A preocupação do Papa e da Santa Sé sobre Síria: entrevista ao cardeal Leonardo Sandri
Com a audiência
do Papa Francisco, concluiu-se no Vaticano a 86ª Assembleia da ROACO, a Reunião das
Obras de Ajuda às Igrejas Orientais, centrada na "Situação dos cristãos e das Igrejas
no Egipto, Iraque, Síria e Terra Santa”. Exactamente sobre estes cenários se concentra
o comunicado final, em que se percorrem os testemunhos dos delegados presentes, destacando
particularmente as dificuldades vividas por muitos cristãos naquelas áreas, mas também
a contribuição dada para a reconciliação e o bem comum. Muito debate sobre o drama
dos refugiados da Síria e a difícil situação em Gaza. A colega francesa Romilda Ferrauto
entrevistou a este propósito o Cardeal Leonardo Sandri, prefeito da Congregação para
as Igrejas Orientais (e presidente da ROACO). – A Síria é como um fio condutor…
e também todo o Médio Oriente. O Papa pediu a cessação imediata das hostilidades,
das armas - "Calem as armas" - e que se possa iniciar um caminho de paz, para o bem
de todo o Médio Oriente, sobretudo para os países vizinhos, para o Iraque, o Líbano,
a Jordânia e assim por diante. O Papa confirmou estas suas preocupações nas palavras
que nos dirigiu, e nós tivemos a oportunidade de lhe apresentar as três testemunhas
que falaram à ROACO, juntamente com o Núncio apostólico, Dom Zenari, descrevendo
a situação em que vivem: um jesuíta de Homs, uma Irmã de Damasco e um Padre franciscano
do norte da Síria, perto de Antioquia. Testemunhos que levam quase, até mesmo, a chorar,
ao ver e ouvir aquilo que devem viver cada dia, em contacto tanto com as forças do
governo como com os rebeldes, e como eles devem estar ao lado da população que é vítima
desse tipo de agressão de uns contra os outros. São vítimas impotentes. Portanto,
a Santa Sé está preocupada, o Papa está preocupado, e todos nós gostaríamos que quanto
antes começasse uma negociação, de tal modo que, uma vez terminada a voz das armas,
se possa falar para se chegar a uma solução que salvaguarde não apenas os inocentes
e as vítimas: que salvaguarde a dignidade humana, como tal, de todos os habitantes
da Síria. – Orações, solidariedade, apelos… Há algo mais que a Igreja possa fazer
para pôr termo a este interminável banho de sangue? – Há, sem dúvida, uma acção
por parte da diplomacia da Santa Sé que, como se sabe, é uma acção que se faz quase
sempre na maior reserva e prudência, mas que procura habilmente incutir estes princípios.
E através destes valores, que a Santa Sé e os Papas sempre proclamaram, procura-se
através de encontros com as autoridades, através dos Núncio apostólicos, através dos
embaixadores que estão aqui junto da Santa Sé, levar a esta convicção, ou seja, que
a única solução que pode levar à paz é a negociação e o confronto político. – Na
sua homilia, na terça de manhã, durante a Missa para os cristãos no Médio Oriente,
pediu que se reze também para que os cristãos orientais não respondam ao ódio com
o ódio. Existe uma preocupação em relação a isto: que os cristãos possam ser tentados
a recorrer a métodos não tanto cristãos, não tanto evangélicos? – Existe este
perigo. Graças a Deus até agora ainda não se verificou. Não é mau, contudo, recordar
estes apelos para responder ao mal com o bem, e não o mal com o mal, de tal modo que
os cristãos continuem sempre no caminho das bem-aventuranças, no caminho da humildade,
no caminho por vezes da afronta, e se saiba oferecer a outra face, se por se sofre
a perseguição. – Não ignoramos que algumas vozes respeitáveis nas Igrejas locais
pensam, por vezes, que as ditaduras são um mal menor em comparação com o caos actual.
O que nos pode dizer sobre isso? – Sim, certamente esta convicção de alguns é
parcial, porque talvez não tomam em conta outros aspectos, que também podem ser criticáveis.
O objectivo final é sempre o respeito pelos direitos da pessoa humana e, portanto,
que haja também uma democratização, na qual todos podem participar, e se possa construir
uma sociedade, uma nova cultura da participação de todos os cidadãos os cidadãos -
cristãos ou de outras religiões, mesmo as maioritárias - para o bem do País. Portanto,
o desejo último seria uma Constituição, fruto certamente de amplos acordos entre todos
os que vivem no País, mas acordos através do diálogo, e não através das armas, para
que na Constituição seja evidente a igualdade de todos os cidadãos perante a lei,
seja qual for a religião a que pertencem, para todos contribuírem para o bem da sua
pátria. – Resta, para terminar, também o desejo de manter os cristãos no seu País?
– Nós queremos que os cristãos permaneçam, porque esses Países não se podem entender
sem a presença cristã. Eles são, contudo, tentados muito fortemente a deixar este
País pela insegurança e falta de trabalho e pela busca de um futuro para os seus filhos.
E não devemos ceder à tentação de nos conformarmos com isso e dizer: "Está bem, podem
ir embora todos os cristão". Pelo contrário, mesmo que tenham ficado poucos, que eles
sejam realmente a semente de um novo futuro de valores próprios da consciência cristã.