Cidade do Vaticano (RV) - Certa vez conversando
com Dom Moacyr Grechi, Arcebispo emérito de Porto Velho, ele me disse que aquela terra
onde vivia, a terra da Amazônia, tem um rosto próprio, seja do ponto de vista geográfico,
seja do ponto de vista humano. Ele fez várias considerações sobre essa parte do Brasil,
que para a maioria dos brasileiros é totalmente desconhecida; ali está a maior concentração
de povos indígenas do país, os chamados, “povos da floresta”; temos distâncias enormes;
a migração de vários Estados transformou a região; antes era uma região prevalentemente
de pessoas nordestinas ou pessoas com características indígenas. Hoje a maioria da
população é de origem italiana, alemã e polonesa, com sua vivência eclesial também
marcada pela experiência do Sul. Outro aspecto, mais ligado ao sociológico, econômico
e político: em 1970 houve a invasão, por parte dos grandes proprietários, da região.
Milhões de hectares ficaram concentrados nas mãos de poucos e os camponeses foram
obrigados a buscar terras distantes. Para finalizar o quadro de Dom Moacyr, no âmbio
da Igreja, um clero na sua maioria religioso e estrangeiro, e uma história eclesial
recente. Percebe-se uma Igreja que nasce agora, com tudo aquilo que significa de esperança
e beleza, mas também de fragilidade.
Nos próximos dias será realizado em Manaus,
entre os dias 28 e 31 de outubro o 1º Encontro da Igreja Católica na Amazônia Legal,
promovido pela Comissão Episcopal para a Amazônia da CNBB, cujo Presidente é Cardeal
Dom Cláudio Hummes. O objetivo é discutir a realidade político-social, econômica,
cultural e religiosa da Amazônia Legal, bem como a contribuição da Igreja Católica
para a promoção e defesa da vida dos habitantes dessa Região e de sua rica biodiversidade.
A
história da Igreja na Amazônia foi escrita, sobretudo, por missionários estrangeiros,
que há 5 séculos estão ali com os povos daquela região. Os missionários, diversamente
de turistas ou benfeitores de passagem, ficaram com eles; com infinita paciência,
ajudaram-nos no difícil processo de se manterem senhores de sua identidade, mas também
a se abrirem ao mundo diverso que vinha ao seu encontro.
A Amazônia sempre
esteve no coração da Igreja e dos Papas: basta recordar o carinho do Beato João Paulo
II por aquela terra, e a demonstração de afeto de Bento XVI, quando da sua visita
ao Brasil em 2007, fez uma doação em dinheiro para ajudar a missão Amazônia. Já o
Papa Francisco durante o encontro com os bispos brasileiros no Rio de Janeiro, no
dia 27 de julho último, durante a JMJ pediu que a Igreja Católica reforce a sua ação
missionária à imagem do que faz na Amazônia, falando desta região como “teste decisivo”
para a Igreja e a sociedade brasileiras.
“A Igreja está na Amazônia, não como
aqueles que têm as malas na mão para partir depois de terem explorado tudo o que puderam;
ela está presente com missionários, congregações religiosas, e ali continua ainda
presente e determinante no futuro daquela área”, disse Francisco. No desafio pastoral
que representa a Amazônia, - disse então o Papa Francisco - não posso deixar de agradecer
o que a Igreja no Brasil está fazendo. A Comissão Episcopal para a Amazônia, criada
em 1997, já deu muitos frutos e tantas dioceses responderam pronta e generosamente
ao pedido de solidariedade, enviando missionários, leigos e sacerdotes. A criação
dessa Comissão foi uma resposta aos apelos históricos do povo de Deus de rosto indígena,
ribeirinho e caboclo. Ela representa o amadurecimento de iniciativas missionárias
realizadas, ao longo dos anos, por um bom número de dioceses do Brasil através do
programa Igrejas-Irmãs. Esta importante iniciativa surgiu em 1972, após uma visita
à Amazônia de D. Aloísio Lorscheider, então presidente da CNBB.
“A evangelização
missionária não pode ser exclusivamente de institutos e organismos, mas tem de envolver
toda a Igreja, afirma Dom Erwin Kraütler, Bispo de Xingu. O sujeito da missão é a
própria Igreja”...
A presença da Igreja, de seus bispos, sacerdotes, missionários
e leigos é a certeza de que há esperança de futuro, há esperança de uma vida melhor.
A Igreja tem um papel fundamental na Amazônia. O Encontro dos próximos dias é a confirmação
disso, da sua atenção por essa terra e pelo povo que ali vive.
Já o Papa João
Paulo II dizia: “Uma Igreja fechada sobre si mesma, sem abertura missionária, é Igreja
incompleta ou está doente”. Esse é o chamado para olharmos para uma Igreja viva e
atuante que caminha ao lado do Povo de Deus.
Berço de grandes contradições,
a Amazônia, vastidão enorme de terra ao lado de um grande número de pessoas deserdadas
da terra, é uma realidade repleta de desafios para a Igreja e para a sociedade brasileira.
Esse povo, marcado pela pobreza, pelo esquecimento político e institucional, pela
exploração, grita pedindo, não socorro, mas direito de existir, de ser respeitado,
de viver uma vida digna, de ser conhecido. (Silvonei José)