2014-07-14 10:06:51

Colaboração das religiosas na criação do CEBAM - Irmã Lucie Nzenzili Mboma


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Dando continuidade à nossa conversa com a irmã Lucie Nzenzili Mboma, Missionária Franciscana de Maria, natural da República Democrática do Congo, vamos aqui ver a colaboração que deu na criação, nos anos 80, do CEBAM, Centro Bíblico África Madagáscar, e a sua visão da forma como a questão da mulher é tratada na Exortação Apostólica pós-Sinodal, “Áfricae Munus”.

Religiosa desde há 50 anos, a irmã Lucie já nos falou do que mais a tocou neste amplo período de vida consagrada, considerando que a “vida contemplativa a torna fecunda, uma fecundidade que ela entende no sentido de serviço ao outro, com espírito aberto, exactamente como recomendava o Papa Francisco às religiosas (no encontro com as Superioras Gerais) pedindo-lhes para não serem “solteironas”, mas sim fecundas.

Nas conversas anteriores, a irmã Lucie falou-nos também do papel das religiosas e dos leigos na Igreja, especialmente na República Democrática do Congo, pondo em relevo o impulso positivo dado neste sentido pelo falecido Cardeal Malula. A irmã Lucie exaltou também o papel dos “Mukambi”, leigos encarregados da gestão de paróquias e das suas esposas que não só os apoiam, mas têm tarefas próprias na paróquia.

Oiça então a terceira parte da conversa com ela na rubrica "África.Vozes Femininas"

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“Deus quer salvar a África” – dizia o Papa João Paulo II ao anunciar a convocação do primeiro Sínodo dos Bispos para a África sobre o tema da Evangelização, Sínodo que teve lugar em Abril de 1994 no Vaticano. O objectivo era reflectir sobre a missão evangelizadora da Igreja em África no limiar do terceiro milénio.

O tema da evangelização – explicara o agora Santo Papa João Paulo II – inscreve-se no âmbito da preparação geral da Igreja para o Grande Jubileu do Ano 2000, mas também na convicção de que “Deus quer salvar a África” e que a Igreja deve continuar a sua obra de bom samaritano nesse continente a braços com numerosos problemas.

Com aquele Sínodo, o Papa Wojtyla queria, portanto, dar uma nova esperança à África, reforçando a comunhão entre os membros da Igreja no continente e promover uma solidariedade pastoral orgânica em todo o seu território e as suas ilhas para tornar essa obra samaritana mais eficaz e susceptível de levar os africanos a uma vida mais digna em todos os aspectos.

É que o Evangelho indica o caminho a seguir, põe em relevo os valores positivos do continente, enraíza-se neles, transformando os corações das pessoas e a sociedade. Mas, não obstante o progresso registado na evangelização da África, milhões de africanos não conhecem ainda a mensagem de Cristo. A Evangelização é, portanto, uma urgência. Mas para a realizar plenamente é necessário ter presente toda a sociedade africana e ultrapassar muitos desafios, que o Sínodo levou em consideração sob quatro pontos de vista: inculturação, diálogo, meios de comunicação, justiça e paz. O resultado foi o empenho de fazer da Igreja em África, uma “Igreja Família de Deus”, ou seja uma Igreja atenta à problemáticas de todos os seus filhos e filhas, tal como acontece no âmbito de uma família sã.

A tarefa não é fácil e requer muito empenho, vontade e comunhão. Mas uma coisa é certa e constitui um forte encorajamento: os africanos têm sede e fome de Deus. Deram prova disto no passado, acolhendo com entusiasmo a palavra de Deus e dando, posteriormente, à Igreja universal importantes figuras de Papas, Santos, Mártires.

Mas para fazer com que a Palavra de Deus seja conhecida, amada, meditada, conservada no coração dos fieis, é necessário intensificar os esforços para facilitar o acesso à Sagrada Escritura – escrevia o P. João Paulo II na Exortação pós-Sinodal, “Ecclesia in África”. E exortava a Igreja em África a favorecer o apostolado bíblico no continente com a ajuda do Centro Bíblico para a África e Madagáscar – CEBAM, e outras estruturas semelhantes.

O CEBAM é, com efeito, o organismo do SCEAM (Simpósio das Conferências Episcopais da África e Madagáscar) encarregado do Apostolado Bíblico em África a nível cientifico e pastoral, dando particular atenção à difusão da Sagrada Escritura. Foi criado em Julho de 1981, assumindo assim a tarefa que, a pedido do SCEAM, a Federação Católica Mundial do Apostolado Bíblico, com sede na Alemanha, vinha desenvolvendo em África desde 1978.

No lançamento dos alicerces do CEBAM estiveram envolvidas diversas religiosas entre as quais a irmã Lucie Nzenzili Mboma, Franciscana Missionária de Maria. Estavam na altura em Nairobi, no Quénia. Só mais tarde é que a CEBAM seria transferido para Acra, no Gana, onde está a sede do SCEAM:

Quando chegamos, o que era mais importante era antes de mais criar o escritório e ver como se ia proceder para elaborar uma revista que seria um reflexo desse início do Centro Bíblico. Então era preciso também ler muito, encontrar artigos escritos por biblistas ou teólogos para poder editar um boletim, encontrar recursos para imprimir e enviar. E era o Padre Amewowo que se ocupava disso e nós as irmãs estávamos lá ao serviço de tudo isso. Éramos cinco religiosas da minha congregação e uma leiga.”

