Pastorais da Terra e do Campo convidam Papa a conhecer realidade rural brasileira
Balsas (RV) - A Comissão Pastoral da Terra (CPT), junto com as Pastorais do
Campo, como Conselho Indigenista Missionário (CIMI), Conselho Pastoral dos Pescadores
(CPP), Serviço Pastoral do Migrante (SPM) e Pastoral da Juventude Rural (PJR), enviaram,
através de Dom Enemésio Lazzaris, presidente da CPT, Carta ao Papa Francisco convidando-o
para conhecer a realidade das comunidades rurais no Brasil.
O documento assinado
por Dom Enemésio salienta a postura simples do novo Papa, e as recorrentes falas de
aproximação da Igreja aos pobres. Da mesma forma, apresenta o trabalho das Pastorais
do Campo, que ouvem os clamores desses povos e suas lutas cotidianas pela garantia
de seus direitos e pela permanência na terra.
A Carta destaca que a regularização
dos territórios tradicionalmente ocupados e da tão sonhada reforma agrária, ainda
são assuntos intermitentes na pauta governamental. Ao mesmo tempo, as Pastorais demonstram
esperança de que um dia o Papa possa visitar essas comunidades, dando uma demonstração
concreta do compromisso da Igreja, conforme Jesus, com os pobres na terra.
Confira
o documento:
Caríssimo Irmão Francisco,
Como é bom nos dirigir ao senhor
chamando-o simplesmente de irmão, sem qualquer outro título que o distancie do projeto
de Jesus. Sentimo-nos muito próximos do senhor por esta sua postura simples e sonhamos
com um dia a Igreja se ver totalmente livre, simples e pobre como Jesus de Nazaré,
ao lado dos pobres com tantos rostos e nomes. Queremos saudar sua presença no Brasil
na Jornada Mundial da Juventude.
Quem somos nós? Somos um conjunto de pastorais
da Igreja que atuam junto aos homens e mulheres do campo e das águas: o Conselho Indigenista
Missionário (CIMI), que atua junto aos povos indígenas de todo o Brasil; a Comissão
Pastoral da Terra, CPT, que tem sua atuação junto às diversas categorias de camponeses
e camponesas, junto aos trabalhadores e trabalhadoras sem-terra, aos pequenos agricultores
familiares, às comunidades quilombolas (comunidades remanescentes formadas por afrodescendentes
fugidos da escravidão) e junto aos trabalhadores que acabam submetidos a condições
análogas ao trabalho escravo; o Conselho Pastoral dos Pescadores, CPP, que tem como
objetivo ser presença de gratuidade evangélica no meio dos pescadores e pescadoras
artesanais, estimulando suas organizações para a preservação do meio ambiente e a
permanência em seus territórios tradicionais; o Serviço Pastoral dos Migrantes, SPM,
que desenvolve sua ação junto às famílias que constantemente migram em busca de melhores
condições de vida, ou de pessoas que todos os anos procuram em outras regiões, longe
de suas casas, trabalhos temporários; a Pastoral da Juventude Rural, PJR, que atua
com os jovens camponeses.
Neste serviço solidário, ouvimos todos os dias os
gemidos de dor e angústia de milhares de famílias que foram ou ainda são espoliadas
de suas terras, de seus meios de subsistência e de sua cultura, que são discriminadas
e invisibilizadas. Os direitos destes povos, comunidades e famílias são constantemente
negados para abrir espaço ao avanço de empresas e empreendimentos capitalistas com
seus grandes projetos de “desenvolvimento” com construção de hidrelétricas, exploração
de minérios, monocultivos do agronegócio e outros que tudo querem transformar em mercadoria.
Quando
alguns direitos são reconhecidos, acabam não sendo respeitados. Para serem reconhecidos
é preciso percorrer um penoso e desgastante processo que se prolonga por décadas.
Isto acontece, sobretudo quando se trata do direito aos territórios dos povos indígenas,
das comunidades quilombolas, dos pescadores e ribeirinhos e de outras comunidades
tradicionais. Porém o reconhecimento e regularização destes territórios e a sonhada
Reforma Agrária continuam presentes na sua pauta.
Este trabalho evangélico
desenvolvido por bispos, padres, religiosos e religiosas e, sobretudo, por leigos
e leigas, sofre o ataque de diversos setores da sociedade, em especial daqueles que
se colocam como os únicos portadores de direitos, em particular do direito de propriedade
e dos que os apóiam. O mais angustiante, porém, é que esta incompreensão a encontramos
também em setores da própria Igreja e da parte de muitos bispos e padres que estão
mais ao lado dos que têm bens e poder, do que ao lado dos pobres.
Irmão Francisco,
cada vez que o ouvimos falar que a Igreja deve sair de dentro de suas estruturas e
estar ao lado dos pobres para ouvir seus clamores e sentir de perto seus sofrimentos,
nos sentimos apoiados e fortalecidos em nosso trabalho e em nossa Missão que é a missão
samaritana de ajudar a que os caídos se levantem e caminhem por si, a que os oprimidos
ergam a cabeça reconhecendo sua dignidade de filhos e filhas de Deus.
Gostaríamos
imensamente que um dia o senhor pudesse pessoalmente conhecer de perto a realidade
do povo das comunidades com as quais trabalhamos para dar-lhes uma palavra de incentivo
e afeto. Mas como no momento não é possível, gostaríamos que mesmo de longe envie
sua palavra de conforto para eles que sofrem a cada dia as violências e as ameaças
à vida e à dignidade humana.
Que o Senhor que é pai e mãe de todos abençoe
seu ministério à frente da Igreja e abençoe a todos e todas nós.
Dom Enemésio
Lazzaris Bispo de Balsas – MA Presidente da Comissão Pastoral da Terra (CPT)