paz no mundo, mas que é um líder moral e religioso e que, portanto, age num plano, que porém é muito mais profundo e clarividente e que afinal é o plano da conversão dos corações e do diálogo feito em profundidade entre as pessoas na sua totalidade e, portanto, de um diálogo que supõe uma conversão e uma atitude recíproca de escuta. Esta, eu diria, é a mensagem que o Papa nos deixou sobre a paz e a reconciliação na Coreia. Alguém ficou talvez até um pouco decepcionado: teria preferido mensagens mais fortes de condenação do regime da Coreia do Norte ou das perseguições de que sofreram os cristãos e as religiões na Coreia do Norte, mas esta não era a tarefa do Papa nesta viagem. Ele toma conhecimento de uma situação que existe, infelizmente, há já 66 anos e procura pôr as premissas para ela mude e mude em profundidade e por um tempo contínuo, começando, portanto, da reconciliação que nasce dos corações. O discurso feito pelo Papa foi feito com consciência, com grande profundidade e eu acho que os coreanos o entenderam muito bem. Ouvi muitas expressões, também de gratidão, pela homilia das Missa final.


Falando da viagem como um todo, começaria por uma consideração feita na Rádio Vaticano pelo presidente dos bispos coreanos, que disse: "Francisco consolou-nos e nos fez sorrir." Poderíamos dizer que o Papa deu uma demonstração de "empatia" para com o povo coreano, da maneira como ele mesmo falou com os bispos?

Certamente. O Papa demonstrou de ser um homem que se move sempre para encontrar o outro, vendo-o à luz da e, à luz da fé cristã, como imagem de Deus, como filho de um único Pai. E para o povo coreano ele teve esta mesma atitude de amor profundo, que demonstrou também, de forma muito eficaz, em relação com grupos de pessoas sofredoras que ele encontrou. Isto tocou muito os coreanos, que são sensíveis à contribuição específica que a Igreja Católica tem trazido desde as suas origens, de atenção para aqueles que são fracos, no âmbito da sociedade. Assim o Papa, com os seus gestos, conseguiu fazer entender que, à luz da fé cristã, todos os membros do povo coreano, seja qual for a sua situação, os seus sentimentos, são para ele pessoas para abraçar, amar, encontrar.


E a propósito de gestos, um dos encontros na Coreia viu o Papa Francisco quase mudo, mas o seu comportamento, pelo contrário, comoveu – como lembrava - todos os coreanos. Falo da sua visita ao Centro de assistência para pessoas deficientes de Kottongnae..

Eu creio que é efectivamente uma das imagens que permanecerá mais profundamente gravada na memória dos coreanos e de todos aqueles que têm acompanhado esta viagem. Alguém - não me recordo exatamente quem - me lembrou, a este respeito, as palavras de São Francisco, que diz: o Evangelho deve ser anunciado sempre, com toda a nossa vida", se necessário também com as palavras". Mas isto supõe que, efectivamente, o Evangelho seja anunciado, antes que com as palavras, com a vida e, portanto, também com os actos concretos. E o Papa Francisco recolhe de maneira excepcionalmente viva esta recomendação. E é por isso que, justamente, não devia fazer grandes discursos. Se as pessoas a quem se dirigia eram pequenas crianças com deficiência, não tinha sentido fazer-lhes grandes discursos, mesmo muito bonitos, porque elas não eram capazes de recebê-los. Enquanto que o abraço, a carícia, a manifestação do amor também físico, digamos, mas certamente concreto é algo que todos podem perceber, é uma linguagem absolutamente universal. Isto se deve apreciar e dar graças a Deus: ou seja, que exista uma linguagem universal que todos entendam, mesmo que haja línguas diversas com as quais, por vezes, temos dificuldades de comunicação, e é a linguagem do amor, do amor concreto. Todos os Santos a entenderam. Recordávamos antes Francisco, mas também Madre Teresa: porque Madre Teresa, que, aliás, trabalhou na Ásia, conseguiu fazer passar a sua mensagem? Porque encarnou a mensagem do amor cristão. O Papa Francisco consegue fazê-lo - é também um dom que ele tem - com grande simplicidade e naturalidade. Aquelas crianças com deficiência, que aliás são pessoas abandonadas, que tinham sido abandonadas, são portanto elas que realmente mais precisavam de amor e que puderam reencontrar uma vida física e, em sua medida, um sentido da vida, graças ao amor, a um amor motivado na fé cristã, pelo menos no seu caso concreto. E esta é uma das maneiras mais eficazes com a qual a Igreja dá testemunho de Jesus Cristo, substancialmente, no amor.

Os coreanos, orgulhosos de recordar muitas vezes que o nascimento da sua Igreja foi devido ao empenho dos leigos; a menina cambojana que pede ao Papa para que se possam conhecer os mártires que se sacrificaram pelo Evangelho no seu país ... A impressão no Ocidente, onde as igrejas asiáticas são pouco conhecidas, é que elas são muito mais volitivas e enraizadas do que aquilo que as suas dimensões podem sugerir. Qual é a sua opinião?