Donde vinha o impulso para tudo isso?

Posso dizer que o facto de ter lançado a revista bíblica era um grande contributo porque era isso que o SCEAM queria: fazer algo de material para ajudar, criar um centro de documentação, e acho que foi realmente um sucesso da parte do Padre
Amewowo. E sendo ele um biblista, uma pessoa muito competente… acabamos também por criar, de algum modo, uma biblioteca… Eu não fiquei lá muito tempo - comecei em 84 e em 86 tive de deixar para ir fazer uma operação aos joelhos em França e fui então substituída por uma religiosa irlandesa. Continuou-se, então com as irmãs até ao momento em que o escritório foi transferido para Acra, no Gana.”
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Irmã Lucie uma última questão: como sabe há a exortação que foi publicada pelo Papa Bento XVI, na sequencia do II Sínodo dos Bispos para a África, realizado no Vaticano em 2009. Essa Exortação publicada em 2011 intitula-se “Áfricae Munus”, isto é o "Empenho da África", entendendo com isso o empenho da Igreja em África na promoção da reconciliação, justiça e paz no continente. “Africae Munus” fala entre outras coisas, do papel da mulher em África e parece-nos que o SCEAM prometeu fazer algo, como base nessa exortação, sobre a mulher, mas não sabemos a que ponto estão as coisas. De qualquer modo, o que gostaria, que o SCEAM fizesse pela mulher, religiosa ou leiga que seja em África?

Sabe, há uma muito bela… bem, agora já não me lembro muito bem mas quando Africae Munus saiu, eu conhecia os seus parágrafos de coro, mas agora… de qualquer modo é muito bonito o que foi nela escrito sobre o papel da mulher; o Papa Bento XVI encontrou essa bela expressão que diz “A África é o pulmão espiritual do mundo”. E eu diria que em África, a mulher é verdadeiramente esse pulmão, é o coração, o pulmão que dá a vida, um sopro novo na vida da Igreja.

Eu gostei muito desse parágrafo de Africae Munus, não sei se é o n. 38 ou não que falava do papel da mulher e que diz: sem a mulher o que seria da Igreja hoje?!
Está, portanto, escrito no papel, mas de que forma se dá espaço à mulher para que possa verdadeiramente preencher esse papel na Igreja?! Eu digo sempre que no meu país, na Igreja do meu país - não posso falar de toda a África porque como se costuma dizer a África não é uma aldeia - mas no meu país a mulher tem desempenhado um papel importante na vida da Igreja. A um dado momento vivíamos na Paróquia São Michel de Bandalungwa e as pessoas apreciavam o sermão feito por uma das irmãs da nossa Congregação. Nessa altura o Cardeal Malula dizia para “bombardearmos” as nossas grandes paróquias e irmos em direcção ao povo. Era então necessário preparar o povo, nutri-lo com a palavra de Deus e essa alimentação não é feita por uma única pessoa. E nessa paróquia, onde estávamos tão bem integradas, as responsabilidades eram partilhadas. A maior responsabilidade, a meu ver, era o sermão do domingo e uma das nossas irmãs fazia isso e as pessoas apreciavam muito. Pode-se dizer que é porque não havia padres, não! Havia padres missionários lá. É que eram muito abertos e seguiam aquilo que o Cardeal Malula gostaria que a Igreja fosse e o lugar que a mulher devia ter nela.

Ainda hoje no meu país, as mulheres congolesas apreciam o papel das religiosas e do padre ao ponto de haver um grupo chamado “Bamama Bamibonza”, que literalmente significa “As mamãs dos consagrados a Deus” e o papel dessas mamãs é o de apoiar socialmente com meios materiais, fazendo uso do seu tempo e mostrando capacidade de sacrifício, para nos acompanhar (religiosas, religiosos e padres), a fim de que possamos realmente desempenhar o nosso papel nas melhores condições possíveis. Acho que isto é muito importante para o papel da mulher na Igreja.

Actualmente, na Igreja em Kinshasa temos diversos grupos de “Mamãs”: legionárias, catequistas… em vários sectores, são muito activas, jogam um papel muito importante na pastoral. Há uma irmã da minha Congregação que já faleceu, mas que dedicou toda a sua vida à formação de leigos na Igreja em Kinshasa, o que quer dizer que o Cardeal Malula e os que vieram depois dele, deixaram-lhe fazer esse trabalho. E acho que a formação dos leigos é algo vital para a vida da Igreja, porque os leigos quando assumem responsabilidades a Igreja torna-se verdadeiramente viva.”

Foto: A imrã Lucie no escritório do SEDOS (Centro de Documentação sobre a Missionação) com sede em Roma e de que ela é Directora Executiva.








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