Editorial África. Os mártires da Uganda: a coragem de dar testemunho de Cristo
"Quem poderia prever que às grandes figuras históricas de santos mártires e confessores
africanos, como Cipriano, Felicidade e Perpétua e o venerável Agostinho, associaríamos
um dia os queridos nomes de Carlos Lwanga e Mateus Mulumba Kalemba, com os seus vinte
companheiros? E não vamos esquecer os outros que, membros da denominação anglicana,
enfrentaram também eles a morte em nome de Cristo", recordava o Papa Paulo VI aquando
da canonização dos mártires da Uganda, a 18 de Outubro de 1964. Estes testemunhas
de Cristo eram todos leigos; alguns deles até catecúmenos que receberam o baptismo
de Carlos Lwanga, pouco antes do martírio. Alguns dirigiam a primeira comunidade
cristã. Nascia com eles a tradição dos "catequistas", considerados na altura como
auxiliares dos sacerdotes, especialmente em zonas remotas.
Eles sofreram o
martírio na Uganda nos anos 1885-1887. O mais conhecido dentre eles, Carlos Lwanga,
foi queimado vivo, juntamente com outros doze católicos e alguns cristãos de outras
confissões; era o dia 3 de Junho de 1886, em Namugongo, lugar que o Papa consagrou
como santuário durante a sua visita a Uganda em 1969. Eles são admirados pela sua
"coragem extraordinária", que constitui uma grande lição e um desafio para os cristãos.
Neste
início do mês de Junho, a Igreja acaba de celebrar a memória litúrgica destes mártires
cuja fé heróica continua a acompanhar a Igreja Africana e nos questiona sobre o papel
que os leigos têm hoje na transmissão da fé em África. Uma resposta a esta pergunta
nos vem de Bento XVI que afirmou, durante a sua viagem apostólica ao Benin, que os
fiéis leigos africanos têm um papel insubstituível na missão da evangelização. Apaixonados
por Cristo e pela Igreja, eles estão cheios de alegria e gratidão pelo baptismo que
receberam, indica ainda o Papa emérito.
Em nome deste baptismo, podemos
estabelecer uma longa lista de mártires silenciosos do nosso tempo, que são assassinados
pelo ódio à fé e pelo simples facto de serem cristãos. "Hoje em dia, para encontrarmos
os mártires, não precisamos de ir às catacumbas; os mártires estão vivos hoje em muitos
países. Os cristãos são perseguidos por causa da sua fé. Em alguns países, eles não
podem trazer a cruz: são castigados se o fizerem". Estas palavras tiradas da homilia
do Papa Francisco, pronunciadas na manhã do sábado 6 de Abril, na capela da Casa Santa
Marta no Vaticano interpelam a cada um sobre o testemunho que se deve dar de Cristo
e o tipo de cristão que se quer ser. Ter a coragem de ser uma testemunha de Cristo,
continua o Papa, é ter a coragem de testemunhar uma fé, não "tépida" ou à "água de
rosa", mas "proclamada", para difundi-la a "todos os povos".
E neste mês
de Junho, a Igreja que está em África vive a memória destes jovens que souberam testemunhar
o seu Senhor até ao supremo sacrifício, estes jovens que souberam preservar a sua
fé até ao fim.
Para além do seu testemunho e do seu sacrifício, os mártires
da Uganda permanecem um exemplo a seguir, para os jovens e menos jovens do continente
africano que são chamados a seguir a sua força e coragem para proclamar a Jesus Ressuscitado.
E
o Papa Francisco não cessa de exortar: "Devemos ter a coragem de proclamar abertamente
Cristo Ressuscitado. Devemos ter mais coragem para testemunhar a nossa fé em Cristo
ressuscitado. Não devemos ter medo de ser cristãos e viver como cristãos".
Neste
momento em que anunciar Cristo em algumas regiões da África significa colocar a própria
vida em risco, aceitar a discriminação; viver nas periferias existenciais ... Uma
verdadeira coragem para testemunhar é necessária para proclamar a fé de forma autêntica.
O
papel dos catequistas foi, é e continua a ser crucial para proclamar esta fé e testemunhar
Cristo em África mas, por vezes, este papel não é reconhecido no seio da comunidade
cristã em relação ao ministro ordenado. E, no entanto, à imagem dos mártires da Uganda
e como ensina o magistério da Igreja, através do baptismo cada cristão recebeu a missão
de proclamar e confessar Cristo ressuscitado, fonte de salvação para o mundo.
Hoje, a Igreja nos indica cada vez mais que o catequista não é um auxiliar do
ministro ordenado; ele tem a sua vocação específica: ser o primeiro evangelizador
na sua família, nas comunidades cristãs, nas paróquias, deixando ao sacerdote a tarefa
de administrar os sacramentos. Nas comunidades cristãs rurais sem sacerdotes, é o
catequista que tem o dever de animar a oração, preparar os fiéis aos sacramentos,
a celebração da Palavra, e de intervir por vezes no sector do desenvolvimento. O sacerdote
passa de vez em quando para administrar os sacramentos.
Para isso, ele deve
receber uma preparação cuidadosa; seguir cursos de Bíblia, da doutrina social da Igreja,
etc. Ele é chamado a despertar a consciência de cada baptizado a ser membro do corpo
místico de Cristo e, portanto, chamado à co-responsabilidade na proclamação do Evangelho.
Como
o disse recentemente o Papa: "ser cristão é um dom que nos permite seguir em frente
com a força do Espírito no anúncio de Jesus Cristo; basta o baptismo para evangelizar;
para proclamar Cristo mesmo no meio de perseguições ou quando se vive em condições
de insegurança".