Manter a esperança, deixar-se surpreender por Deus; viver na alegria: Papa Francisco
na homilia da Missa no santuário de Aparecida
O santuário de Nossa Senhora da Aparecida, padroeira do Brasil, está no centro das
atenções nesta quarta-feira, pela “peregrinação pessoal” que aí faz o Papa Francisco,
que deseja confiar à Virgem o seu pontificado e os jovens da JMJ e de todo o mundo.
O programa inicial previa que o Papa se deslocasse de helicóptero, mas devido à chuva
(foto, Papa à chegada ai santuário), foi decidido o uso do avião até ao aeroporto
mais próximo do santuário, sendo o percurso final percorrido de helicóptero. A
celebração teve início às 10h30 locais (15.30 em Roma), após um ato de veneração da
imagem de Nossa Senhora, do santuário. Esta peregrinação do Papa ao santuário da padroeira
do Brasil, que todos os anos acolhe milhões de peregrinos, sublinha uma ligação particular
do Papa Francisco a este santuário, onde decorreu a V Conferência Geral do Episcopado
Latino-americano e Caribenho, em 2007, na qual participou, como arcebispo de Buenos
Aires, o então cardeal Jorge Mario Bergoglio. Na sua homilia, o Papa propôs aos fiéis
"três simples posturas: conservar a esperança, deixar-se surpreender por Deus, viver
na alegria". Eis o texto integral da homilia: Venerados irmãos no episcopado
e no sacerdócio, Queridos irmãos e irmãs!
Quanta alegria me dá vir à casa da
Mãe de cada brasileiro, o Santuário de Nossa Senhora Aparecida. No dia seguinte à
minha eleição como Bispo de Roma fui visitar a Basílica de Santa Maria Maior, para
confiar a Nossa Senhora o meu ministério de Sucessor de Pedro. Hoje, eu quis vir aqui
para suplicar à Maria, nossa Mãe, o bom êxito da Jornada Mundial da Juventude e colocar
aos seus pés a vida do povo latino-americano. Queria dizer-lhes, primeiramente,
uma coisa. Neste Santuário, seis anos atrás, quando aqui se realizou a V Conferência
Geral do Episcopado da América Latina e do Caribe, pude dar-me conta pessoalmente
de um fato belíssimo: ver como os Bispos – que trabalharam sobre o tema do encontro
com Cristo, discipulado e missão – eram animados, acompanhados e, em certo sentido,
inspirados pelos milhares de peregrinos que vinham diariamente confiar a sua vida
a Nossa Senhora: aquela Conferência foi um grande momento de vida de Igreja. E, de
fato, pode-se dizer que o Documento de Aparecida nasceu justamente deste encontro
entre os trabalhos dos Pastores e a fé simples dos romeiros, sob a proteção maternal
de Maria. A Igreja, quando busca Cristo, bate sempre à casa da Mãe e pede: “Mostrai-nos
Jesus”. É de Maria que se aprende o verdadeiro discipulado. E, por isso, a Igreja
sai em missão sempre na esteira de Maria. Assim, de cara à Jornada Mundial da Juventude
que me trouxe até o Brasil, também eu venho hoje bater à porta da casa de Maria, que
amou e educou Jesus, para que ajude a todos nós, os Pastores do Povo de Deus, aos
pais e aos educadores, a transmitir aos nossos jovens os valores que farão deles construtores
de um País e de um mundo mais justo, solidário e fraterno. Para tal, gostaria de chamar
à atenção para três simples posturas: Conservar a esperança; deixar-se surpreender
por Deus; viver na alegria. 1. Conservar a esperança. A segunda leitura da Missa
apresenta uma cena dramática: uma mulher – figura de Maria e da Igreja – sendo perseguida
por um Dragão – o diabo - que quer lhe devorar o filho. A cena, porém, não é de morte,
mas de vida, porque Deus intervém e coloca o filho a salvo (cfr. Ap 12,13a.15-16a).
Quantas dificuldades na vida de cada um, no nosso povo, nas nossas comunidades, mas,
por maiores que possam parecer, Deus nunca deixa que sejamos submergidos. Frente ao
desânimo que poderia aparecer na vida, em quem trabalha na evangelização ou em quem
se esforça por viver a fé como pai e mãe de família, quero dizer com força: Tenham
sempre no coração esta certeza! Deus caminha a seu lado, nunca lhes deixa desamparados!
Nunca percamos a esperança! Nunca deixemos que ela se apague nos nossos corações!
O “dragão”, o mal, faz-se presente na nossa história, mas ele não é o mais forte.