Efectivamente, nós temos muito a aprender das igrejas da Ásia. Acho que um dos grandes valores desta viagem foi, a nível da Igreja universal e, portanto, um pouco para todos nós, o de aprendermos a olhar e entender esta mensagem assim tão preciosa que nos vem das igrejas da Ásia, da sua história e do seu testemunho de fé. As viagens do Papa têm também este grande valor para todos os fiéis do mundo. Em particular, esta Igreja coreana tem estes dois aspectos que nos últimos dias foram recordados muitas várias vezes: o ter sido originada por leigos do lugar, por tanto não por missionários estrangeiros, e o de ter uma grande história de martírio. Portanto, esta fé nascida assim, da escuta da Palavra de Deus, foi de tal maneira forte que conseguiu superar as perseguições mais horríveis, durante dezenas e dezenas de anos, por mais de um século. Isto faz uma grande impressão a quem pelo contrário vive a fé porventura em situações mais fáceis, não assim provadas. As Igrejas da Ásia, na sua maior parte, com excepção das Filipinas, são Igrejas Católicas de minoria no seu país. Também a fé cristã é minoritária. A minoria tem sempre este carácter de uma profundidade de convicção, de uma prova da convicção pessoal, que é examinada com mais profundidade, com mais seriedade e dificuldade que quando se está em condição de maioria. Mas para além deste aspecto da minoria, eu gostaria pelo contrário de ressaltar precisamente este aspecto da inculturação, que me parece muito significativo e é testemunhado pela Igreja coreana de uma forma única, porque temos a recepção do Evangelho e dos seus valores e da sua novidade e da sua linguagem a cada pessoa não por mensageiros que vêm de fora para te trazer uma mensagem, que se originou noutros lugares, mas que nasce da reflexão profunda, pessoal, de leigos coreanos que descobriram, eles, pela sua paixão de procurar a verdade, o valor da mensagem evangélica.
Assim, este é o tema mais forte na minha opinião para poder dizer que a linguagem evangélica entra nos diversos povos e nas várias culturas como algo que lhes pode falar a partir de dentro, que não é "colado" a partir de fora, que não é superficialmente acrescentado, mas entra numa síntese vital com a alma, a sensibilidade e a cultura dos povos. Portanto, este é um aspecto muito importante, no que diz respeito à evangelização da Ásia e também nos dá critérios para compreender, como diz o Papa, que a grande evangelização que nós desejamos para este imenso continente, nasce de uma empatia, ou seja, nasce de um conhecimento do evangelho que não é um acréscimo, algo de estranho, mas que se funde profundamente com a alma de quem o recebe, entrando mais fundo. E isto diz também a nossa convicção de que é o Senhor que trabalha e que dá a graça e que a pode dar no mais profundo do coração, onde só Ele é consegue chegar e onde pelo contrário as palavras dos homens não conseguem penetrar: um trabalho, portanto, de Deus, um trabalho da graça, um trabalho nas camadas mais profundas da alma humana. O facto do nascimento da Igreja Coreana, como ela teve lugar, parece-me que testemunha isso e nos dá também uma orientação e uma direcção sobre como continuar a trabalhar e a rezar pela evangelização da Ásia.

Durante a viagem à Coreia poderíamos dizer, como testemunham aliás os muitos Tweet, que o papa Francisco nunca esqueceu a tragédia que o Iraque está a passar …

Certamente. E isto o testemunhou em particular com um gesto muito simples, mas absolutamente seu e espontâneo, isto é, quando acrescentou, ao final da oração dos fiéis durante a missa de encerramento, uma oração pela missão do cardeal Filoni no Iraque, pela situação no Iraque. Soube que quando os nossos colegas da Rádio disseram isso ao Cardeal Filoni numa entrevista, ele ainda não sabia e que ficou muito felizmente impressionado. Isto diz da profunda sintonia com a qual o Papa se move com todas as dimensões da Igreja, em particular as de sofrimento e dificuldades. Além disso, precisamente na Coreia, a presença do tema "perseguição", "sofrimento", "dificuldades da Igreja", tanto na história como hoje, foi extremamente presente. E o Iraque é um lugar onde se vive hoje este tema de uma maneira dramática, mesmo que não seja o único. Certamente é, porém, um lugar onde a nossa atenção é concentrada e, portanto, o Papa certamente nunca o esqueceu e sempre o manteve presente: informou-se dia após dia sobre a missão do cardeal Filoni e continua a procurar as vias. Na conversa final no avião, até mesmo disse de ter considerado a possibilidade de uma passagem sua, pessoal, por Curdistão que, aliás, até agora ainda não se verificou mas que, contudo, diz de uma atitude de presença, não apenas teórica, não apenas distante com o pensamento, mas verdadeiramente com todo o seu coração.








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