A "coragem e humildade da fé", aceitando sofrer pela verdade: Bento XVI na Missa da
Epifania ordenando quatro novos bispos
Como os Magos vindos do Oriente para adorar Jesus, os bispos hão-de ser “pessoas de
coração inquieto”, “movidos pela busca de Deus e da salvação do mundo”, “homens que
esperam” e participam da “inquietação de Deus por nós”. Seguindo uma tradição
iniciada pelo seu predecessor João Paulo II, Bento XVI celebrou hoje de manhã, na
basílica de São Pedro, a festa da Epifania procedendo à ordenação episcopal de quatro
novos bispos: - Angelo Vincenzo Zani, da diocese italiana de Brescia, Secretário da
Congregação para a Educação Cristã; - Fortunatus Nwachukwu, da diocese de Aba (Nigéria),
nomeado Núncio Apostólico na Nicarágua; - Georg Gänswein, da diocese de Freiburg im
Breisgau (Alemanha), seu secretário pessoal, nomeado Prefeito da Casa Pontifícia;
- e Nicolas Denis Thevenin, do clero da arquidiocese italiana de Génova, nomeado Núncio
Apostólico na Guatemala. Bento XVI exortou os novos bispos à “coragem e humildade
da fé”, sabendo enfrentar mesmo “a zombaria do mundo” e “contradizer as orientações
dominantes”. Uma valentia e fortaleza que não é agressividade nem provocação mas que
aceita ser ferido para “permanecer firme na verdade”.
Para a Igreja crente
e orante (observou Bento XVI), os Magos do Oriente, que, guiados pela estrela, encontraram
o caminho para o presépio, são o princípio duma grande procissão que permeia a história.
Os homens vindos do Oriente personificam o mundo dos povos, a Igreja dos gentios:
os homens que, ao longo dos séculos, se encaminham para o Menino de Belém. A Igreja
chama a esta festa «Epifania» – a manifestação do Divino… aos homens de todas as proveniências
e continentes, de diversas culturas e diferentes formas de pensamento e de vida. É
uma Epifania da bondade de Deus e do seu amor pelos homens. Nesta “peregrinação dos
povos para Jesus Cristo”, o Bispo – recordou o Papa – tem a missão de “ir à frente
e indicar a estrada”.
Bento XVI partiu da figura dos Magos, para, reflectindo
sobre que tipo de homens eles eram, tentar “vislumbrara algo do que é o Bispo e de
como deve cumprir a sua missão”. Os Magos “eram, em definitiva, pessoas de coração
inquieto; homens inquietos movidos pela busca de Deus e da salvação do mundo; homens
à espera”, que queriam sobretudo saber o essencial. “Queriam não apenas saber; queriam
conhecer a verdade acerca de nós mesmos, de Deus e do mundo. A sua peregrinação exterior
era expressão deste estar interiormente a caminho, da peregrinação interior do seu
coração. Eram homens que buscavam a Deus e, em última instância, caminhavam para Ele;
eram indagadores de Deus”.
Daqui, emerge, para Bento XVI, o que deve ser o
Bispo: “deve ser sobretudo um homem cujo interesse se dirige para Deus, porque só
então é que ele se interessa verdadeiramente também pelos homens. E, vice-versa, podemos
dizer: um Bispo deve ser um homem que tem a peito os outros homens, que se deixa tocar
pelas vicissitudes humanas”. Pode-se dizer que deve ser sobretudo um homem cujo
interesse se dirige para Deus, porque só então é que ele se interessa verdadeiramente
também pelos homens. E, vice-versa: “um Bispo deve ser um homem que tem a peito os
outros homens, que se deixa tocar pelas vicissitudes humanas. Deve ser um homem para
os outros; mas só poderá sê-lo realmente, se for um homem conquistado por Deus: se,
para ele, a inquietação por Deus se tornou uma inquietação pela sua criatura, o homem”.
Como os Magos do Oriente, também um Bispo não deve ser alguém que se limita
a exercer o seu ofício, sem se importar com mais nada. “(O Bispo) deve deixar-se absorver
pela inquietação de Deus com os homens. Deve, por assim dizer, pensar e sentir em
sintonia com Deus. Não é apenas o homem que tem em si a inquietação constitutiva por
Deus, mas esta inquietação é uma participação na inquietação de Deus por nós”.Foi
por estar inquieto connosco que Deus veio atrás de nós até à manjedoura; mais: até
à cruz. “A inquietação do homem por Deus e, a partir dela, a inquietação de Deus
pelo homem devem não dar tréguas ao Bispo. É isto que queremos dizer, ao afirmar que
o Bispo deve ser sobretudo um homem de fé; porque a fé nada mais é do que ser interiormente
tocado por Deus, condição esta que nos leva pelo caminho da vida. A fé leva-nos a
um estado em que somos arrebatados pela inquietação de Deus e faz de nós peregrinos
que estão interiormente a caminho…”
Os Magos “tinham a coragem e a humildade
da fé” – observou ainda o Papa. Sabiam enfrentar “o sarcasmo dos ditos realistas”.
Para eles, “a busca da verdade era mais importante do que a zombaria do mundo, aparentemente
inteligente”. Ora, fez notar Bento XVI, quem vive e anuncia a fé da Igreja também
não está, em muitos aspectos, em conformidade com as opiniões dominantes… “O agnosticismo,
hoje largamente imperante, tem os seus dogmas e é extremamente intolerante com tudo
o que o põe em questão, ou põe em questão os seus critérios”. “Por isso, a coragem
de contradizer as orientações dominantes é hoje particularmente premente para um Bispo.
Ele tem de ser valoroso; e esta valentia ou fortaleza não consiste em ferir com violência,
na agressividade, mas em deixar-se ferir e fazer frente aos critérios das opiniões
dominantes. A coragem de permanecer firme na verdade é inevitavelmente exigida àqueles
que o Senhor envia como cordeiros para o meio de lobos”.
“Naturalmente – esclareceu
o Papa - queremos, como os Apóstolos, convencer as pessoas e, neste sentido, obter
a sua aprovação; naturalmente não provocamos, antes, pelo contrário, convidamos todos
a entrarem na alegria da verdade… Contudo o critério a que nos submetemos não é a
aprovação das opiniões dominantes; o critério é o próprio Senhor.” Como os Apóstolos
que saíram do Sinédrio “cheios de alegria por terem sido considerados dignos de sofrer
vexames por causa do nome de Jesus” (prosseguiu ainda), sabemos que, se defendemos
a sua causa, …inevitavelmente também seremos flagelados (à maneira moderna) por aqueles
cujas vidas estão em contraste com o Evangelho, e então poderemos ficar agradecidos
por sermos considerados dignos de participar na Paixão de Cristo.
E Bento XVI
concluiu, assegurando os novos bispos da sua própria oração assim como de toda a Igreja:
“que o Senhor vos encha com a luz da fé e do amor, que a inquietação de Deus pelo
homem vos toque, que todos possam experimentar a sua proximidade e receber o dom da
sua alegria. Rezamos por vós, para que o Senhor sempre vos dê a coragem e a humildade
da fé.
No costumado encontro dominical com os fiéis para a recitação da oração
mariana do meio-dia, desta vez com grandíssima participação de romanos e peregrinos,
Bento XVI recordou que a festa da Epifania coincide com a festa do Natal para os cristãos
ortodoxos da Europa oriental. O Papa exprimiu-lhes os melhores votos de boas festas.
Como
é tradição em Roma, neste “Dia dos Reis” convergiu ao fim da manhã para a Praça de
São Pedro um Cortejo folclórico recordando precisamente os Magos. Não faltou a saudação
do Papa…