A mensagem do Papa Francisco para o Dia Mundial das Missões 2014
Cidade do Vaticano (RV) – Foi divulgada neste sábado, 14, a mensagem do Papa
Francisco para o Dia Mundial das Missões 2014, a ser celebrado em 19 de outubro. A
mensagem havia sido publicada no domingo 8 de Junho, Festa de Pentecostes.
As
origens deste Dia remontam a 1926, quando a Obra para a Propagação da Fé, por sugestão
do Círculo missionário do Seminário de Sassari, propôs ao Papa Pio XI para proclamar
um Dia anual em favor da actividade missionária da Igreja universal. O pedido foi
acolhido favoravelmente e, no ano seguinte (1927), foi celebrado o primeiro "Dia Mundial
das Missões para a propagação da fé", e foi estabelecido que tal celebração tivesse
lugar no penúltimo domingo de Outubro de cada ano, tradicionalmente reconhecido como
o mês missionário por excelência.
Eis a mensagem na íntegra:
“Queridos
irmãos e irmãs!
Ainda hoje há tanta gente que não conhece Jesus Cristo. Por
isso, continua a revestir-se de grande urgência a missão ad gentes, na qual são chamados
a participar todos os membros da Igreja, pois esta é, por sua natureza, missionária:
a Igreja nasceu «em saída». O Dia Mundial das Missões é um momento privilegiado para
os fiéis dos vários Continentes se empenharem, com a oração e gestos concretos de
solidariedade, no apoio às Igrejas jovens dos territórios de missão. Trata-se de uma
ocorrência permeada de graça e alegria: de graça, porque o Espírito Santo, enviado
pelo Pai, dá sabedoria e fortaleza a quantos são dóceis à sua acção; de alegria, porque
Jesus Cristo, Filho do Pai, enviado a evangelizar o mundo, sustenta e acompanha a
nossa obra missionária. E, justamente sobre a alegria de Jesus e dos discípulos missionários,
quero propor um ícone bíblico que encontramos no Evangelho de Lucas (cf. 10, 21-23).
1.
Narra o evangelista que o Senhor enviou, dois a dois, os setenta e dois discípulos
a anunciar, nas cidades e aldeias, que o Reino de Deus estava próximo, preparando
assim as pessoas para o encontro com Jesus. Cumprida esta missão de anúncio, os discípulos
regressaram cheios de alegria: a alegria é um traço dominante desta primeira e inesquecível
experiência missionária. O Mestre divino disse-lhes: «Não vos alegreis, porque os
espíritos vos obedecem; alegrai-vos, antes, por estarem os vossos nomes escritos no
Céu. Nesse mesmo instante, Jesus estremeceu de alegria sob a acção do Espírito Santo
e disse: “Bendigo-te, ó Pai (…)”. Voltando-se, depois, para os discípulos, disse-lhes
em particular: “Felizes os olhos que vêem o que estais a ver”» (Lc 10, 20-21.23).
As
cenas apresentadas por Lucas são três: primeiro, Jesus falou aos discípulos, depois
dirigiu-Se ao Pai, para voltar de novo a falar com eles. Jesus quer tornar os discípulos
participantes da sua alegria, que era diferente e superior àquela que tinham acabado
de experimentar.
2. Os discípulos estavam cheios de alegria, entusiasmados
com o poder de libertar as pessoas dos demónios. Jesus, porém, recomendou-lhes que
não se alegrassem tanto pelo poder recebido, como sobretudo pelo amor alcançado, ou
seja, «por estarem os vossos nomes escritos no Céu» (Lc 10, 20). Com efeito, fora-lhes
concedida a experiência do amor de Deus e também a possibilidade de o partilhar. E
esta experiência dos discípulos é motivo de jubilosa gratidão para o coração de Jesus.
Lucas viu este júbilo numa perspectiva de comunhão trinitária: «Jesus estremeceu de
alegria sob a acção do Espírito Santo», dirigindo-Se ao Pai e bendizendo-O. Este momento
de íntimo júbilo brota do amor profundo que Jesus sente como Filho por seu Pai, Senhor
do Céu e da Terra, que escondeu estas coisas aos sábios e aos inteligentes e as revelou
aos pequeninos (cf. Lc 10, 21). Deus escondeu e revelou, mas, nesta oração de louvor,
é sobretudo a revelação que se põe em realce. Que foi que Deus revelou e escondeu?
Os mistérios do seu Reino, a consolidação da soberania divina de Jesus e a vitória
sobre satanás.
Deus escondeu tudo isto àqueles que se sentem demasiado cheios
de si e pretendem saber já tudo. De certo modo, estão cegos pela própria presunção
e não deixam espaço a Deus. Pode-se facilmente pensar em alguns contemporâneos de
Jesus que Ele várias vezes advertiu, mas trata-se de um perigo que perdura sempre
e tem a ver connosco também. Ao passo que os «pequeninos» são os humildes, os simples,
os pobres, os marginalizados, os que não têm voz, os cansados e oprimidos, que Jesus
declarou «felizes». Pode-se facilmente pensar em Maria, em José, nos pescadores da
Galileia e nos discípulos chamados ao longo da estrada durante a sua pregação.
3.
«Sim, Pai, porque assim foi do teu agrado» (Lc 10, 21). Esta frase de Jesus deve ser
entendida como referida à sua exultação interior, querendo «o teu agrado» significar
o plano salvífico e benevolente do Pai para com os homens. No contexto desta bondade
divina, Jesus exultou, porque o Pai decidiu amar os homens com o mesmo amor que tem
pelo Filho. Além disso, Lucas faz-nos pensar numa exultação idêntica: a de Maria.
