2013-04-15 13:32:38

Salvaguarda do ambiente, uma utopia? Editorial Africa


Salvaguardar o ambiente requer acções individuais e colectivas, nacionais e globais. Mas a nenhum destes níveis parece haver uma verdadeira tomada de consciência e vontade de agir de modo determinado. Continua-se, portanto, a não ter uma boa relação com a natureza. O Papa Francisco recordava-o, no passado dia 16 de Março, no seu encontro com os jornalistas, ao explicar a escolha do seu nome.

A nível global, os primeiros fundamentos para aquilo que é hoje chamado desenvolvimento sustentável, isto é, que garanta o melhoramento da qualidade de vida de todos, mas no respeito das capacidades regenerativas dos recursos ambientais, foram lançados pela ONU em 1972 na Conferência de Estocolmo. Seguiram-se outras conferências e relatórios, até se chegar a “Rio + 20” de 2012, no Brasil.

Atrás de tudo isso, ficou um grande número de declarações de princípio que nada, senão o bom senso, obriga a pôr em prática. Assim, os resultados a nível planetário são escassos: a seca intensifica-se, os desertos avançam, os grandes pulmões da terra – desde a bacia fluvial do Congo à floresta da Amazónia – são afectados, os recursos hídricos e terrenos agrícolas são contaminados por resíduos tóxicos, lançando para a extrema pobreza e para a mais completa desorientação cosmogónica milhões de pessoas, enquanto que os gases serra provocam imprevisíveis mudanças climáticas.

Como não recordar aqui, limitando-nos à África, a extracção industrial da madeira, em parte de forma ilegal, que, segundo Greenpeace, leva em “cada ano à perda de 4,1 milhões de hectares de florestas no continente africano”, com consequências que vão muito para além da simples corte duma árvore?

Como não recordar a triste situação do Delta do Níger, onde mais de 30 milhões de nigerianos vivem desde há 50 anos nas mais desesperadas condições de desequilíbrio ambiental, causadas pelas incautas extracções de petróleo por parte de multinacionais como a Shell, a ENI, a Total e outras? Aos protestos dos movimentos sociais, as autoridades da Nigéria, coniventes com as multinacionais, responderam, em 1995, mandando enforcar o poeta, dramaturgo e activista social, Ken Saro Wiwa e oito seus companheiros de luta. Hoje estão em debate no Parlamento do país projectos de lei aparentemente mais protectoras do ambiente e dos direitos das populações locais. O futuro dirá!

Normas coercitivas, não. Acumulação de conhecimentos aceites por todos sobre a estreita relação entre o desenvolvimento económico, salvaguarda do ambiente e qualidade de vida hoje e no futuro, sim. Este parece ser o resultado mais concreto das conferências mundiais sobre o ambiente. Nelas foi-se tornando cada vez mais clara a necessidade de que todos (países, instituições, indivíduos) possam exprimir, de algum modo, a própria opinião sobre a relação entre desenvolvimento e recursos renováveis da Terra. Isto pressupõe acesso dos cidadãos às informações pertinentes e a válidos programas educativos orientados para a sustentabilidade. Diversos organismos, em várias partes do mundo, já estão a fazer um trabalho de formiga neste sentido. E o Dia Mundial da Juventude em Julho próximo, na cidade brasileira de Rio de Janeiro, será uma grande ocasião para sensibilizar os milhões de jovens do mundo inteiro, que nela participarão, em relação a questões ambientais. Várias organizações já estão a trabalhar nesta direcção. Ao regressar para os seus países, esses jovens poderão levar consigo também a visão cristã da Criação, partilhá-la com os seus coetâneos e pô-la em prática juntamente com os outros.

Mas não há dúvida de que o caminho a percorrer em direcção a um completo equilíbrio entre o desenvolvimento económico e o ecossistema é ainda longo, e espera-se que ao percorrê-lo se tenha em conta também a sapiência africana na sua relação ancestral com a natureza e que hoje corre o risco de desaparecer completamente se nada for feito para salvaguardar esses valores.

O que é certo é que quanto mais penetramos na abordagem das questões ecológicas, mais se tem a sensação de desorientação e impotência.

