Jales (RV) - No contexto de tantas manifestações populares, é iluminador conferir
a atitude de Jesus diante das multidões.
Uma primeira constatação não deixa
dúvidas: Jesus sabia acolher as multidões, e entretê-las por um dia inteiro, atentas
à sua palavra.
Mas ao mesmo tempo Jesus sabia “despedir” as multidões, de
maneira prudente e apropriada.
São diversas as circunstâncias em que Jesus
se viu às voltas com as multidões. Valha para a reflexão deste momento, a passagem
de Mateus, no seu capítulo 14: “Quando as multidões o souberam, saíram das cidades,
e o seguiram a pé. Ao sair do barco, Jesus viu uma grande multidão. Encheu-se de compaixão
por eles”.(Mt 14,14)
Mateus insere neste contexto o episódio da multiplicação
dos pães. Ao chegar à tarde, vendo aquela multidão, os discípulos acharam por bem
sugerir ao Mestre que despedisse as multidões, “para que fossem aos povoados comprar
comida”.
Os discípulos estavam apelando para a lei do mercado. Que cada um
comprasse o seu alimento. A solução não viria do mercado, mas da solidariedade.
Jesus
surpreendeu os discípulos, dizendo: “eles não precisam ir embora. Dai-lhes vós mesmos
de comer”.
Com os poucos pães que tinham, certamente escondidos, se desencadeou
uma surpreendente partilha, em que todos ficaram saciados. Resultou evidente o milagre.
Seja o da “multiplicação” do pão, como o milagre mais difícil da partilha fraterna.
Mas
o episódio não pára aí. Mateus prossegue, narrando que “logo em seguida, Jesus mandou
que os discípulos entrassem no barco, e fossem adiante dele para a outra margem do
lago, enquanto ele despediria as multidões. Depois de despedi-las, subiu à montanha,
a sós, para orar.” (Mt 14,22-23)
Depois de atendidas, aí sim, Jesus despediu
as multidões, de maneira firme e decidida. Não convinha que continuassem por lá, mesmo
que a noite estivesse próxima.
Os dois gestos, tanto de acolhida como de despedida,
eram fruto do amor e da compaixão que Jesus tinha para com as multidões. Elas precisam
ser bem acolhidas, elas precisam também ser bem despedidas.
Qual das duas
providências implicava uma responsabilidade maior? Pensando bem, e constatando as
circunstancias, a despedida das multidões revela mais a responsabilidade que Jesus
tinha com o povo. Mais do que com a acolhida. Pois a acolhida resultava da iniciativa
das próprias multidões. Ao passo que a despedida era fruto da providência expressa
de Jesus.
E por quê?
Porque as multidões sempre requerem responsabilidade
em lidar com elas, para evitar situações que as coloquem em risco. E´ interessante
que neste mesmo episódio, Mateus acaba revelando onde morava o perigo. Observa ele
que “quando soube que Herodes tinha matado a João, Jesus partiu imediatamente de onde
estava, e se dirigiu para o deserto.”
Jesus se precaveu. Diante da truculência
de Herodes, precisava preservar sua vida. E a vida do povo também.
Naquele
tempo era perigoso provocar aglomerações. Toda atenção era pouca.
Sempre será
pouca! Para garantir uma boa acolhida. Mas também para garantir que as multidões
possam voltar para casa saciadas, não só de pão, mas da vontade que expressam de participar
nas decisões que implicam a segurança e a dignidade de suas vidas!