«A minha alma glorifica o Senhor e o meu espírito se alegra em Deus, meu Salvador»
(Lc 1, 46-47). Estamos perante a boa Notícia que conduz à salvação. Levando no seu
ventre Jesus, o Evangelizador por excelência, Maria encontrou Isabel e exultou de
alegria no Espírito Santo, cantando o Magnificat. Jesus, ao ver o bom êxito da missão
dos seus discípulos e, consequentemente, a sua alegria, exultou no Espírito Santo
e dirigiu-Se a seu Pai em oração. Em ambos os casos, trata-se de uma alegria pela
salvação em acto, porque o amor com que o Pai ama o Filho chega até nós e, por obra
do Espírito Santo, envolve-nos e faz-nos entrar na vida trinitária.
O Pai
é a fonte da alegria. O Filho é a sua manifestação, e o Espírito Santo o animador.
Imediatamente depois de ter louvado o Pai – como diz o evangelista Mateus – Jesus
convida-nos: «Vinde a Mim, todos os que estais cansados e oprimidos, que Eu hei-de
aliviar-vos. Tomai sobre vós o meu jugo e aprendei de Mim, porque sou manso e humilde
de coração e encontrareis descanso para o vosso espírito. Pois o meu jugo é suave
e o meu fardo é leve» (Mt 11, 28-30). «A alegria do Evangelho enche o coração e a
vida inteira daqueles que se encontram com Jesus. Quantos se deixam salvar por Ele
são libertados do pecado, da tristeza, do vazio interior, do isolamento. Com Jesus
Cristo, renasce sem cessar a alegria» (Exort. ap. Evangelii gaudium, 1).
De
tal encontro com Jesus, a Virgem Maria teve uma experiência totalmente singular e
tornou-se «causa nostrae laetitiae». Os discípulos, por sua vez, receberam a chamada
para estar com Jesus e ser enviados por Ele a evangelizar (cf. Mc 3, 14), e, feito
isso, sentem-se repletos de alegria. Porque não entramos também nós nesta torrente
de alegria?
4. «O grande risco do mundo actual, com a sua múltipla e avassaladora
oferta de consumo, é uma tristeza individualista que brota do coração comodista e
mesquinho, da busca desordenada de prazeres superficiais, da consciência isolada»
(Exort. ap. Evangelii gaudium, 2). Por isso, a humanidade tem grande necessidade de
dessedentar-se na salvação trazida por Cristo. Os discípulos são aqueles que se deixam
conquistar mais e mais pelo amor de Jesus e marcar pelo fogo da paixão pelo Reino
de Deus, para serem portadores da alegria do Evangelho. Todos os discípulos do Senhor
são chamados a alimentar a alegria da evangelização. Os bispos, como primeiros responsáveis
do anúncio, têm o dever de incentivar a unidade da Igreja local à volta do compromisso
missionário, tendo em conta que a alegria de comunicar Jesus Cristo se exprime tanto
na preocupação de O anunciar nos lugares mais remotos como na saída constante para
as periferias de seu próprio território, onde há mais gente pobre à espera.
Em
muitas regiões, escasseiam as vocações ao sacerdócio e à vida consagrada. Com frequência,
isso fica-se a dever à falta de um fervor apostólico contagioso nas comunidades, o
que faz com as mesmas sejam pobres de entusiasmo e não suscitem fascínio. A alegria
do Evangelho brota do encontro com Cristo e da partilha com os pobres. Por isso, encorajo
as comunidades paroquiais, as associações e os grupos a viverem uma intensa vida fraterna,
fundada no amor a Jesus e atenta às necessidades dos mais carecidos. Onde há alegria,
fervor, ânsia de levar Cristo aos outros, surgem vocações genuínas, nomeadamente as
vocações laicais à missão. Na realidade, aumentou a consciência da identidade e missão
dos fiéis leigos na Igreja, bem como a noção de que eles são chamados a assumir um
papel cada vez mais relevante na difusão do Evangelho. Por isso, é importante uma
adequada formação deles, tendo em vista uma acção apostólica eficaz.
5. «Deus
ama quem dá com alegria» (2 Cor 9, 7). O Dia Mundial das Missões é também um momento
propício para reavivar o desejo e o dever moral de participar jubilosamente na missão
ad gentes. A contribuição monetária pessoal é sinal de uma oblação de si mesmo, primeiramente
ao Senhor e depois aos irmãos, para que a própria oferta material se torne instrumento
de evangelização de uma humanidade edificada no amor.
Queridos irmãos e irmãs,
neste Dia Mundial das Missões, dirijo o meu pensamento a todas as Igrejas locais:
Não nos deixemos roubar a alegria da evangelização! Convido-vos a mergulhar na alegria
do Evangelho e a alimentar um amor capaz de iluminar a vossa vocação e missão. Exorto-vos
a recordar, numa espécie de peregrinação interior, aquele «primeiro amor» com que
o Senhor Jesus Cristo incendiou o coração de cada um; recordá-lo, não por um sentimento
de nostalgia, mas para perseverar na alegria. O discípulo do Senhor persevera na alegria,
quando está com Ele, quando faz a sua vontade, quando partilha a fé, a esperança e
a caridade evangélica.
A Maria, modelo de uma evangelização humilde e jubilosa,
elevemos a nossa oração, para que a Igreja se torne uma casa para muitos, uma mãe
para todos os povos e possibilite o nascimento de um mundo novo”.
Vaticano,
8 de Junho – Solenidade de Pentecostes – de 2014. Papa Francesco