Com efeito, constatar que os parquet e os móveis luxuosos de muitas casas da burguesia são sinónimo de uma irracional exploração humana, material e ecológica em muitas partes do mundo; tomar consciência da estreita ligação entre a exploração florestal, guerras, doenças, mal nutrição e fome; constatar que substituir a gasolina com o metanol, subtrai terreno à produção agrícola para alimentação; constatar que muitos políticos tomam decisões olhando apenas para a duração e a eficácia do seu mandato, sem ter em conta ou mesmo ignorando as consequências ecológicas a médio e longo prazo; constatar que o discurso sobre as energias renováveis é extremamente complexo; constatar a impressionante dimensão dos fenómenos de ilegalidade que afectam o ambiente… enfim, tomar consciência da forte interdependência global entre acções de desenvolvimento e as consequências negativas, permitidas ou inevitáveis, sobre o ambiente, pode levar a pensar que não se chegará nunca a encontrar o fio da meada e que não vale a pena, portanto, agir. Nada de mais errado!

Felizmente, não faltam exemplos encorajadores. A África pode exibir, entre outras, as acções da célebre Wangari Maathai, Nobel da Paz em 2004, que soube combater a degradação ambiental com a plantação de milhões de árvores e com uma enérgica consciencialização de cidadãos e governos sobre as próprias responsabilidades na salvaguarda do ambiente. Acções que levou a cabo através do Movimento “Green Belt” por ela criado. Além disso deixou como herança um importante Instituto de Estudos Interdisciplinares sobre o Ambiente e a Paz, com sede no Quénia, sua terra natal.
A União Africana recorda-a com uma jornada anual dedicada ao ambiente. Mas a energia que ela punha nessa luta não parece caracterizar as acções da UA, que não deixa, todavia, de estabelecer uma ligação, embora fraca, entre o seu cinquentenário (1963-2013), o tão decantado Renascimento africano e as questões ambientais.

Ainda a nível da África não se podem omitir as preocupações da Igreja pelas questões de desenvolvimento sustentável. Na linha do II Sínodo dos Bispos para a África (2009) e dos seus documentos - Mensagem final e exortação Africae Munus - em que se convidam as multinacionais a porem fim “à devastação criminosa do ambiente” – o SCEAM, Simpósio das Conferências Episcopais da África, fez-se presente em Março passado com uma delegação e uma mensagem ao Painel de Alto Nível da ONU sobre o pós Objectivos do Desenvolvimento do Milénio e Objectivos Sustentáveis de Desenvolvimento, recordando que sem os valores humanos não se chegará nunca a uma relação harmónica entre a qualidade de vida e o ambiente.

Além disso, a Igreja católica universal não cessa de dar exemplos de sensibilidade ambiental. Em 2008, o agora Papa emérito, Bento XVI, conquistou o título de Papa ecológico ao permitir instalar sobre a cobertura do tecto da ampla Aula Paulo VI, no Vaticano, 2400 painéis solares. O Papa Ratzinger pôs também amplamente em realce na sua encíclica Caritas in Veritate, a questão ambiental, recordando que a natureza é um maravilhoso dom de Deus que deve ser tratado com respeito, por forma a beneficiar a população actual no mundo e as gerações vindouras.

E a sensibilidade já demonstrada pelo Papa Francisco em relação ao ambiente é encorajador. As suas palavras ao Corpo Diplomático acreditado junto da Santa Sé, no passado dia 22 de Março, são emblemáticas:

“Lutar contra a pobreza, tanto material como espiritual, edificar a paz e construir pontes: são como que os pontos de referência para um caminho que devemos percorrer, desejando convidar cada um dos países que representais a tomar parte nele. Um caminho que será difícil, se não aprendermos a amar cada vez mais esta nossa terra. Também neste caso me serve de inspiração o nome de Francisco: ele ensina-nos um respeito profundo por toda a criação, ensina-nos a proteger este nosso meio ambiente, que muitas vezes não usamos para o bem, mas desfrutamos com avidez e prejudicando um ao outro”.
Estes e tantos outros exemplos positivos permitem-nos acreditar que, embora se trate, como dizia o Papa, de um caminho difícil, é possível substituir a imensa desordem ambiental que caracteriza o mundo actual com uma harmonia, igualmente grande, entre desenvolvimento e ambiente. Deus deu-nos o instrumento para o fazer: o amor em relação a todos e em relação à Criação. Só amando e valorizando a Criação, fazendo dela uma fonte de felicidade para todos, hoje e amanhã, poderá tornar-se realidade a utopia de um mundo melhor.
Maria Dulce Araújo Évora – Programa Português








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