Deus é o mais forte, e Deus é a nossa esperança! É verdade que hoje, mais ou menos
todas as pessoas, e também os nossos jovens, experimentam o fascínio de tantos ídolos
que se colocam no lugar de Deus e parecem dar esperança: o dinheiro, o poder, o sucesso,
o prazer. Frequentemente, uma sensação de solidão e de vazio entra no coração de muitos
e conduz à busca de compensações, destes ídolos passageiros. Queridos irmãos e irmãs,
sejamos luzeiros de esperança! Tenhamos uma visão positiva sobre a realidade. Encorajemos
a generosidade que caracteriza os jovens, acompanhando-lhes no processo de se tornarem
protagonistas da construção de um mundo melhor: eles são um motor potente para a Igreja
e para a sociedade. Eles não precisam só de coisas, precisam sobretudo que lhes sejam
propostos aqueles valores imateriais que são o coração espiritual de um povo, a memória
de um povo. Neste Santuário, que faz parte da memória do Brasil, podemos quase que
apalpá-los: espiritualidade, generosidade, solidariedade, perseverança, fraternidade,
alegria; trata-se de valores que encontram a sua raiz mais profunda na fé cristã. 2.
A segunda postura: Deixar-se surpreender por Deus. Quem é homem e mulher de esperança
– a grande esperança que a fé nos dá – sabe que, mesmo em meio às dificuldades, Deus
atua e nos surpreende. A história deste Santuário serve de exemplo: três pescadores,
depois de um dia sem conseguir apanhar peixes, nas águas do Rio Parnaíba, encontram
algo inesperado: uma imagem de Nossa Senhora da Conceição. Quem poderia imaginar que
o lugar de uma pesca infrutífera, tornar-se-ia o lugar onde todos os brasileiros podem
se sentir filhos de uma mesma Mãe? Deus sempre surpreende, como o vinho novo, no Evangelho
que ouvimos. Deus sempre nos reserva o melhor. Mas pede que nos deixemos surpreender
pelo seu amor, que acolhamos as suas surpresas. Confiemos em Deus! Longe d’Ele, o
vinho da alegria, o vinho da esperança, se esgota. Se nos aproximamos d’Ele, se permanecemos
com Ele, aquilo que parece água fria, aquilo que é dificuldade, aquilo que é pecado,
se transforma em vinho novo de amizade com Ele. 3. A terceira postura: Viver na
alegria. Queridos amigos, se caminhamos na esperança, deixando-nos surpreender pelo
vinho novo que Jesus nos oferece, há alegria no nosso coração e não podemos deixar
de ser testemunhas dessa alegria. O cristão é alegre, nunca está triste. Deus nos
acompanha. Temos uma Mãe que sempre intercede pela vida dos seus filhos, por nós,
como a rainha Ester na primeira leitura (cf. Est 5, 3). Jesus nos mostrou que a face
de Deus é a de um Pai que nos ama. O pecado e a morte foram derrotados. O cristão
não pode ser pessimista! Não pode ter uma cara de quem parece num constante estado
de luto. Se estivermos verdadeiramente enamorados de Cristo e sentirmos o quanto Ele
nos ama, o nosso coração se “incendiará” de tal alegria que contagiará quem estiver
ao nosso lado. Como dizia Bento XVI: «O discípulo sabe que sem Cristo não há luz,
não há esperança, não há amor, não há futuro” (Discurso inaugural da Conferência de
Aparecida [13 de maio de 2007]: Insegnamenti III/1 [2007], 861). Queridos amigos,
viemos bater à porta da casa de Maria. Ela abriu-nos, fez-nos entrar e nos aponta
o seu Filho. Agora Ela nos pede: «Fazei o que Ele vos disser» (Jo 2,5). Sim, Mãe nossa,
nos comprometemos a fazer o que Jesus nos disser! E o faremos com esperança, confiantes
nas surpresas de Deus e cheios de alegria. Assim seja.
No final da celebração,
o Papa fará a consagração do seu pontificado, num “ato de devoção pessoal”, como explicou
aos jornalistas padre Federico Lombardi. Invocará também a intercessão da Virgem para
todo o Brasil. Concluída a Missa, Papa Francisco saudará os fiéis que não tiveram
lugar no interior do santuário Por volta das 13 horas (18 horas em Roma), no Seminário
do Bom Jesus, o Papa almoça com os bispos da província e os seminaristas, regressando
depois ao Rio de Janeiro, onde visitará o Hospital de São Francisco de Assis na zona
da Tijuca, inaugurando uma ala psiquiátrica como “legado social” desta 28ª Jornada
Mundial da Juventude. Esta nova estrutura – designada “Polo de Atenção Integral à
Saúde Mental (PAI)”, dispondo de 40 camas, representa um “novo impulso” para o tratamento
de jovens toxicodependentes e alcoólicos no período de crise. O secretário municipal
de Transportes do Rio, Carlos Roberto Osório, admitiu que esta deslocação à Tijuca,
na zona norte, constitui a “maior preocupação” de todo o programa de deslocações desta
viagem papal, já que não é feriado municipal e Francisco regressa da Aparecida, em
hora de ponta. No Hospital, o Papa começa por presidir a um breve momento de oração.
Escutará depois o testemunho de dois jovens que ali recebem tratamento, antes de inaugurar
a ala psiquiátrica, um legado da JMJ 2013 que representa uma novidade na história
destes eventos internacionais promovidos pela Igreja Católica. O Hospital de São Francisco,
tem atualmente um complexo com 8 prédios e aproximadamente 400 camas de internamento.