Papa envia mensagem ao "Pátio dos Gentios" em Portugal: "nós somos fruto de um pensamento
de Deus"
Cidade do Vaticano (RV) - Bento XVI enviou uma mensagem aos participantes da
sessão portuguesa do “Pátio dos Gentios”, que teve início na sexta-feira e se encerra
neste sábado, nas cidades de Guimarães e Braga, com o tema "O Valor da Vida". O “Pátio
dos Gentios” foi inaugurado com uma conferência de Marcelo Rebelo de Sousa, professor
universitário, sobre o tema ‘Identidade e sentido da vida de um povo’.
Em sua
mensagem, o Papa saúda os participantes do encontro que reúne crentes e não-crentes
ao redor da aspiração comum de afirmar o valor da vida humana sobre a maré crescente
da cultura da morte.
Na realidade, - escreve o Papa - a consciência da sacralidade
da vida que nos foi confiada, não como algo de que se possa dispor livremente, mas
como dom a guardar fielmente, pertence à herança moral da humanidade. “Mesmo entre
dificuldades e incertezas, cada homem sinceramente aberto à verdade e ao bem, com
a luz da razão e não sem o secreto influxo da graça, pode chegar a reconhecer na lei
natural inscrita no coração (cf. Rm 2, 14-15) o valor sagrado da vida humana desde
o primeiro momento do seu início até ao seu termo” (Enc. Evangelium vitæ, 2). Não
somos produto casual da evolução, mas cada um de nós é fruto de um pensamento de Deus:
somos amados por Ele.
Mas, - pergunta-se o Papa - se a razão pode alcançar
tal valor da vida, por que chamar em causa Deus? Bento XVI responde citando uma experiência
humana. “A morte da pessoa amada é, para quem a ama, o acontecimento mais absurdo
que se possa imaginar: aquela é incondicionalmente digna de viver, é bom e belo que
exista (o ser, o bem e o belo, como diria um metafísico, equivalem-se transcendentalmente).
Entretanto, a mesma morte da mesma pessoa aparece, aos olhos de quem não ama, como
um acontecimento natural, lógico (não absurdo). Quem tem razão? Aquele que ama («a
morte desta pessoa é absurda») ou o que não ama («a morte desta pessoa é lógica»)?
A
primeira posição só é defensível, se cada pessoa for amada por um Poder infinito;
e aqui está o motivo por que foi preciso apelar a Deus. De fato, quem ama não quer
que a pessoa amada morra; e, se pudesse, impedi-lo-ia sempre. Se pudesse… O amor finito
é impotente; o Amor infinito é onipotente. Ora, esta é a certeza que a Igreja anuncia:
«Tanto amou Deus o mundo, que lhe entregou o seu Filho Unigênito, a fim de que todo
o que nele crê não se perca, mas tenha a vida eterna» (Jo 3, 16). Sim! Deus ama cada
pessoa e, por isso, é incondicionalmente digna de viver.
Na modernidade, porém,
o homem quis subtrair-se ao olhar criador e redentor do Pai (cf. Gn 4, 14), fundando-se
sobre si mesmo e não sobre o Poder divino. Quase como sucede nos edifícios de cimento
armado sem janelas, onde é o homem que provê ao clima e à luz; e, no entanto, mesmo
em tal mundo auto-construído, vai-se beber aos «recursos» de Deus, que são transformados
em produtos nossos. Que dizer então? É preciso tornar a abrir as janelas, olhar de
novo a vastidão do mundo, o céu e a terra e aprender a usar tudo isto de modo justo.
De fato, o valor da vida só se torna evidente, se Deus existe. Por isso, seria bom
se os não-crentes quisessem viver «como se Deus existisse». Ainda que não tenham a
força para acreditar, deviam viver na base desta hipótese; caso contrário, o mundo
não funciona. Há tantos problemas que devem ser resolvidos, mas nunca o serão de todo,
se Deus não for colocado no centro, se Deus não se tornar de novo visível no mundo
e determinante na nossa vida. Aquele que se abre a Deus não se alheia do mundo e dos
homens, mas encontra irmãos: em Deus caem os nossos muros de separação, somos todos
irmãos, fazemos parte uns dos outros.
O Papa conclui as palavras do Concílio
Vaticano II aos homens de pensamento e de ciência: “Felizes os que, possuindo a verdade,
a procuram ainda a fim de a renovar, de a aprofundar, de a dar aos outros”. (SP)