Rio de Janeiro (RV) - Vários autores explicam o nome carnaval a partir do latim
“ carne vale”, isto é, “adeus carne” ou a “despedida da carne”. Isso significa que,
no carnaval, o consumo de carne era considerado lícito, pela última vez, antes dos
dias de jejum quaresmal. Outros estudiosos recorrem à expressão “carnem levare”, suspender
ou retirar a carne.
O Papa São Gregório Magno (590-604), teria dado ao último
domingo, antes da Quaresma (antigamente domingo da quinquagésima), o título de “domenica
ad carnes levandas”; o que teria gerado “carneval” ou carnaval. Um grupo de etimologistas
apela para as origens pagãs do carnaval: entre os gregos e os romanos, costumava-se
fazer um cortejo com uma nave dedicado ao deus Dionísio, ou baco, festa que se chamava
em latim de “currus navalis” (nave carruagem), de onde teria vindo a forma “carnavale”.
As mais antigas notícias do que hoje chamamos “Carnaval” datam, como se crê,
do século VI a.C.; na Grécia: há pinturas gregas em vasos com figuras ano mascaradas
desfilando em procissão ao som de músicas em honra do deus Dionísio, com fantasias
e alegorias; são certamente anteriores à era cristã. Outras festas semelhantes aconteciam
na entrada do novo civil (mês de janeiro) ou pela aproximação da primavera (hemisfério
norte), na despedida do inverno.
Eram festas religiosas dentro da concepção
pagã e da mitologia com a intenção de, com esses ritos, expiar as faltas cometidas
no inverno ou no ano anterior e pedir aos deuses a fecundidade da terra e a prosperidade
para a primavera e o novo ano. Tudo isso parece ter gerado abusos estimulados com
o uso de máscaras, fantasias, cortejos, peças de teatro, etc. As religiões ditas de
“mistérios” provenientes do Oriente, muito difundidas no Império Romano, concorreram
para o fomento das festividades carnavalescas. Estas tomaram o nome de “pompas bacanais”
ou “saturnais” ou “lupercais”.
Quando o Cristianismo surgiu já deve ter encontrado
esses costumes pagãos. Vivenciando o Evangelho os cristãos aos poucos transformaram
o significado de muitas festas pagãs ou míticas procurando purifica-las. Aos poucos
essas festas foram sendo substituídas por solenidades do Cristianismo (Natal, Epifania
do Senhor ou a Purificação de Maria, dita “festa da Candelária”, em vez dos mitos
pagãos celebrados a 25 de dezembro, 6 de janeiro ou 2 de fevereiro). Por fim, a tradição
da Igreja parece ter conseguido restringir a celebração oficial do Carnaval aos três
dias que precedem a quarta-feira de cinzas. Hoje, infelizmente nem sempre acontece
isso em nossa sociedade.
Em Portugal o carnaval era festa da alegria onde as
pessoas jogavam uma nas outras, água, ovos e farinha. Acontecia num período anterior
a quaresma e, portanto, tinha um significado ligado à liberdade. Este sentido permanece
até os dias de hoje no carnaval.
No Brasil, no final do século XIX, começam
a aparecer os primeiros blocos carnavalescos, cordões e os famosos “corsos”. Estes
últimos tornaram-se mais populares no começo dos séculos XX. As pessoas se fantasiavam,
decoravam seus carros e, em grupos, desfilavam pelas ruas das cidades. Estaria aí
a origem dos carros alegóricos, típicos das escolas de samba atuais.
No século
XX, o carnaval foi crescendo e tornando-se cada vez mais uma festa popular. Esse crescimento
ocorreu com a ajuda das marchinhas carnavalescas. A primeira escola de samba, segundo
algumas tradições, surgiu no Rio de Janeiro e chamava-se “Deixa Falar”. Foi criada
pelo sambista carioca chamado Ismael Silva. Anos mais tarde a “deixa Falar”, segundo
consta, transformou-se na escola de samba “Estácio de Sá”. A partir daí o carnaval
de rua começa a ganhar um novo formato. Começam a surgir novas escolas de samba, começam
os primeiros campeonatos para verificar qual escola de samba era mais bonita e animada.
Portanto,
o carnaval é uma festividade complexa e com muitas nuances e prismas. Porém, infelizmente,
como acontece com todas as coisas também temos exageros e violências em vários campos
que lamentamos e exortamos para que a vida humana seja sempre respeitada. Seria muito
importante que as pessoas pudessem se reunir para divertir de maneira sadia e com
um espírito de amor ao próximo. Neste período de Carnaval a Igreja incentiva os retiros
espirituais. Aqui em nossa arquidiocese são incontáveis. Pelo menos uns 30 reúnem
um número significativo de pessoas que passam esses dias na alegria cristã e na reflexão
preparando-se para uma santa quaresma. Mesmo nesses ambientes de retiro existe um
momento de folguedo cristão mais animado demonstrando que não somos contra a “verdadeira
alegria” brotada do Evangelho e que precisa contagiar a todos com a “boa notícia”
da salvação.
Nessa “despedida da carne” é importante que nos preparemos para
um tempo de verdadeira conversão. Nessas idas e vindas dos costumes como vimos acima
não podemos perder de vista a necessidade de sermos pessoas novas que vivam com responsabilidade
este tempo de tantas mudanças e transformações.
Nesse mundo violento e complexo,
aonde os valores humanos e cristãos vão sendo esquecidos, é sempre uma oportunidade
de reflexão séria sobre os direcionamentos que estamos ando as nossas vidas e a nossa
sociedade. Somente deixando-nos conduzir por corações novos que homens novos poderão
construir uma sociedade justa e fraterna.
† Orani João, Cardeal Tempesta,
O. Cist. Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