Arcebispo Angelo Becciu e 'A reforma de Papa Francisco'
Cidade do Vaticano (RV) - Em 13 de abril foi publicada a notícia que o Papa
Francisco constituiu um grupo de oito cardeais para o aconselhar no governo da Igreja
universal e para estudar um projeto de revisão da constituição apostólica Pastor
bonus sobre a Cúria romana. A decisão suscitou muito interesse, dando lugar a
muitas especulações. Sobre isto, o Arcebispo Angelo Becciu, substituto da Secretaria
de Estado, falou numa entrevista ao L’Osservatore Romano.
OR: Sobre a reforma
da Cúria ouviram-se muitas vozes: equilíbrio dos poderes, moderadores, coordenadores,
‘super-ministérios da economia’, revoluções...
Dom Angelo: “Com
efeito é um pouco estranho: o Papa ainda não se encontrou com o grupo de conselheiros
que escolheu e já chovem conselhos... Depois de ter falado com o Santo Padre, posso
dizer que neste momento é absolutamente prematuro avançar qualquer hipótese acerca
da futura organização da Cúria. O Papa Francisco está ouvindo todos, mas em primeiro
lugar gostaria de ouvir quem escolheu como conselheiros. Sucessivamente será esboçado
um projeto de reforma da Pastor bonus, que obviamente deverá percorrer um itinerário”.
OR:
Falou-se muito também sobre o Ior, o Instituto para as obras de religião; ouve quem
aventurou a previsão de uma sua supressão...
Dom Angelo: “O Papa
ficou surpreendido quando se viu atribuídas frases que nunca pronunciou e que deturpam
o seu pensamento. A única menção a este propósito foi durante uma breve homilia em
Santa Marta, improvisada, na qual recordou de modo apaixonado que a essência da Igreja
consiste numa história de amor entre Deus e os homens, e que as várias estruturas
humanas, entre as quais o Ior, são menos importantes. A referência foi uma alusão,
motivada pela presença na missa de alguns empregados do Instituto, no contexto de
um sério convite a nunca perder de vista o essencial da Igreja”.
OR: Deve-se
prever que não é iminente uma reestruturação da atual conformação dos dicastérios?
Dom
Angelo: “Não posso prever os tempos. Contudo o Papa pediu a todos nós, responsáveis
dos organismos, para continuarmos o nosso serviço, sem contudo proceder, de momento,
a confirmação alguma nos cargos. O mesmo é válido para os membros das Congregações
e dos Pontifícios Conselhos: o normal ciclo de confirmações ou nomeações, que se verificam
no final dos mandatos qüinqüenais, de momento está suspenso, e todos continuam o próprio
encargo ‘até nova disposição’ (donec aliterprovideatur). Isto indica
a vontade do Santo padre de dispor do tempo necessário para a reflexão - e de oração,
não o devemos esquecer – para ter um quadro completo da situação”.
OR: A
propósito do grupo de conselheiros, ouve quem afirmou que tal escolha possa pôr em
questão a primazia do Papa...
Dom Angelo: “Trata-se de um órgão
consultivo, não de decisão, e verdadeiramente não vejo como a escolha do Papa Francisco
possa pôr em questão a primazia. Ao contrário, é verdade que se trata de um gesto
de grande relevância, que pretende dar um sinal claro acerca das modalidades com as
quais o Santo Padre deseja exercer o seu ministério. Com efeito, não devemos esquecer
qual é a primeira tarefa atribuída ao grupo dos oito cardeais: assistir o Pontífice
no governo da Igreja universal. Esperemos que a curiosidade pela organização e pelas
estruturas da Cúria romana faça passar para segundo plano o sentido profundo do gesto
realizado pelo Papa Francisco”.
OR: Mas a expressão «aconselhar» não é demasiado
vaga?
Dom Angelo: “Ao contrário, aconselhar é uma ação importante,
que na Igreja é teologicamente definida e encontra expressão a muitos níveis. Pensemos,
por exemplo, nos organismos de participação nas dioceses e nas paróquias, ou nos conselhos
dos superiores, provinciais e gerais, nos Institutos de vida consagrada. A função
do conselheiro deve ser interpretada em chave teológica: numa óptica mundana deveríamos
dizer que um conselho sem poder deliberativo é irrelevante, mas isto significaria
equiparar a Igreja com uma empresa. Ao contrário, teologicamente aconselhar tem uma
função de realce absoluto: ajudar o superior na obra do discernimento, na compreensão
daquilo que o Espírito pede à Igreja num determinado momento histórico. Aliás, sem
esta referência nada se compreenderia do significado autêntico da ação de governo
na Igreja”.
OR: Quais são os seus sentimentos ao colaborar com o Papa Francisco?
Dom
Angelo: “Pude colaborar de perto com o Papa Bento, agora prossigo o meu serviço
com o Papa Francisco. Naturalmente cada um tem a sua personalidade, o seu estilo,
e sinto-me um privilegiado por este contato direto com dois homens inteiramente dedicados
ao bem de toda a Igreja, desapegados de si mesmos, imersos em Deus e com uma única
paixão: fazer conhecer a beleza do Evangelho às mulheres e aos homens de hoje”.